117 personalidades escrevem carta aberta a pedir tempo para as eleições

São 117 personalidades de diferentes quadrantes profissionais e independentes da política partidária. Pedem tempo para a realização de eleições, e rejeitam a ideia de efeitos negativos na economia.

O professor Álvaro Nascimento, o advogado Rui Medeiros, o jornalista Francisco Sarsfield Cabral, a gestora Cristina Vaz Tomé e o professor Nuno Crato são algumas das personalidades que assinam uma carta aberta, de um total de 117 nomes, com o título “Tempo para a Democracia: pela igualdade, qualidade e estabilidade democráticas“. Reconhecendo a necessidade de eleições antecipadas — “preferível ao arrastamento da instabilidade, fragilidade e degradação das instituições políticas” — consideram que “a preparação dos programas e escolha dos candidatos, os vários debates e a campanha devem decorrer em tempo rápido mas razoável, sem precipitações que sempre frustrariam os objetivos de esclarecimento dos eleitores e de superação dos impasses políticos“.

Nesta carta-aberta, os 117 signatários não sugerem qualquer data para as eleições antecipadas ao Presidente da República, que reúne hoje o Conselho de Estado e deverá anunciar uma decisão já na quinta feira. Mas deixam claro que o processo democrático exige tempo, o que deixa implícito uma data eleitoral entre o fim de janeiro e o início de fevereiro. “Havendo vários partidos com processos eleitorais internos, regulares, obrigatórios e previamente iniciados, a resposta democrática não pode ser exigir-lhes que prescindam da democracia interna. Tal seria insustentável internamente, mas também criaria uma injusta vantagem ao obrigar alguns partidos a irem a eleições com líderes e programas com legitimidade substancial e formal caducadas“, escrevem, numa alusão clara aos processo do PSD e CDS. Rui Rio, recorde-se, quer adiar as eleições internas e Francisco Rodrigo dos Santos já impôs mesmo essa mudança de calendário partidário, o que lhe permitirá apresentar-se como líder do CDS em fim de mandato.

Assim, lê-se na carta aberta, “deve ser assegurado o tempo suficiente – mesmo que adaptado – para o decurso de um processo eleitoral interno livre e transparente que permita a escolha dos líderes, das suas equipas, dos programas e dos respetivos candidatos”.

A carta aberta tem quatro pontos essenciais, que os subscritores consideram “um contributo cívico e construtivo, tão livre, independente, imparcial e guiado pelo interesse nacional quanto sabemos ser o critério que exclusivamente enforma a decisão e a função do Senhor Presidente da República”. E no quarto, apontam aos efeitos económicos das eleições antecipadas.

Em quarto lugar, é falsa a ideia de que haveria um conflito entre o interesse num processo eleitoral que decorra rapidamente, mas assegurando a normalidade democrática, e o interesse da economia, das empresas e dos trabalhadores, que alegadamente obrigaria a acelerar eleições e ter um Orçamento aprovado em tempo recorde“.

Leia aqui a carta na íntegra

Conhecidos os termos da presente situação política – reprovação do Orçamento, auscultações para efeitos de dissolução da Assembleia da República, marcação da data das eleições legislativas –, gostaríamos de dar o nosso contributo para o desenlace da crise política, como cidadãos ativamente empenhados na qualidade da nossa democracia.

A situação de Portugal e os seus desafios mais estruturais – da produtividade e crescimento económico aos rendimentos e desigualdade, da pobreza às alterações climáticas, das qualificações dos portugueses à sustentabilidade dos serviços públicos essenciais, entre muitos outros – exigem respostas políticas e reformas que carecem de um quadro parlamentar e de um governo estável.

A marcação de novas eleições é preferível ao arrastamento da instabilidade, fragilidade e degradação das instituições políticas. A preparação dos programas e escolha dos candidatos, os vários debates e a campanha devem decorrer em tempo rápido mas razoável, sem precipitações que sempre frustrariam os objetivos de esclarecimento dos eleitores e de superação dos impasses políticos.

Das auscultações até agora havidas e do debate público, percebem-se aqueles que, como os parceiros sociais, apelam à serenidade e razoabilidade e os atores político-partidários que afirmam claramente um interesse “empenhado” e facilmente identificável. Por nós, acentuamos quatro contributos fundamentais, que, julgamos, traduzem uma visão e preocupação genuína e plural da sociedade civil portuguesa.

1. Em primeiro lugar, preocupa-nos que a qualidade da democracia possa sair enfraquecida desta crise. Está em causa o respeito integral pela igualdade de oportunidades e imparcialidade no tratamento de candidaturas expressamente garantidas pela Lei dos Partidos Políticos. Trata-se de um valor político-constitucional inafastável, que não podendo prevalecer em exclusivo, deve fazer parte da equação decisória.

Havendo vários partidos com processos eleitorais internos, regulares, obrigatórios e previamente iniciados, a resposta democrática não pode ser exigir-lhes que prescindam da democracia interna. Tal seria insustentável internamente, mas também criaria uma injusta vantagem ao obrigar alguns partidos a irem a eleições com líderes e programas com legitimidade substancial e formal caducadas. E, por isso, sem prejuízo do esforço de tais partidos na aceleração e agilização dos seus calendários internos, deve ser assegurado o tempo suficiente – mesmo que adaptado – para o decurso de um processo eleitoral interno livre e transparente que permita a escolha dos líderes, das suas equipas, dos programas e dos respetivos candidatos. A normalidade democrática dos partidos, em todos os momentos, mas especialmente em período pré-eleitoral, é um vetor fundamental do interesse nacional na qualidade da democracia e do Estado de Direito.

2. Em segundo lugar, é evidente que Portugal não vive em estado de exceção que justifique a compressão da democracia nacional ou da normalidade democrática interna dos partidos (que é, como se disse, um componente essencial da democracia nacional). Nem no pico da pandemia, em estado de emergência, se suspenderam ou aliviaram exigências democráticas ou “despacharam” eleições. Muito pelo contrário, houve um aumento das garantias e possibilidades democráticas de modo a propiciar uma participação efetiva e esclarecida dos cidadãos.

3. Em terceiro lugar, basta olhar para as experiências congéneres na União Europeia para perceber que a gestão dos calendários pré e pós-eleitorais tem sempre em conta a garantia dos mais elevados padrões de igualdade e qualidade democrática, tendendo a favorecer a estabilidade. A discussão sobre alegados danos irreparáveis infligidos ao interesse nacional, quando estão em causa períodos perfeitamente razoáveis que não excedem escassíssimas semanas, afigura-se simplesmente artificial.

4. Em quarto lugar, é falsa a ideia de que haveria um conflito entre o interesse num processo eleitoral que decorra rapidamente, mas assegurando a normalidade democrática, e o interesse da economia, das empresas e dos trabalhadores, que alegadamente obrigaria a acelerar eleições e ter um Orçamento aprovado em tempo recorde. Esse conflito não existe de todo, seja porque o acréscimo temporal que é indispensável à normalidade democrática interna e igualdade de oportunidades é diminuto; seja porque um processo eleitoral sereno e participado é fator de estabilidade e normalidade, crucial para o tecido económico-social.

Recorde-se, aliás, que a Comissão Europeia já veio clarificar que a execução e pagamentos do PRR e dos fundos estruturais não estão dependentes do novo Orçamento, nem do processo eleitoral. Citando Elisa Ferreira, “o PRR é baseado num acordo e é independente dos vários contextos políticos que os diversos países atravessam”; citando Valdis Dombrovskis, os PRR “têm de coexistir com os desenvolvimentos políticos em cada Estado-membro” e que “já estão a ter lugar algumas mudanças governamentais [nos Estados-membros] e outras vão seguir-se”.

De resto, o ordenamento jurídico português aceita e acautela (regulando) situações de reprovação ou demora orçamental, mas não tolera e até ilegaliza atropelos democráticos e desigualdades eleitorais. A Constituição quis atribuir as competências para dissolver a Assembleia da República e convocar eleições legislativas exclusivamente ao Presidente da República, não a uma maioria instantânea ou circunstancial de partidos que decidiriam interessadamente em causa própria.

Esta carta-aberta é, pois, um contributo cívico e construtivo, tão livre, independente, imparcial e guiado pelo interesse nacional quanto sabemos ser o critério que exclusivamente enforma a decisão e a função do Senhor Presidente da República.

Subscritores

Abel Mateus, Economista sénior Banco Mundial e BIRD, Professor Universitário

Álvaro Nascimento, antigo Chairman da CGD e Professor de Economia da Universidade Católica Portuguesa (UCP)

Ana Isabel Trigo de Morais, Gestora

Ana Isabel Xavier, Professora Universitária

Ana Margarida Craveiro, Diretora de Comunicação

Anabela Miranda Rodrigues, Professora da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (FDUC) e ex-Presidente do Centro de Estudos Judiciários

André Azevedo Alves, Professor do Instituto de Estudos Políticos da UCP (IEP)

André Carreira, Economista

André Salgado de Matos, Advogado, Professor da Faculdade de Direito da UCP

António Belmar da Costa, Director-executivo AGEPOR

António Nogueira Leite, Professor da Universidade Nova SBE

António Pinto Barbosa, Professor da Universidade Nova SBE

António Poças, Empresário e Presidente da NERLEI- Associação Empresarial da Região de Leiria

Bruno Bobone, Empresário e Gestor

Bruno Mota, Gestor

Carla Quevedo, Escritora

Carlos Albuquerque, Empresário e Gestor

Carlos Barbot, Empresário

Carlos Leiria Pinto, Gestor

Catarina Botelho, Professora da Faculdade de Direito da UCP

Catarina Saldanha Sobral, Gestora

Clemente Pedro Nunes, Professor Catedrático do Instituto Superior Técnico

Cristina Vaz Tomé, Gestora

Diogo C. Campello, Gestor

Diogo da Silveira, Gestor

Diogo Feio, Professor da Faculdade de Direito da Universidade do Porto, Advogado

Domingas Carvalhosa, Empresária

Duarte Soares, Médico e ex-presidente da Associação Portuguesa de Cuidados Paliativos

Eugênia Gamboa, Professora do IEP

Fátima Castro Moreira, Professora da Faculdade de Direito da Universidade Portucalense

Fernando Alves Correia, Professor da FDUC

Francisco Maria Teixeira, Gestor

Francisco Mendes da Silva, Advogado

Francisco Pereira Coutinho, Professor da Universidade Nova de Lisboa (UNL)

Francisco Sarsfield Cabral, Jornalista

Francisco Tártaro, Dirigente Sindical

Francisco van Zeller, Gestor

Frederico Arruda, Gestor

Gonçalo Moita, Investigador

Gonçalo Vaz Botelho, Gestor

Guilherme Cabral, Consultor

Gustavo Guimarães, Gestor e Empresário

Hugo Vieira, Vice-Presidente da Associação Nacional de Jovens Empresários

Isabel Castelo Branco, Gestora

Joana Vasconcelos, Professora da Faculdade de Direito da UCP

João Pedro Rodrigues, Professor da FDUC, Fiscalista

João Pedro Tavares, Gestor

João Pedro Videira, Presidente do Conselho Nacional da Juventude

João Rebelo Cotta, Empresário e Presidente da AIRV- Associação Industrial da Região de Viseu

João Taborda da Gama, Advogado

João Virott da Costa, Gestor e Empresário

Joaquim Ferreira de Oliveira, Empresário e Gestor

Joaquim Luiz Gomes, Empresário e Gestor

Jónatas Machado, Professor da FDUC

Jorge Alves Correia, Professor da FDUC

Jorge Bleck, Advogado

Jorge Buescu, Professor da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa

Jorge Marvão, Médico Anestesiologista, Professor Universitário

Jorge Penedo, Cirurgião

Jorge Ribeirinho Machado, Professor Universitário AESE

Jorge Santos, Empresário e ex-Presidente da NERLEI, Associação Empresarial da Região de Leiria

José Artur Duarte Nogueira, Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (FDUL) (jubilado)

José Luís Vasconcelos e Sousa, Empresário

José M.B. Roquette, Gestor

José Manuel Cardoso da Costa, antigo Presidente do Tribunal Constitucional

José Miguel Cardoso da Costa, Professor da Universidade Nova SBE

José Theotónio, Gestor

José Tomaz Castello Branco, Professor IEP

Luís Campos e Cunha, Professor da Universidade Nova SBE e ex-Presidente da SEDES

Luís Fernandes, Gestor

Luís Filipe Reis, Gestor

Luís Gomes, Presidente da Associação Comercial Caldas e Óbidos

Luís Pereira Coutinho, Professor da FDUL

Luís Terrinha, Professor da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa

Lurdes Oliveira, Dirigente Sindical

Maria Fernanda Lima, Médica de Família

Manuel Cavaleiro Brandão, Advogado

Manuel Cunha e Sá, Médico Neurocirurgião

Manuel Fontaine, Professor e Diretor da Faculdade de Direito da UCP

Manuel Fonseca, Dirigente nos CTT

Manuel Lancastre, Engenheiro e Economista, Professor na Brown University

Manuel Pereira Gomes, dirigente sindical, antigo Presidente UGT – Porto

Manuel Ramalho Eanes, Gestor

Manuel Ravara Cary, Gestor e Empresário

Margarida Olazabal Cabral, Advogada

Maria Fernanda Machete, Química

Maria João Machete Botelho, Gestora

Miguel Leichsenring Franco, Administrador de empresas, antigo Presidente da câmara de comércio Luso-Alemã

Miguel Pena Machete, Advogado

Miguel Pina Martins, Empresário e Líder de Associação Empresarial

Nuno Botelho, Presidente da Associação Comercial do Porto

Nuno Crato, Professor Universitário e antigo Ministro da Educação e Ciência

Nuno Fernandes Thomaz, Gestor

Nuno Jonet, Gestor

Nuno Gonçalo Poças, Advogado

Nuno Valentim, Arquiteto

Oscar L. Alves, Médico Neurocirurgião

Paula Vaz Freire, Professora e Diretora da FDUL

Paulo Câmara, Advogado

Pedro Costa Gonçalves, Professor da FDUC

Paulo Ferreira, Gestor setor dos Transportes

Paulo Lopes Marcelo, Jurista e Professor Universitário

Pedro Reis, Economista e ex-Presidente da AICEP

Pedro Saraiva, Professor Catedrático da Universidade de Coimbra e da Universidade Nova de Lisboa

Piedade Almeida Garrett, Advogada

Ricardo Costa, Presidente Associação Empresarial do Minho

Ricardo Rio-Tinto, Médico Gastrentologista

Rui Armindo Freitas, Gestor

Rui Medeiros, Faculdade de Direito da UCP

Rui Moura Ramos, antigo Presidente do Tribunal Constitucional

Samuel Rego, Diretor da Escola Superior de Dança

Soledade Carvalho Duarte, Empresária e Gestora

Stephan Morais, Empresário

Teresa Cardoso Menezes, Gestora

Tiago Macieirinha, Professor da UCP

Vasco Moura Ramos, Advogado

Walter Ossvald, professor jubilado da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto e fundador do Instituto de Bioética da Universidade Católica

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