Pedro Nuno Santos rejeita discutir a responsabilidade da PGR e do Presidente sobre a crise. E diz que se houve interferência política no caso das gémeas, é errado e não pode ser aceite.
No último dia útil antes das eleições internas do PS, Pedro Nuno Santos afirma, em entrevista ao ECO, que está “bem resolvido” com a decisão de Marcelo Rebelo de Sousa. Contido nas palavras, não quer “fazer nenhuma análise nem apreciação sobre aquilo que levou ao momento em que estamos“.
O ex-ministro das Infraestruturas — segundo o próprio “o único dos candidatos ao partido e ao país que sabe o que é uma empresa” — evita criticar o antigo secretário de Estado da Saúde Lacerda Sales no caso das gémeas luso-brasileiras, mas afirma que “qualquer interferência naquilo que é o funcionamento correto do Serviço Nacional de Saúde, desde logo interferência política em decisões que são clínicas, é errado e não pode ser aceite…”
Disse, na campanha eleitoral, que tem um percurso que é feito dentro do PS e não apareceu agora. Não será esse mesmo o problema? Que competências e preparação tem para ser primeiro-ministro?
Essa capacidade é nomeadamente o trabalho que fui fazendo e que pode ser julgado, criticado ou elogiado. Quando eu faço essa declaração é para dar nota de que eu nunca tive nem nunca fui, ao longo do meu percurso político, seduzido com outras forças políticas, nomeadamente a esquerda do PS, estive sempre no PS. Esse é o objetivo.
Mas só fez trabalho partidário, não fez nada para além do PS.
Isso não é verdade…
Então, o que é que fez para além do PS?
Isso não é verdade… o trabalho de um político é um trabalho relevante. Essa ideia de que “só fez política, portanto, não fez nada” é um erro tremendo que, infelizmente, vamos ouvindo até à exaustão. Eu, apesar de tudo, de todos aqueles que se apresentam para liderar partidos ou para liderar o país, e aliás, nos últimos anos, sou o único que não só fez um percurso no PS como nasceu e cresceu no meio de empresas.
Nascer e crescer no meio da empresa não é trabalhar…
Trabalhei também, então. Trabalhei também nas empresas da minha família, e por isso tive também, quando saio da faculdade, quando interrompo o meu percurso na Assembleia da República, tive essa presença nas empresas, e obviamente fui acompanhando e continuo a acompanhar. Isso faz parte de mim. Aliás, digo mesmo o contrário. Todos os políticos que se apresentam hoje em Portugal para comunicar com o país, eu sou o único que sabe o que é uma empresa, e não é de ter estudado, é de ter presenciado e de ter acompanhado algumas.
Já vamos falar de empresas… Estamos no último dia de campanha eleitoral interna. A avaliação, obviamente minha, é de que começou a campanha eleitoral com uma grande vantagem sobre os seus adversários, nomeadamente José Luís Carneiro, mas a perceção pública e mediática, também as sondagens, indicam uma uma candidatura a perder força por comparação com a de José Luís Carneiro. O que é uma vitória que não seja ‘poucochinha’?
Em primeiro lugar, essa é uma perceção errada. Achar-se que um ministro da Administração Interna, que foi secretário-geral adjunto do Partido Socialista, que foi presidente da Federação do Porto, uma das maiores federações do PS, começou sem força é errado.
Mas começou agora, depois da crise política.
Não começou agora nada, começou já há muitos meses.
José Luís Carneiro não estava preparar uma candidatura quando não se sabia que haveria uma crise política.
O meu adversário interno!? Já estava no terreno há muito tempo e, aliás, isso foi sendo confirmado por muitas pessoas que, entretanto, estão connosco.
Não há tanto tempo como a sua candidatura. Todos se lembram de um congresso em que António Costa dizia que não estava próximo de ser reformar…
Isso tem muito a ver com a minha maneira frontal de estar na política. Agora, dizer-se que eu estava a preparar há muito tempo e o meu adversário surgiu agora não corresponde de todo à realidade. Por isso, espero, neste processo, que o meu camarada José Luís Carneiro tenha um grande resultado, porque não seria de esperar outra coisa em alguém…
Eu estou a dizer é que é expectável, e seria expectável desde o início, que alguém que é ministro da Administração Interna, que foi secretário-geral adjunto do PS e que foi presidente da Federação do Porto e presidente de uma Câmara, que tenha um grande resultado desde o início.
Portanto, já está a justificar uma vitória menos expressiva?
Eu não estou a justificar nada porque não sei que resultado vamos ter. Eu estou a dizer é que é expectável, e seria expectável desde o início, que alguém que é ministro da Administração Interna, que foi secretário-geral adjunto do PS e que foi presidente da Federação do Porto e presidente de uma Câmara, que tenha um grande resultado desde o início.
Então, o que é que não é uma vitória ‘poucochinha’?
Eu não sei, eu não sei, não quero definir metas, porque obviamente, estou a lutar para ganhar dentro do PS.
Mas se ganhar por 50,01%, é uma vitória ‘poucochinho’ ou não?
O que eu quero é ganhar a liderança do partido, quero ter a maioria da confiança dos militantes do PS. Estar a definir uma meta do ponto de vista do resultado, isso não vou fazer nunca numa entrevista. Estou a lutar para ter o resultado possível. E a verdade é que, para além da perceção pública e dos apoios deste ou daquele, há uma coisa que é incontestável para quem tem acompanhado a campanha: Nós temos uma mobilização sem paralelo com a do nosso adversário interno, sem paralelo. Eu, no domingo, tive 1500 pessoas num comício em Guimarães, uma campanha interna. Nós, nas legislativas…
Já estamos, na verdade, na campanha eleitoral para as legislativas.
Não, mas é que nas legislativas de 2022 não tivemos tanta gente como estamos a ter na campanha interna. Aquilo que eu sei é que a nossa candidatura tem conseguido até agora, e só podemos olhar para o presente, uma mobilização extraordinária… Depois, há outra coisa sobre as sondagens. Eu fico sempre surpreso com a forma como se costumam tirar ilações de algumas sondagens. A maioria deu-nos à frente, e a que não deu, quando retiramos os eleitores do Chega, do PSD e da Iniciativa Liberal, eu sou o candidato preferido no eleitorado que deu a maioria absoluta ao PS em 2022. E, verdadeiramente, eu não sou candidato à liderança do PSD… Eu admito que se fosse candidato à liderança do PSD perdia, mas não sou candidato à liderança do PSD, nem estou a dirigir-me aos votantes tradicionais da direita portuguesa.
Como é que vai reconstruir uma unidade no dia seguinte às eleições? Estou a partir de um pressuposto: os delegados ao Congresso do PS já são conhecidos, há um grande avanço na sua lista o que indica capacidade de mobilização. Mas vemos os notáveis com José Luís Carneiro. É o candidato das bases e José Luís Carneiro é do poder instituído no PS.
Não sei, quer dizer, tenho sempre muito dificuldade… notáveis são os que são conhecidos…
E têm responsabilidades ministeriais, políticas.
Certo, só que nós temos mais ministros a apoiar a nossa candidatura. Eu fico sempre, mais uma vez, surpreso com algumas leituras que se fazem porque, na realidade, na hora da verdade, temos o presidente do partido a apoiar, Carlos César, temos um histórico, Manuel Alegre, temos uma figura proeminente da ala mais moderada do Partido Socialista, o Francisco Assis. Nós vamos tendo o apoio das estruturas e dos militantes do PS, agora, não acho que a nossa seja uma candidatura só de militantes de base e a outra de notáveis.
António Costa atacou a procuradora Geral da República e o Presidente da República, culpando-os da crise política sobre. Subscreve esta avaliação?
Eu não quero comentar nem o caso nem as reações…
Estamos a falar da crise política.
Está a pedir-me que faça um comentário…
Não é um comentário ao que disse António Costa. Estou a perguntar se subscreve a tese de que o país está em crise política porque o Presidente da República errou na sua decisão de marcar eleições antecipadas.
Eu não quero fazer nenhuma análise nem apreciação sobre aquilo que levou ao momento em que estamos. Aquilo que me interessa é que Presidente da República, entretanto, marcou eleições…
E prejudicou o PS?
Estamos absolutamente bem resolvidos.
Nem todos. António Costa não está.
Eu estou bem resolvido com a decisão que o Presidente da República tomou e, portanto, só estou concentrado nas eleições de 10 de março.
Está bem resolvido, pelos vistos não tem a mesma opinião do atual secretário-geral do PS e primeiro-ministro, que não está bem resolvido.
Não concordo com isso, eu acho que o António Costa está bem resolvido. No entanto, tem uma opinião diferente do que deveria ter sido feito. Eu, na altura, apoiei o secretário-geral nas iniciativas que teve junto do senhor Presidente da República. Não há discordância nenhuma. Agora, neste momento, estou é focado nas eleições de 10 de março e não focado no que já passou. Acabou o assunto arrumado.
Vamos à atualidade de uma política que tem marcado estes dias. Voltamos a saber mais um caso envolvendo o governo do PS, desta vez com um secretário de Estado, Lacerda Sales, no caso das gémeas, isto é, um secretário de Estado da Saúde em exercício de funções…
É engraçado. Chegamos agora ao Governo… O caso não começa com o Governo, não é?
O caso começa com o Nuno Rebelo de Sousa, o filho do Presidente da República. Marcelo Rebelo de Sousa deu explicações. Agora, segundo uma auditoria, o secretário de Estado da Saúde fez telefonemas para marcar uma consulta no Hospital de Santa Maria. É mais um caso de abuso de poder num governo de maioria absoluta?
Há averiguações que ainda estão em curso, eu ainda não conheço a auditoria e quero ter alguma cautela com os comentários que faço sobre este caso. Para mim, obviamente, é claro que o acesso aos cuidados de saúde em Portugal deve ser feito em condições de igualdade e os procedimentos devem ser transparentes e, por isso, qualquer interferência naquilo que é o funcionamento correto do Serviço Nacional de Saúde, desde logo interferência política em decisões que são clínicas, é errado e não pode ser aceite…
Já sabemos que houve…
Eu não sei, não conheço, e há averiguações que ainda estão a decorrer, desde logo um inquérito aberto por parte do Ministério Público. Agora, não deixo de constatar o seguinte: Durante semanas, durante semanas largas, a TVI e a CNN fizeram notícias quase todos os dias sobre um potencial ou eventual envolvimento e intervenção do senhor Presidente da República. E durante essas semanas largas, não foi notícia em mais nenhum órgão de comunicação social…
Há averiguações que ainda estão em curso, eu ainda não conheço a auditora e quero ter alguma cautela com os comentários que faço sobre este caso. Para mim, obviamente, é claro que o acesso aos cuidados de saúde em Portugal deve ser feito em condições de igualdade e os procedimentos devem ser transparentes e, por isso, qualquer interferência naquilo que é o funcionamento correto do Serviço Nacional de Saúde, desde logo interferência política em decisões que são clínicas, é errado e não pode ser aceite…
Isso é irrelevante para o que se está agora a discutir.
Não, não é.
Porquê?
Porque quando o caso chega ao Governo, toda a gente vê o interesse no caso. É a minha constatação pessoal.
Que leitura retira disso? A comunicação social anda a fazer fretes ao Presidente da República?
É constatação de um facto. Durante semanas, a notícia não saiu da TVI/CNN.
Mas, então, porque acha que não saiu? Qual é a sua explicação?
Não sei, isso não sei. Porque entenderam que não tinha interesse como notícia.
Porque era o Presidente da República?
Não sei. O António Costa é que me pode explicar. Como eu não sou da comunicação social, não tenho explicação agora. Mas é um facto.
O Presidente da República foi obrigado a dar uma conferência de imprensa na sequência das investigações da TVI/CNN. Percebe-se depois que há quem não esteja a dar explicações, e o PS, aliás, inviabilizou a ida de Marta Temido e Lacerda Sales ao Parlamento prestar declarações sobre o caso. Subscreve esta posição?
Julgo que já houve declarações dadas e que as averiguações estão a decorrer, e vão participar dessas averiguações… Eu não quero prolongar muito o tema. Não conheço o caso em pormenor, não quero fazer juízos que sejam injustos.
Se fosse no seu caso, esperava pela Justiça ou dava ou dava explicações políticas?
Não estou dentro do caso e não quero dizer nada que possa criar injustamente dificuldades a pessoas concretas. Eu não quero ser injusto. Não quero que nada do que diga seja imputado, usado contra pessoas que têm o direito de se defender. E eu não quero ser um instrumento no ataque ou na acusação.
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