Lagarde admite “preocupação unânime” no BCE sobre inflação. Pistas sobre juros só em março

A presidente do BCE admite que há uma "preocupação unânime" no conselho de governadores do BCE sobre os "elevados níveis" de inflação. Porém, só haverá pistas sobre juros na reunião de março.

Após manter as decisões de dezembro intactas, Christine Lagarde destacou esta quinta-feira que há uma “preocupação unânime”, principalmente com os mais cidadãos mais desfavorecidos, no conselho de governadores do Banco Central Europeu (BCE) com os “elevados níveis” de inflação que se registaram na Zona Euro em dezembro e em janeiro, admitindo que surpreendeu face ao esperado. Porém, Lagarde rejeitou antecipar se mantém a previsão de que os juros não vão subir este ano: essa resposta chegará na reunião de março quando o staff do BCE, com mais informação na sua posse, atualizará as projeções para a taxa de inflação.

Ainda assim, apesar de chutar sinais sobre os juros e outras componentes da política monetária para a próxima reunião (10 de março), Lagarde admitiu: “Estamos a aproximar-nos muito perto do objetivo”, uma taxa de inflação de 2% no médio prazo. E explicou porquê: há fatores de médio prazo a influenciar os preços que “estão ajudar-nos a finalmente atingir esse objetivo”, após anos em que o BCE falhou, como é o caso da taxa de desemprego em mínimos, a subida mais ampla da inflação (afeta 60% dos itens do índice de preços) e as expectativas da inflação a chegar perto da meta.

Mais à frente, na conferência de imprensa, a presidente do BCE deixou pelo menos uma certeza: “Acreditem em mim: assim que for necessário e as condições forem cumpridas, nós iremos agir porque é o nosso dever e devemos fazê-lo“. Em causa está o mandato do banco central da Zona Euro de manter a estabilidade de preços, com o objetivo de médio prazo (e não de curto prazo) de manter a taxa de inflação nos 2%. A dúvida neste momento está nas projeções do BCE para a inflação em 2023 e 2024 que, em dezembro, apontavam para 1,8% (abaixo do objetivo), mas podem ser revistas em alta em março.

Lagarde promete mudança “gradual”. Mas subir juros não resolve energia cara

Seja qual for a avaliação daqui a um mês e meio, Lagarde prometeu que o BCE não será “complacente”, mas também não será “apressado” no processo, mantendo a ideia de que qualquer que seja a mudança esta será “gradual”. Para já, os governadores concordam que “a inflação acelerou significativamente nos últimos meses e surpreendeu em alta em janeiro”, principalmente por causa dos preços da energia (gás, petróleo e eletricidade), cujo aumento responde por 50% da subida dos preços na Zona Euro, o que já está a ter impacto noutras categorias, principalmente nos alimentos.

A inflação irá provavelmente manter-se elevada durante mais tempo do que o previsto anteriormente, mas irá descer no decurso deste ano“, assinalou Lagarde, assumindo que os riscos, em comparação com dezembro, são ascendentes, particularmente no curto prazo. Ou seja, a taxa de inflação pode vir a acelerar ainda mais nos próximos meses. “Se as pressões nos preços traduzirem-se em aumentos de salários acima do esperado ou se a economia regressar à sua capacidade total mais rapidamente, a inflação pode revelar-se mais elevada”, notou.

É na evolução dos salários que está uma das incógnitas “cruciais” do BCE, nas palavras de Lagarde. A instituição com sede em Frankfurt considera que o crescimento dos salários continua a ser ténue no geral, sendo expectável que a taxa de desemprego em mínimos leve a uma subida maior das remunerações. A presidente do BCE está à espera de ver esse movimento nos salários, mas para já não vê essa “espiral de salários e preços” que, a existir, levará o banco central a atuar.

No que toca à pandemia, a incerteza diminui com os últimos dados a apontar para um controlo da infeção no Velho Continente e vários países a aligeirarem as restrições. Porém, há um novo problema no horizonte: “Há mais riscos geopolíticos“, alertou a presidente do BCE, referindo-se à tensão que se acumula entre a Rússia, a Ucrânia e os países da NATO.

Quanto aos preços da energia, Lagarde quis deixar claro que não será a gradual normalização da política monetária do BCE que resolverá esse problema. “Se o BCE acabar com as compras de ativos e subir os juros, acha que irá ter algum impacto nos preços da energia?”, questionou, após uma pergunta de um jornalista. A resposta é “não” uma vez que as decisões sobre os preços da energia são decididos fora da Zona Euro dada a dependência energética da Europa ao exterior. E deixou claro: “Não podemos atribuir ao BCE o custo elevado da energia“.

BCE não é a Fed nem o Banco de Inglaterra

No final da conferência de imprensa, Lagarde voltou a rejeitar as “constantes comparações” entre a Zona Euro e os Estados Unidos onde a Fed prepara-se para aumentar os juros já em março. “Estamos a operar em diferentes ambientes, com diferentes dados económicos”, garantiu, referindo que nos EUA a procura agregada está 30% acima do nível pré-pandemia enquanto na Zona Euro chegou agora ao nível de 2019. A diferença, segundo a presidente do BCE, está nos “massivos” estímulos introduzidos durante a pandemia nos EUA, ao passo que na Zona Euro foram mais “moderados e não excessivos”.

E o mesmo se aplica ao Reino Unido, ainda que por diferentes razões. Lagarde explicou que historicamente a economia britânica tem registado uma taxa de inflação superior à da Zona Euro, também porque o mercado de trabalho é muito diferente. No Reino Unido é visível uma “pressão elevada” nos salários, o que ainda não é o caso na Zona Euro, por causa da “escassez de trabalhadores”, o que poderá estar relacionado também com o fenómeno do Brexit.

(Notícia atualizada às 15h02 com mais informação)

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