• Entrevista por:
  • António Ferreira

Ricardo Pinto (EY): Por que está a aumentar o apetite pelos seguros abertos

Além das questões de segurança e privacidade em torno do compartilhamento de dados, erguer um ecossistema de Open Insurance implica investimento em tecnologia e envolvimento do regulador.

Ricardo Lopes Pinto, Partner EY Insurance Financial Services sobre impacto do Open Insurance na mediação: “o ambiente será mais concorrencial e quem beneficiará será o consumidor.”

Brasil está a implantar seguros abertos (open insurance na gíria financeira), prevendo-se interoperabilidade com a banca ainda em 2022 e funcionamento pleno do ecossistema em 2023. O caso brasileiro é destaque num relatório global da EY sobre tendências no setor. Entrevistado por ECOseguros, Ricardo Lopes Pinto, Partner EY, Insurance Financial Services aborda oportunidades e potencial deste e outros desafios em Portugal.

Caracterizado como um ecossistema baseado na partilha de dados e centrado no consumidor, o Open Insurance seria uma realidade viável no mercado português?

O Open Insurance deriva do conceito de compartilhamento de dados entre seguradoras, e não só, perante o consentimento do cliente. Este não é um conceito novo, pois já vimos o lançamento do Open Banking. Havendo já iniciativas regulatórias neste campo na UE, há lições aprendidas com o Open Banking que devem ser consideradas à medida que o Open Insurance evolui.

A quem caberia a iniciativa, ao regulador ou à indústria?

Pensamos que caberá à indústria desenvolver os primeiros passos com a devida regulação e supervisão do regulador.

O que aconteceria ao nível da segurança e da proteção de dados?

As seguradoras estão a desenvolver as suas APIs com recurso a padrões de segurança muito elevados, através de protocolos de criptografia na entrada e saída de dados, certificados digitais e considerando também toda a legislação de proteção de dados, o que exige um investimento muito grande em tecnologia e segurança. Estes são alguns dos desafios que o Open Insurance terá.

O “2022 Global Insurance Outlook” da EY destaca o caso do Brasil, salientando Open Insurance como novo patamar de concorrência entre operadores, mas o pilar é sempre o segurado. Porquê?

Confiança. Para permitir o acesso aos seus dados, um consumidor terá que ter confiança de que serão implementadas medidas de segurança e governança de dados que garantam que a sua adequada utilização e que estes não serão indevidamente partilhados ou usados. Isso levanta a questão de como uma seguradora supera isso. A marca da Segurador é forte o suficiente? O consumidor entende os benefícios da partilha de dados? Existe uma abordagem alternativa (ou seja, parceria com uma marca que tenha altos níveis de confiança)?

A questão da confiança nos seguros é (….) como uma caixa preta. O Open Insurance efetivamente tornaria mais transparente para todas as partes envolvidas, o consumidor, as seguradoras e o regulador.

Ricardo Lopes Pinto

Partner EY, Insurance Financial Services

Seguro aberto na Europa não obriga a alterações a nível do RGPD?

Deveremos tirar partido do caminho já percorrido pelos bancos. Acreditamos que não existirão impactos sobre o RGPD, porque ao abrigo do open insurance, as seguradoras só poderiam partilhar um conjunto de dados padronizados e definidos no Regime, de acordo com o consentimento expresso do cliente.

Poderia melhorar transparência na relação entre os operadores e consumidores e tornar o mercado mais competitivo?

Sobre a questão da transparência, a questão da confiança nos seguros é, em parte, resultante de consumidor não saber como o seu risco é calculado e o motivo pelo qual as tarifas podem variar entre os canais e seguradoras. É como uma caixa preta. O Open Insurance efetivamente tornaria mais transparente para todas as partes envolvidas, o consumidor, as seguradoras e o regulador. A expectativa é que o mercado seja muito mais competitivo pelo aumento da concorrência e inovação de produtos e serviços, e pela entrada de novas empresas, quer seguradoras, quer distribuidoras.

A implementação do sistema no Brasil cumpre um cronograma por fases e o regulador está envolvido desde o princípio. O seguro aberto facilita objetivos da supervisão?

Absolutamente. No Brasil, o envolvimento do regulador foi chave para definir em conjunto com a indústria todos os padrões de dados dos clientes e transações e respetivas regras de negócio. O papel do regulador é garantir que o mercado funciona de acordo com regras claras e respeito/ proteção pelo segurado, quer ao nível de produtos e serviços, quer ao nível da solvência das seguradoras.

Ao nível da distribuição, o que é que Open Insurance pode mudar para mediadores e corretores?

Os mediadores e corretores continuarão a ter um papel fundamental no mercado, especialmente no segmento corporativo, mas novos concorrentes passarão a competir em algumas linhas de negócio e segmentos, como no retalho. Vimos isso no Open Banking com bancos digitais como o Revolut a oferecerem produtos de seguro aos seus clientes. Eles usam o Open Banking para segmentar grupos de clientes e, em seguida, fazer ofertas com base em uma compreensão mais profunda de suas necessidades. Por exemplo, a Revolut ao verificar os seus clientes a efetuarem pagamentos a clínicas veterinárias, pode assumir que existe uma grande probabilidade de que o cliente tenha algum tipo de animal de estimação. Logo, haverá também uma propensão à compra de um seguro para animais de estimação. Respondendo de forma objetiva à questão, o ambiente será mais concorrencial e quem beneficiará será o consumidor.

Nos sinistros de automóvel, por exemplo, as seguradoras no espaço europeu já partilham dados. Isso é uma forma primária de Open Insurance?

Em certa medida, pois não são informações de transações e dados de cliente a pedido do próprio, sendo para mais apenas uma pequena parte das transações de seguro de um consumidor. A relação entre consumidor e tomadores de risco não se resume apenas ao momento em que um sinistro ocorre e há muitos mais momentos em que o Open Insurance pode de facto ter um papel ativo.

As seguradoras desejarão acesso a um ambiente onde possam testar alguns desses casos de uso. Nós (EY) temos uma plataforma chamada EY Nexus que poderia fornecer o sandbox. Eu acho que há um aumento significativo do apetite.

Ricardo Lopes Pinto

Partner EY, Insurance Financial Services

A EIOPA produziu um relatório sobre Open Insurance no início de 2021. Existe em Portugal recetividade à implementação de projetos que pudessem tornar os seguros abertos uma realidade?

As seguradoras em Portugal operam num ambiente de inovação bastante dinâmico e por certo muito atento às oportunidades que podem surgir no campo do Open Insurance. Temos assistido ao desenvolvimento de soluções digitais muito interessantes nesta indústria.

O modelo brasileiro, assinalado no Global Outlook da ey, poderia ser replicado em Portugal?

Pensamos que o exemplo do Brasil poderá ser considerado em Portugal, desde que a indústria e o regulador decidam que esta forma de partilha de dados é benéfica para o consumidor e para a indústria. Para além disso, o caminho percorrido pelo Open Banking será importante para a indústria seguradora avaliar os custo e benefícios decorrentes da implementação destes ecossistemas de partilha de dados.

Olhando o mercado português como terreno de jogo, as seguradoras tradicionais mostram interesse no tema?

As principais seguradoras em Portugal estão a investir em digitalização, a adquirir ou a fazer parcerias com insurtechs. Parece-nos que o interesse existe.

Implementar um ecossistema de seguro aberto supõe sempre a fase preliminar de uma sandbox?

Sim. Existem certamente muitos casos de uso para o Open Insurance e as seguradoras desejarão acesso a um ambiente onde possam testar alguns desses casos de uso. Nós (EY) temos uma plataforma chamada EY Nexus que poderia fornecer o sandbox. Eu acho que há um aumento significativo do apetite. No Reino Unido, por exemplo, existem discussões ativas com os principais operadores do mercado sobre o uso do Open Banking e a criação/evolução do Open Insurance.

Além do Open Insurance, que outra tendência apontada no estudo da EY gostaria de realçar como mais próxima ou de maior potencial no contexto português?

Acreditamos que o tema da Sustentabilidade é sem dúvida uma das maiores tendências. Podemos verificar que cada vez mais seguradoras publicam informações sobre os seus programas de sustentabilidade e muitas vendem também produtos para aqueles consumidores que querem investir em negócios sustentáveis.

Como é que uma seguradora aborda essa realidade? Que competências ESG deve mostrar a nível de produto e da informação prestada?

Este é um dos casos de uso que estamos a explorar com o Open Banking. Analisar os gastos dos consumidores ajudará a identificar aqueles que são mais recetivos aos produtos de seguro baseados em ESG. No caso dos seguros, isso permitiria à seguradora atingir os grupos de clientes certos com esses tipos de produtos.

  • António Ferreira

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