O Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, tem encontro marcado esta sexta-feira com o Presidente norte-americano, Donald Trump, em Washington, para formalizar um acordo bilateral com os EUA para a exploração de recursos minerais da Ucrânia.

De acordo com o jornal The Kyiv Independent, os Estados Unidos terão apresentado três propostas. As duas primeiras foram recusadas por Kiev, visto não incluírem cláusulas que visassem uma garantia de segurança à Ucrânia.

Mas este acordo constitui apenas o primeiro passo para um acordo mais alargado, que vai definir melhor os termos do Fundo de Investimento para a Reconstrução da Ucrânia, criado por ambos os países, e que terá de ser ratificado pelo Parlamento ucraniano.

A alegada versão do acordo a que o The Kyiv Independent teve acesso revela que o Governo ucraniano vai contribuir para o Fundo com 50% de todas as receitas obtidas com a futura monetização de todos os ativos de recursos naturais pertencentes a Kiev.

Esses recursos naturais incluem “depósitos de minerais, hidrocarbonetos, petróleo, gás natural e outros materiais extraíveis, bem como outras infraestruturas relevantes para os ativos de recursos naturais, tais como terminais de gás natural liquefeito e infraestruturas portuárias”.

O fundo investirá depois em projetos para reconstruir a Ucrânia. O The New York Times referiu, citando o texto preliminar, que os Estados Unidos irão deter o montante máximo do fundo permitido pela legislação norte-americana, mas não necessariamente a sua totalidade.

A Administração norte-americana deixou cair a exigência relativa ao direito a 500 mil milhões de dólares (cerca de 475 mil milhões de euros) de receitas futuras provenientes da exploração.

“As disposições do acordo são agora muito melhores para a Ucrânia”, disse uma fonte do Governo ucraniano à BBC.

Não é totalmente claro. O Presidente da Ucrânia tem vindo a insistir para que o acordo inclua uma garantia de proteção dos EUA. Mas, na quarta-feira, Volodymyr Zelensky disse que essa garantia não tinha sido dada. “Queria uma cláusula sobre garantias de segurança para a Ucrânia, e é importante que esteja lá”, afirmou.

Questionado pela BBC se abandonaria o acordo se Donald Trump não oferecesse as garantias de apoio militar que pretendia, Zelensky respondeu que quer “encontrar um caminho para a NATO ou algo semelhante”. “Se não obtivermos garantias de segurança, não teremos um cessar-fogo, nada funcionará”, acrescentou.

Não obstante, a versão preliminar do acordo refere que os EUA apoiam “os esforços da Ucrânia para obter as garantias de segurança necessárias para construir uma paz duradoura”, mas, segundo o primeiro-ministro ucraniano, Kiev não assinará o acordo até que Zelensky e Trump “cheguem a acordo sobre as garantias de segurança” e decidam como “ligar este acordo preliminar” a uma garantia de segurança de Washington.

O Presidente norte-americano, por sua vez, afirmou que a presença de empresas norte-americanas para explorar as terras raras em território ucraniano proporcionaria “segurança automática”.

Na terça-feira, Trump disse também que a Ucrânia teria “o direito de continuar a lutar” em troca do acesso dos EUA aos seus minerais e sugeriu que Washington continuará a fornecer equipamento e munições até existir um acordo com a Rússia.

O primeiro-ministro ucraniano, Denys Shmyhal, afirmou que os EUA e a Ucrânia prepararam uma versão final do acordo, que Kiev autorizaria a assinar na quarta-feira.

Entretanto, o Presidente dos EUA confirmou que se irá encontrar com Volodymyr Zelensky em Washington nesta sexta-feira para assinar o documento.

O líder ucraniano disse que será “muito direto” com Donald Trump e irá perguntar-lhe se os EUA continuarão a apoiar a Ucrânia ou não.

A existência e dimensão das reservas de minerais críticos e das chamadas terras raras na Ucrânia não é 100% clara.

O Governo do país estima que cerca de 5% das “matérias-primas críticas” do mundo encontram-se na Ucrânia.

Entre elas constam cerca de 19 milhões de toneladas de reservas de grafite, utilizada para fabricar baterias para veículos elétricos, e que, segundo a agência estatal de pesquisa geológica ucraniana, torna a Ucrânia “um dos cinco principais países” no fornecimento deste mineral.

Em território ucraniano poderão existir ainda depósitos de titânio e lítio.

Quanto às terras raras, trata-se de um grupo de 17 elementos que são utilizados para produzir armas, turbinas eólicas e equipamento eletrónico, por exemplo. Não são raras no sentido de serem pouco comuns e alguns dos seus elementos são mais comuns do que o chumbo, por exemplo. Mas tendem a estar espalhados pela superfície terrestre em pequenas quantidades e misturados entre si ou com outros minerais, pelo que é difícil encontrar depósitos maiores, e a sua extração é dispendiosa.

Porém, Javier Blas, especialista em Energia e commodities, tem argumentado que a Ucrânia não tem terras raras ou um rico património mineral, apenas “pequenas minas de escândio”. Aliás, o Serviço Geológico dos Estados Unidos, uma autoridade na matéria, não indica o país como detentor de quaisquer reservas, e o mesmo acontece com qualquer outra base de dados habitualmente utilizada no setor mineiro.

Mesmo assim, a ministra da Economia da Ucrânia, Yulia Svyrydenko, diz que existem atualmente recursos no valor de 350 mil milhões de dólares (cerca de 334 mil milhões de euros) nos territórios ocupados pela Rússia.

Outra questão que a imprensa tem apontado que pode ser incluída no acordo é a necessidade de a Ucrânia resolver o problema das minas não detonadas. Estima-se que um quarto da superfície terrestre da Ucrânia esteja contaminado por minas terrestres, concentradas principalmente no leste do país, mais devastado pela guerra.

Da mesma maneira que está interessado nos minerais de terras raras da Gronelândia, Donald Trump quer aproveitar o apoio que os EUA têm dado à Ucrânia na guerra contra a Rússia para poder ter acesso aos 5% de reservas do território e, assim, competir com a China, que é, atualmente, o maior produtor mundial destes minérios, com 44 milhões de toneladas.

80% dos minerais de terras raras usados na indústria norte-americana provêm do gigante asiático, pelo que a exploração dos solos ucranianos permitiria a Washington ter uma menor dependência do mercado chinês. Além disso, os produtos feitos nos EUA a partir destes minérios, sobretudo na área da tecnologia e da energia limpa, podem competir com os produtos chineses.