Financiamento, dedicação exclusiva e autonomia. O que os partidos propõem para a Saúde
A maioria dos partidos quer mais autonomia para a contratação e assegurar que os portugueses têm um médico de família, mas surgem divergências noutros temas da saúde.
Se já antes era um dos temas mais debatidos entre os partidos, com a pandemia a saúde tomou um lugar ainda mais central na discussão política. Na campanha para as eleições legislativas, as diferenças entre os partidos, nomeadamente entre a esquerda e a direita, sobre que medidas o Serviço Nacional de Saúde necessita têm-se evidenciado, sendo que o tema levou mesmo a uma escalada de tensão entre o PS e o PSD.
Quase todas as forças políticas querem mais autonomia para a contratação e assegurar que todos os portugueses têm um médico de família, mas acabam por divergir noutras abordagens dentro da saúde, nomeadamente o regime a aplicar aos profissionais e a relação entre o público e o privado.
Do lado do PS, o partido defende que se deve “continuar a avançar”, dotando os “cuidados de saúde primários de meios complementares de diagnóstico”, tornando mais atrativa carreira de medicina geral e familiar ou repondo “a carreira de técnico auxiliar de saúde”, como exemplificou António Costa, no debate com os restantes partidos com assento parlamentar.
No programa socialista estão contempladas várias medidas para a área da saúde, como “reforçar a autonomia na gestão hospitalar, nomeadamente em matéria de contratação de profissionais de saúde, com maior responsabilização e avaliação da satisfação pelos utentes e profissionais”, bem como “rever o modelo de financiamento dos hospitais, tendo em conta os cuidados prestados e a população de referência”.
Nos debates, para além de destacar as medidas do PS, o secretário-geral do partido atacou também as propostas do PSD, nomeadamente um “projeto de revisão constitucional para que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) deixe de ser tendencialmente gratuito”. “O PSD deseja que a classe média passe a pagar os cuidados de saúde”, atirou Costa, no debate com Rui Rio.
No projeto que o PSD apresentou em Coimbra no ano passado, apenas existe uma referência que dita que o “acesso a cuidados de saúde do serviço nacional de saúde não pode em caso algum ser recusado por insuficiência de meios económicos”.
No entanto, o líder social-democrata refutou esta ideia, reiterando que Costa agitou um “papão”, de que o PSD vai “pôr a classe média a pagar o SNS”. “Não está escrito em nenhum lado, nunca disse isso. O PSD é, por natureza, um grande defensor da classe média, é justamente isso que o caracteriza”, salientou Rui Rio, em declarações aos jornalistas no final do debate com António Costa.
“O que queremos é um serviço de saúde melhor e não que os portugueses paguem a saúde em dobro — pelos impostos e quando vão ao hospital”, explicou o líder do PSD, defendendo também que o partido quer “um SNS tendencialmente gratuito”. “Dizemos em duas páginas [do programa eleitoral] que queremos um SNS tendencialmente gratuito. Por aí, não há duvidas”, acrescentou Rio.
De facto, no programa do PSD está expressa uma proposta para a “instituição de um Sistema Nacional de Saúde compreensivo e complementar, que deverá assentar em três pilares — público, privado e social — passando de um SNS fechado, em que o Estado desempenha todos os papeis – maior produtor, empregador, financiador e fiscalizador – para um Sistema em que o Estado continua a ser o elemento central e maioritário, mas cuja função primeira é o cumprimento da Constituição, ou seja, garantir o acesso de todos os portugueses aos cuidados de saúde, de forma justa e equitativa e tendencialmente gratuita”.
O PSD tem também outras propostas como “alargar o sistema SIGIC das listas de espera para cirurgias às consultas de especialidades médicas hospitalares e aos meios complementares de diagnóstico e terapêutica”, bem como “promover um novo modelo de financiamento que premeie os ganhos em saúde, reforçar a autonomia da gestão das unidades de saúde e incrementar o modelo das Unidades Locais de Saúde”.
Bloco e PCP querem mais profissionais e dedicação exclusiva
O Bloco de Esquerda tem como uma das principais propostas um “aumento do orçamento do SNS em percentagem do PIB, acabando com o subfinanciamento crónico e proporcionando margem para um efetivo investimento”. Além disso, defende também medidas para aumentar o número de profissionais e fixá-los no SNS.
No debate entre todos, a coordenadora do Bloco, Catarina Martins, reiterou que Portugal tem profissionais de saúde, mas que estes “não têm condições para trabalhar no SNS”. Apontando que muitos médicos não se fixam no SNS, a líder bloquista voltou também a insistir na concretização da dedicação exclusiva.
No programa, o partido tem medidas como a criação de novas Unidades de Saúde Familiar (USF) e a “modificação do paradigma de financiamento hospitalar”, para “integrar dimensões associadas a outras classes profissionais e mais componentes de qualidade dos cuidados além da produção”.
O PCP também destaca os recursos humanos, com João Oliveira a defender, no debate, que é necessário “contratar profissionais”, valorizar carreiras e “assegurar uma capacidade de resposta em função da articulação dos vários cuidados de saúde”.
Entre as medidas do compromisso eleitoral do PCP, encontra-se ainda “estabelecer o direito dos estabelecimentos e unidades do SNS à autonomia para a contratação de profissionais de saúde, no quadro da gestão dos seus orçamentos e planos de atividade”, bem como “instituir a opção de dedicação exclusiva dos médicos e enfermeiros – com a majoração de 50% da sua remuneração base, o acréscimo de 25% na contagem do tempo de serviço para progressão na carreira e outros benefícios”.
Quanto ao PAN, as medidas destacadas pelo partido no resumo do programa incluem “revitalizar o SNS, estabelecendo condições de trabalho de qualidade, gratificantes e atrativas para todos/as os/as profissionais de saúde” e “garantir igualdade no acesso à saúde a todos os grupos sociais, através de respostas de proximidade, transporte gratuito e comunicação inclusiva para grupos de risco específicos”.
Além disso, o partido defende também a criação de um “Fundo Público de Saúde, financiado através de uma taxa de compensação proveniente de indústrias poluentes com impactos comprovados na saúde humana (ex: suiniculturas, indústria celulose, etc) e também da atual taxação feita a produtos nocivos para a saúde humana (ex: álcool, tabaco, etc)”.
O Livre, por sua vez, quer “reforçar e reorganizar o Serviço Nacional de Saúde com base em comunidades locais, assegurando a sua gestão pública e não renovando os contratos das Parcerias Público-Privadas atualmente ainda em curso”, propondo medidas como dotar as comunidades locais de saúde de autonomia administrativa e financeira e reforçando o planeamento e a avaliação da qualidade, a nível regional, segundo o programa.
CDS e IL defendem liberdade para público e privado
O CDS tem no compromisso eleitoral uma medida denominada “Via Verde Saúde”, que dá aos portugueses “a liberdade de fazer sem custos, no setor particular ou social, os exames, consultas ou cirurgias que o Estado não proporcionou no prazo razoável”.
Francisco Rodrigues dos Santos traçou um cenário para explicar a visão do partido usando o “Manel, que está há quatro anos à espera de uma consulta de oncologia e não a tem no SNS”. “A esquerda o que lhe diz é: tens de continuar a esperar porque a única opção que tens é ter essa consulta no SNS, porque o Manel é pobre e não tem outras opções de escolha”, apontou o líder do CDS.
Já a Iniciativa Liberal defende um modelo de saúde misto. No sumário do programa do partido, é expressa a intenção de “reformar o SNS, passando a ter um sistema onde o financiamento é público, mas a prestação é pública e privada, tal como acontece em metade dos países europeus de modo a acabar com as listas de espera nas consultas e cirurgias”.
Quanto ao Chega, o partido propõe medidas como reformar o SNS “guiado por razões de eficiência, qualidade, análise de custo-benefício e melhores práticas através de compromissos e concorrência equilibrados entre os setores público, privado e social”. O partido diz querer incentivar “a contratualização, Parcerias Público-Privadas ou modelos de gestão por objetivos, bem como a possibilidade da generalização do modelo da ADSE”.
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