“Há um espaço gigantesco de melhoria” na energia eólica offshore para baixar custos

O CEO da Wavec afirma que a indústria de energia eólica offshore tem de melhorar a eficiência, de forma a conseguir baixar custos. E há espaço para inovar também nos contratos financeiros.

O CEO da Wavec, Marco Alves, é um homem forte da inovação no que diz respeito à energia eólica offshore, não fosse a sua empresa dedicada a prestar apoio aos promotores, tanto nas candidaturas e estratégia para o leilão como em termos de engenharia numa fase mais avançada. O gestor identifica que “há um espaço gigantesco de melhoria” na indústria, de forma a aperfeiçoar o panorama em termos de custos, e acredita que, apesar dos atrasos, o interesse se mantenha aceso. Espera que cerca de dez promotores avancem mesmo para o leilão, deixando apenas um aviso: “É mesmo importante não deixar o leilão ir além de 2025”, para que o interesse não arrefeça ainda mais do que já tem arrefecido.

Apesar de, atualmente, já existirem alguns projetos de eólico offshore espalhados pelo mundo, o desafio de investir e construir projetos novos é grande, sobretudo por uma questão de escala, assinala Marco Alves. Para pôr em perspetiva: um gigawatt, metade do objetivo de instalação definido por Portugal até 2030, equivale a 1.000 megawatts. “O que temos no mundo todo, de momento, são cerca de 100 megawatts. É absolutamente residual o que temos face ao que pretendemos atingir“, observa, em entrevista ao ECO/Capital Verde, em antecipação ao seminário co-organizado esta terça-feira pela empresa, intitulado “Portugal and Norway: Fostering Offshore Wind Supply Chain Development“.

Marco Alves, CEO da Wavec

Neste sentido, “é preciso reduzir o custo desta tecnologia”, assume. “E é aqui que entra a inovação”: é necessário, por exemplo, projetar com base em novos materiais, como o betão, e não apenas em aço, que é para já o material dominante na construção. Também é necessário trabalhar a resiliência dos equipamentos e o planeamento da operação e manutenção, assim como a criação de novas metodologias de instalação, mais otimizadas em termos de recursos. “Há um espaço gigantesco de melhoria”, calcula Marco Alves, uma vez que a indústria já funciona, “mas não da maneira mais eficiente”, o que permitiria reduzir custos.

Porém, não é tudo sobre tecnologia. “Temos sempre tendência a pensar a inovação do ponto de vista da tecnologia, mas tem de ser encarada de forma muito mais ampla”, considera o líder da Wavec.

Por exemplo, existe um mecanismo financeiro “muito interessante”, que Marco Alves espera que seja aplicado no próximo leilão do Reino Unido, e que poderá ajudar a aliviar o fardo por parte dos promotores, Estado e, em última análise, consumidores. A ideia é definir um “strike price“, no fundo, o equivalente a uma tarifa garantida, não para o projeto todo, mas faseadamente.

De momento, o esperado é que, numa primeira fase do leilão, sejam atribuídas as áreas de exploração e, numa segunda, sejam firmados os contratos, recorrendo à figura dos Contratos por Diferença, que garantem uma remuneração fixa (strike price) para a eletricidade que é produzida com estes projetos.

Na opinião de Marco Alves, seria interessante definir diferentes strike prices à medida que os projetos avançam: começar por definir, por exemplo, um preço fixo para os primeiros 200 megawatts instalados, o qual será naturalmente mais alto dado o maior risco característico da fase inicial, outro para os 200 megawatts seguintes e assim sucessivamente. Um mecanismo “que permite desenvolver a indústria de forma cautelosa”, explica.

Em paralelo, elogia a iniciativa já partilhada pela ministra da “diplomacia energética”, que consiste em permitir que outros países invistam em projetos de energia eólica offshore ao longo da costa portuguesa, com o benefício de estes serem contabilizados para as metas energéticas do país investidor. O Luxemburgo tem sido o parceiro falado, mas Marco Alves acredita que existirão mais interessados. Com este mecanismo, também se poderá diminuir o fardo para o consumidor final, servindo de “desconto” para o strike price, pondera.

Leilão “tem de sair” em 2025

“Há atrasos” no desenvolvimento da indústria da energia eólica offshore, relacionados com a queda do anterior governo, reconhece Marco Alves. Estes, “apesar de compreensíveis”, “podem ser prejudiciais”, no sentido de reduzir o interesse dos investidores em Portugal. “Já se sente um pouco [essa redução do interesse], mas não é motivo para entrarmos em pânico“, balança. É que, apesar dos atrasos, ainda “há muitos promotores que estão a olhar para Portugal“, garante o gestor.

Marco Alves afirma que tem mantido um contacto “próximo” com vários promotores, já num período posterior à tomada de posse do novo Governo, e que muitos se mantêm atentos na perspetiva de antecipar os aspetos que podem ser valorizados no leilão, como a articulação com outros setores da economia azul ou uma cadeia de fornecimento mais local.

“Há aqui uma espécie de uma corrida. Há vários países a preparar leilões, o que por um lado causa muita pressão. Dá a oportunidade aos promotores de escolherem a geografia em que se querem posicionar”, indica. Neste sentido, “é mesmo importante não deixar o leilão ir além de 2025”, recomenda.

É mesmo importante não deixar o leilão ir além de 2025.

O próximo passo — que “é crítico” e “difícil” — é a definição dos critérios de pré-qualificação, ainda antes de avançar para o leilão — pelo que seria chave tê-los delineados na primeira metade do próximo ano, alerta Marco Alves. Estes terão de ser “assertivos”, valorizando a experiência, competência de execução, histórico e fôlego financeiro. Dos 50 que manifestaram interesse inicialmente — sendo que existiram desistências mas há novos interessados –, Marco Alves conta que cerca de uma dezena tenham condições para se apresentar de facto ao leilão. Um número “mais que suficiente” do ponto de vista da concretização de metas.

Espanha e Noruega são potenciais parceiros

Acho que vamos falar numa cadeia de fornecimento ibérica, mais do que portuguesa ou espanhola“, defende Marco Alves. O gestor alicerça esta crença na constatação de que alcançar os objetivos relativos à energia eólica offshore que estão inscritos no Plano Nacional de Energia e Clima em Portugal, assim como no documento homólogo espanhol, é “muito difícil”, de “uma dimensão de tal ordem que toda a ajuda é pouca”, e “Espanha pode ter um papel fundamental”.

A sustentar estas afirmações, realça que uma das três plataformas que constituem o primeiro (e único) projeto de energia eólica offshore do país, o Windfloat Atlantic, foi construída na Galiza. E os dois gigawatts de capacidade desta energia que Portugal se propõe erguer até 2030 correspondem a mais de 100 plataformas, considerando turbinas de 15 megawatts, que só por si “já é uma Torre Eiffel a flutuar no oceano”, tendo em conta as respetivas dimensões. “Temos de ter capacidade para construir isso. Conseguimos sozinhos? Se calhar sim, mas é melhor com apoio. É preciso dar corpo a este setor, que está numa fase muito embrionária ainda“, afirma. E acrescenta a ressalva: “sem os portos nada disto vai acontecer”, sendo que é necessária capacidade de armazenamento, gruas adequadas e uma série de adaptações à infraestrutura, para permitir a exportação.

Mas não será Espanha o único território que poderá ter um papel relevante na construção de parcerias com Portugal. A Noruega é um potencial parceiro identificado pela Wavec, que organiza a conferência em parceria com a Embaixada da Noruega em Portugal, a Innovation Norway e a Norwegian Offshore Wind.

“A Noruega está muitíssimo bem posicionada” para ser parceira de Portugal na indústria do eólico offshore, uma vez que “há capacidades complementares que podem criar base sólida para cooperação”, acredita Marco Alves. Para começar, vê o mesmo grau de interesse por esta indústria em ambos os países, que considera essencial como ponto de partida. As duas nações assinaram, há cerca de um ano, um Memorando de Entendimento, assinado por centenas de empresas que estabelece essa mesma vontade de cooperação.

Do lado da Noruega, as capacidades criadas no âmbito da exploração de petróleo e gás são úteis. “Não é a transposição direta do oil and gas para floating wind, mas ajuda” ter este conhecimento, afirma o mesmo gestor, referindo-se por exemplo às embarcações próprias que são usadas no contexto operacional. Os noruegueses “têm a cadeia de abastecimento e a questão logística muito bem preparada”, pontua.

Do lado de Portugal, “as infraestruturas portuárias estão muito bem posicionadas”, considera, destacando os portos de Aveiro e de Leixões. Por cá, existe potencial para fazer assemblagem, equipamentos e parques eólicos, já que a indústria metalomecânica já tem alguma experiência, por causa do projeto Windfloat Atlantic. “Não é um tema completamente novo, há alguma experiência já acumulada, que é melhor que nada”, indica.

Já no que diz respeito à investigação e desenvolvimento, existem instituições académicas “reconhecidas” em cada um destes países, com um “histórico significativo” que “podem articular-se e impulsionar a inovação em conjunto”. Isto porque “há aspetos que é preciso resolver, já que este é um domínio emergente”, alerta Marco Alves. Também do ponto de vista regulatório ambas as nações podem “beber” da experiência uma do outra, de forma a conseguirem enquadramentos mais robustos.

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