“Ministra da Agricultura não tem competência e o Ministério está um caos”, diz presidente da CAP

Se a ministra se mantiver em funções, "ou me engano muito, ou está iminente um verdadeiro desastre ao nível da agricultura", alerta Eduardo Oliveira e Sousa.

A ministra da Agricultura, Maria do Céu Antunes, “não está a ser capaz, sequer, de aguentar o Ministério, quanto mais de o promover”. “Neste momento, era preciso alguém que tivesse uma força e um peso político grande para pôr o Ministério onde ele nunca deveria ter saído”, defende o presidente da Confederação dos Agricultores Portugueses. Eduardo Oliveira e Sousa receia que “está iminente um verdadeiro desastre ao nível da agricultura”, porque “a maior parte dos agricultores depende das ajudas, alguns em mais de 60% do seu rendimento” e não conseguem submeter candidaturas aos apoios.

O presidente da CAP reitera que a ministra da Agricultura não participou nas negociações do acordo tripartido entre o Governo, os produtores e a distribuição, e acredita que as ajudas serão pagas porque está lá a assinatura do primeiro-ministro.

“O Ministério está completamente destroçado e não tem uma perspetiva de futuro. Se há coisa que me faz impressão é uma pessoa ser ministra de um setor para o qual não sabe para onde quer ir”, lamenta Eduardo Oliveira e Sousa, em entrevista ao ECO. E concluiu: “À senhora ministra só falta entregar a chave ao porteiro do Ministério e dizer-lhe: “daqui a bocadinho sff feche a porta e coloque as etiquetas nos vidros a dizer aluga-se”.

Em termos de bastidores do acordo, houve várias peculiaridades: não fez qualquer referência à ministra no seu discurso, não ter apertado a mão do Gonçalo Lobo Xavier após a assinatura do acordo…

A senhora ministra não participou nas negociações, foram feitas diretamente com o gabinete do primeiro-ministro.

Não esteve sentada à mesa convosco?

Não. Não esteve sentada à mesa connosco porque não lhe reconhecemos capacidade técnica sequer para discutir a gravidade da situação.

E ela aceitou?

Não faço ideia. Não sei se alguém lhe fez a pergunta. Por isso dizemos que o acordo é feito com o Governo, na pessoa do senhor primeiro-ministro, mais ninguém. A nossa esperança no sentido de Estado é que alguém assuma uma responsabilidade maior. A única pessoa que o pode fazer é o primeiro-ministro. Acreditamos que estas ajudas serão pagas porque está lá a assinatura do senhor primeiro-ministro. À senhora ministra, face a este historial todo, principalmente destes dois últimos anos, só falta entregar a chave ao porteiro do Ministério e dizer-lhe: “daqui a bocadinho sff feche a porta e coloque as etiquetas nos vidros a dizer aluga-se”. O Ministério está completamente destroçado e não tem uma perspetiva de futuro. Se há coisa que me faz impressão é uma pessoa ser ministra de um setor para o qual não sabe para onde quer ir.

À senhora ministra só falta entregar a chave ao porteiro do Ministério e dizer-lhe: “daqui a bocadinho sff feche a porta e coloque as etiquetas nos vidros a dizer aluga-se.

E quanto ao aperto de mão ao diretor-geral da APED?

Ainda bem que me faz essa pergunta. Tenho pena que não seja possível andar para trás com algumas imagens. É fácil perceber que não vi a mão estendida.

Andando para trás nas imagens não é essa a sensação que dá.

Não apertei a mão porque não me passou pela cabeça. Estava a cumprimentar o senhor primeiro-ministro porque nós, o Gonçalo e eu, representávamos dois setores que estavam juntos. Éramos um. Não valia a pena cumprimentarmo-nos um ao outro. Foi um não caso. Não pensei nisso. Não dei por isso. Para mim, o objetivo era o acordo, os dois a mostrar que estávamos juntos com o Governo. Mais valia que lhe tivesse passado o braço por cima do ombro. Era essa a imagem que gostava de ter passado. Agora sempre que estamos juntos em ocasiões públicas até fazemos uma certa laracha à volta disso.

Tem a expectativa de que a ministra da Agricultura seja afastada durante esta legislatura?

Se houvesse um sentido de Estado da nossa governação, esta senhora já não tinha sido [reconduzida como] ministra nas últimas eleições. O facto de ainda se manter em funções, ou me engano muito, ou está iminente um verdadeiro desastre ao nível da agricultura.

Quem gostaria de ver substituir ministra da agricultura?

Isto não tem a ver com pessoas, mas com competências de pessoas. Não me canso de dizer que não tenho nenhuma animosidade contra a Dra. Maria do Céu Antunes. Mas não lhe reconheço capacidade técnica para abraçar uma tarefa complexa como é o Ministério da Agricultura. Não sou do PS, não conheço o PS e, neste momento, com a maioria absoluta do PS ninguém iria para o Ministério da Agricultura que não fosse do PS, ainda por cima com aquela forma familiar de gerir os cargos políticos.

Veria com bons olhos o regresso, por exemplo, de Capoulas Santos?

Não será possível, neste momento. Basta conhecê-lo com a competência que tem na matéria e a objetividade que tem — foi eurodeputado, relator da PAC, sabe bem o valor da floresta e a importância que tem na sua integração no setor agrícola, o valor estratégico da água — tudo políticas que neste momento estão menorizadas com a estrutura do Governo atual. Não creio que aceitasse ser ministro da Agricultura neste momento. Não tenho nenhuma proposta ou recomendação. Sei que esta senhora não está a ser capaz, sequer, de aguentar o Ministério, quanto mais de o promover. Neste momento era preciso alguém que tivesse uma força e um peso político grande para pôr o Ministério onde ele nunca deveria ter saído.

Neste momento era preciso alguém que tivesse uma força e um peso político grande para pôr o Ministério onde ele nunca deveria ter saído.

O facto de ser ela que conduz os dossiers, as notificações em Bruxelas, a agilização dos pagamentos aos agricultores, prejudica os agricultores por a CAP ser tão crítica dela?

Tudo o que tenha a ver com a PAC e as suas regras, creio que não. São decisões tomadas em Bruxelas. Agora a agilização dos procedimentos, pôr em prática a máquina que permite aos agricultores terem acesso às ajudas neste momento está totalmente emperrado. Há um processo de candidaturas que está a decorrer há dois meses e não consegue funcionar por falta de eficácia dos serviços. Houve uma pressa, que ninguém entendeu, de aprovar o PEPAC [Plano Estratégico da PAC 2023-2027] português à frente dos outros países. Está mal concebido. O programa informático que dá apoio às candidaturas não está a funcionar, as candidaturas não se conseguem submeter. Isto já devia ser uma luz vermelha, a ponto de haver nervosismo no Ministério. Os funcionários deveriam estar empenhadíssimos em resolver aqueles assuntos. O próprio IFAP, que é o organismo pagador e recebedor das ajudas, está em desagregação, porque o Ministério está todo em desagregação.

Está a falar da decisão de integrar as direções regionais nas CCDR?

Já nem estou a trazer para a equação essa absurda decisão de acabar com as direções regionais. Dizem que não é para acabar, mas, transpor a tutela das Direções regionais para o Ministério da Coesão, na prática vai ser acabar com elas. É um absurdo. Agora com o próprio IFAP, o que é que sobra dentro do Ministério da Agricultura? Pergunto: há alguma coisa a funcionar razoavelmente bem no Ministério da Agricultura? Não há. Perdeu capacidade técnica, de intervenção, peso político, áreas importantes da economia do setor primário associadas à agricultura, florestas, água, animais, está tudo em desagregação. Está um caos. A relação com os agricultores é a coisa mais absurda que há. Em vez de concentrar serviços, fazer uma espécie de filosofia de loja do cidadão para que o agricultor, num único local poderia obter as licenças da água, para cortar uma árvore, está tudo espalhado. O que antes era economia agora é proteção do ambiente. Misturam-se conceitos e o país está a afundar-se.

Há alguma coisa a funcionar razoavelmente bem no Ministério da Agricultura? Não há. Perdeu capacidade técnica, de intervenção, peso político, áreas importantes da economia do setor primário associadas à agricultura, florestas, água, animais, está tudo em desagregação. Está um caos.

O setor agrícola está a fundar-se, o território mais abandonado, há uma maior capacidade de invasão dos incêndios, uma menor atratividade do setor para jovens, porque não existe uma estratégia de conjunto. Era interessantíssimo haver 5G nas terras mais remotas para os agricultores de vanguarda, candidatos a fazer um produto exótico numa região do país que pudesse beneficiar da sua proximidade com Espanha, para criar sinergia com Espanha, para levar aquele produto para os mercados europeus. Enquanto não houver água, internet, segurança nos serviços, agilidade nos procedimentos no território nada disso acontece. Consequência: há um abandono do território. Os velhos que lá estão hão-de morrer e depois não vai para lá ninguém.

Como se faz a regeneração de um setor envelhecido com propriedades de pequena dimensão? E as ajudas são menos para propriedades maiores.

As ajudas não podem ser condicionantes do interesse económico da atividade. Não se podem substituir à rentabilidade do setor.

Mas se não fossem as ajudas muitas das explorações não existiam?

A maior parte dos agricultores depende das ajudas, alguns em mais de 60% do seu rendimento. Por isso digo que temos uma bomba iminente se esta questão das candidaturas correr mal. Mas, há setores que beneficiam das ajudas e é bom que sejam introduzidas para criar competitividade e permitir que o mercado funcione, permitindo manter preços compatíveis com o consumo. O agricultor tem de receber a parte que é paga pelo Estado a tempo e horas para que a outra parte que é paga pelo mercado seja mais pequena. O primeiro beneficiário das ajudas da PAC é o consumidor final. No caso de haver uma exploração maior há maior criação de rentabilidade, pode profissionalizar melhor o sistema produtivo, ter funcionários mais bem pagos e qualificados. Há um acréscimo de valor que vai do trabalhador ao empresário.

Então deveríamos privilegiar as explorações maiores?

Não têm de ser todos necessariamente grandes. Um setor ou região podem ser grandes se os agricultores, independentemente da sua dimensão estiverem devidamente organizados nas chamadas organizações de produtores, para criar, por exemplo agressividade comercial na ligação com as grandes superfícies A maior organizações de produtores belga tem uma faturação de 500 milhões, a maior portuguesa tem 40 milhões. Em Portugal, 80% dos agricultores estão no mercado das relações ou de proximidade — um chavão muito bonito utilizado pela senhora ministra, as cadeias curtas. Mas a UE é uma gota de água no mercado mundial, por isso, o mercado de proximidade de Portugal deve ser a Europa. Não é ter o agricultor de Cuba a vender em Beja e o de Aveiro a vender no Porto. Isso é a manutenção de uma agricultura de sobrevivência. Agora, é na zona do minifúndio que é preciso ganhar autonomia financeira para que a atividade seja apetecível à geração seguinte. Se não, quando desaparecerem os mais idoso vai dar lugar a maior abandono do território.

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