Pandemia: Sul-africana Avbob receia não conseguir responder à procura de caixões

  • ECO Seguros
  • 17 Maio 2021

A Avbob, seguradora cuja origem remonta à pandemia da designada “gripe espanhola”, enfrenta 3ª grande catástrofe sanitária da sua história. A mútua é funerária e fabrica caixões.

Na Avbob Mutual Assurance Society, associados e clientes titulares de apólice de funeral são elegíveis para terem caixão, preparação do enterro e transporte na urna totalmente gratuitos.

O grupo sul-africano constitui caso raro de integração vertical nos seguros de funerais. Muito devido ao contexto em que nasceu – durante a gripe pneumónica de 1918 – a entidade nunca mais abandonou a especialização. Entre as subsidiárias, conta com agência funerária própria e uma fábrica de caixões. Porém, na atual pandemia, a mutualista prevê novo pico de mortalidade de maio a julho e antecipa dificuldades de resposta própria à procura de caixões.

Organização de natureza mutualista, a seguradora nasceu da comunidade e, perante efeitos de crises sanitárias de grande impacto, resiste junto com a comunidade e não está apenas no negócio segurador, a agenciar funerais e a fabricar caixões e lápides. A Avbob participa em campanhas de prevenção de saúde pública e é ativa na promoção da literacia e educação, sendo bem conhecida por um concurso de poesia de âmbito nacional e instalação de bibliotecas em várias províncias do país.

O grupo Avbob fechou 2020 com receita de 539 milhões de rands (-2,5% face a 2019), apresentando resultado bruto de 194,6 milhões de rands (11,36 milhões de euros), 3,9 milhões acima do apurado um ano antes, refletindo redução de despesas com bens e serviços. O negócio de seguros contabilizou cerca de 4,74 mil milhões de rands (cerca de 276,8 milhões de euros) em receita de prémios, a crescer 14% à faturação de 2019 e a apurar lucro líquido 7,12 milhões de rands, triplicando os ganhos do anterior.

Por seu lado, penalizado pela depreciação de ativos financeiros, o grupo Avbob (entidade matriz) desceu lucros 38%, para 13,34 milhões de rands.

Um século de experiência e três pandemias

O primeiro grande desafio pandémico da Avbob, foi há mais de 100 anos, quando a gripe pneumónica (erroneamente referenciada como “gripe espanhola”) desembarcou na África do Sul levada pelos combatentes da Grande Guerra. A segunda crise com alta taxa de mortalidade (e funerais) enfrentada pela mútua foi o flagelo do VIH-Sida, que fez da África do Sul o país mais afetado pela prevalência do retrovírus de imunodeficiência humana. Sem causa determinada até meio dos anos 80, a epidemia global do AIDS (sigla internacional) já afetava 33 milhões de pessoas no final da década de noventa do século XX, tendo até então ceifado 14 milhões de vidas humanas. A OMS classificou o HIV/Sida a quarta causa de morte no mundo e a primeira em África.

A epidemia propagou-se e, em 2019, mais de sete milhões de pessoas viviam com Sida na África do Sul, com a UNAIDS (programa das Nações Unidas criado para lidar com a catástrofe) a considerar o país, como o mais atingido pela epidemia no mundo. No ano que antecedeu a emergência da pandemia de Covid-19, o país tinha prevalência do VIH em 19% dos adultos (com idades entre 15 e 49 anos) somando 200 mil novas infeções e 72 mil mortes associadas ao VIH.

Com a pandemia de Covid-19, a Avbob mobilizou-se para nova frente de combate. Em julho do ano passado, a África do Sul já registava taxa de mortalidade 60% superior ao normal para o período entre maio e julho. As mortes e restrições impostas pela Covid-19 obrigaram a Avbob a operar em regime extraordinário, multiplicando o número de contentores marítimos que equipou para servirem de morgues, aumentando pessoal para assegurar os funerais de 25% dos falecidos pelo novo coronavírus no país.

De epidemia em epidemia, acumulando experiência operacional em crises sanitárias de grande amplitude, face ao infortúnio e trauma de morte que afeta os segurados, a mútua de seguros mantém-se na linha da frente. No combate à Covid-19, a entidade – em cujo site disponibiliza uma cartilha intitulada “Sete fases do luto” reafirma que continuará a assegurar as coberturas de indemnização por morte e a extensão do serviço funerário aos associados e clientes.

Em comunicação recente, Pieter Van der Westhuizen, diretor-geral de Serviços Funerários na Avbob Mutual Assurance Society, partilhou expectativas para 2021.

Antevendo a força de uma terceira vaga de infeções por Covid-19 no período entre final de maio e julho, assegurou que a companhia está a trabalhar ativamente para garantir resposta suficiente a aumento da procura de caixões no país. Porém, “assegurar provisionamento adicional de caixões, é só um dos problemas”, disse referindo a necessidade de mitigar desafios relacionados com capacidade de produção. Westhuizen advertiu que o fabrico de caixões “enfrenta escassez de matéria-prima” (madeira).

Antes do final de fevereiro passado, com a campanha de vacinação em curso, o número de infetados pelo novo coronavírus na África do Sul ultrapassou milhão e meio de pessoas, enquanto o total de mortos pela mesma doença já rondava os 49 mil. Números mais recentes atualizados pelo ministro da Saúde, em comparência no parlamento (na segunda semana de maio), indicaram novo pico desde fevereiro: mais de 3,2 mil casos num dia, reportou a imprensa local.

Justificando os receios da Avbob de uma terceira vaga, os números anunciados por Zweli Mkhize atualizam o total oficial de infeções por Covid-19 em mais de 1,6 milhões de pessoas e os falecimentos por conta do novo coronavírus em mais de 55 mil pessoas na África do Sul.

Perante a dureza do combate à Covid-19, a mútua nascida na pandemia de há um século mostra credenciais. Desde julho de 2020 até fevereiro deste ano, detalhou Van der Westhuizen, a seguradora do grupo “poupou aos associados, através dos benefícios garantidos aos mutualistas, 250 milhões de rands em despesas com funerais” (cerca de 14,65 milhões de euros).

Por cada apólice da Avbob, os segurados que somam dois anos de prémios pagos ganham aceso gratuito a caixão, despesas com preparação do serviço funerário, transporte e realização do enterro em qualquer parte no território da África do Sul. Os beneficiários do falecido recebem compensação de 2 500 rands em dinheiro (cerca de 147 euros) para despesas prévias ao funeral.

Afirmando solidariedade com associados e clientes que perderam familiares durante a segunda vaga de Covid -19, o responsável dos serviços funerários da seguradora recordou que, para contornar as restrições sociais impostas às cerimónias fúnebres: “convertemos contentores frigoríficos em salas climatizadas para assegurar que familiares e amigos pudessem, de local remoto, acompanhar os enterros através de transmissões em direto”.

Os caixões para os associados e clientes e todo o equipamento fornecidos para os funerais são produzidos pela Avbob Industries, unidade fabril localizada na cidade de Bloemfontein. Os contentores que converte em casas mortuárias são idênticos aos que transforma em salas onde os familiares dos defuntos acompanham os procedimentos do cemitério em live streaming.

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