Presidente do Banco de Fomento: “Há um ano tínhamos 50 milhões disponibilizados às empresas. Já passámos os 300 milhões”

Divulgação dos instrumentos de apoio às empresas, incluindo garantia mútua, PME Investimentos e Portugal Ventures já é feita de forma coordenada. "Esse esforço já existe na prática", diz Henrique Cruz

O presidente da Instituição Financeira de Desenvolvimento, mais conhecida por banco de fomento, está a acelerar e a fazer chegar mais dinheiro à economia. Na sua primeira entrevista desde que assumiu a presidência executiva da instituição, Henrique Cruz, revela que, há um ano, a IFD, reunindo todos os seus instrumentos financeiros, tinha disponibilizado às empresas 50 milhões de euros de empresas, mas agora, até ao final de setembro, esse valor passou para 300 milhões.

“O facto de termos passado para 300 milhões demonstra que estamos a conseguir fazer a diferença”, disse Henrique Cruz. O responsável explica as razões pelas quais ficou na IFD, passando o longo período de incerteza e marasmo que marcaram o banco de fomento.

Henrique Cruz frisa que sente a força das instituições europeias por trás da IFD e garante que os bancos promocionais continuam a fazer todo o sentido porque as falhas de mercado persistem. Mudam, é verdade, mas mantém. Em Portugal, a falta de financiamento às startups, a falta de financiamento de longo prazo e a falta de investimento em capital de risco, são algumas das falhas identificadas que a IFD quer ajudar a resolver. “Daí sermos um dos patrocinadores do Venture Summit”, que decorreu em Lisboa na segunda-feira e onde o primeiro-ministro anunciou uma nova linha de 100 milhões de euros para apoiar projetos de inovação tecnológica. “Acreditamos que estamos a contribuir para suprir essa falha de mercado e melhorar o acesso ao financiamento destas empresas”, frisa Henrique Cruz.

O primeiro-ministro anunciou esta segunda-feira um fundo de 100 milhões de euros para apoiar projetos de inovação tecnológica. Pode dar mais detalhes sobre este novo instrumento?

É uma iniciativa que anunciaremos nas próximas semanas que tem origem na resolução do Conselho de Ministros dedicada à inovação. Será uma parceria para investir em empresas de base tecnológica em Portugal e também para desenvolver equipas de gestores de venture capital portugueses. E mais não digo para não estragar a surpresa.

Segundo o primeiro-ministro o fundo vai ser financiado em 50% pelo Fundo Europeu de Investimento (FEI). E quem investe o resto?

Será dinheiro de origem nacional, através do IAPMEI.

Qual a razão de ser desta linha?

Associada a esta iniciativa com o FEI está uma falha de mercado para a qual estamos a olhar: a forte redução do investimento privado em capital de risco. Ou seja, devido à regulamentação comunitária os bancos passaram a ter menos interesse em investir em capital de risco. Os fundos de pensões foram nacionalizados na sua maioria, e as seguradoras têm cada vez mais as reservas geridas fora de Portugal. Desde 2010 há uma forte redução de dinheiro nacional dedicado ao investimento em capital de risco, daí que a IFD esteja a mobilizar dinheiro de origem nacional para fazer a vez desses investidores que se afastaram do mercado.

Desde 2010 há uma forte redução de dinheiro nacional dedicado ao investimento em capital de risco, daí que a IFD esteja a mobilizar dinheiro de origem nacional para fazer a vez desses investidores que se afastaram do mercado.

Henrique Cruz

CEO da IFD

Esta linha acresce à que a IFD já disponibiliza em termos de capital de risco?

Sim acresce à de capital de risco que já está no mercado. Tem dois benefícios: traz o FEI e toda a sua best practice e traz dinheiro adicional deste fundo.

Como está a correr essa linha?

A primeira linha de capital de risco foi atribuída em setembro do ano passado. Foram protocoladas 15 sociedades de capital de risco, com as quais investimos 50/50. A IFD põe um euro e as sociedades capitais de risco têm de levantar o outro euro. São 93 milhões nossos e mais 111 milhões privados. Está operacional, já há 16 operações investidas em empresas, já realizou investimento em empresas de cerca de 26 milhões de euros, mas ainda há dinheiro disponível nessas capitais e risco. Olhamos para essas entidades de capital de risco como parceiro operacionais. A IFD é um banco de segundo piso, não temos balcões…

São um banco grossista.

Somos grossistas. Todas essas entidades de capital de risco são os nossos parceiros no terreno para identificar as empresas em que devem investir o dinheiro deles e o nosso.

Cabe às capitais de risco decidir em que empresas devem investir?

Esse é a virtude deste modelo. Como põem dinheiro têm a preocupação de escolher bons projetos. Delegamos neles a avaliação do risco do projeto e evitamos o risco moral.

E no novo fundo que vai ser operacionalizado com FEI, a quem caberá a seleção dos projetos?

Não vou adiantar mais sobre isso.

Apesar de ainda haver dinheiro disponível nessa linha continua a ser identificada essa falha de mercado para capital de risco?

Exatamente. Por isso a linha de 100 milhões de euros com o FEI vem acrescer à linha que já temos no mercado. Este tema das startups é-nos muito caro, esta relacionado com as falhas de mercado do acesso ao capital. Em particular estas empresas, que estão a começar a atividade, não têm capacidade de oferecer garantias, nem um histórico de atividade para serem financiadas através da banca, portanto, carecem de outro tipo de instrumentos como é o caso dos business angels e do capital de risco. E a IFD está atenta a isso, ao protocolar estes financiamentos para que as startups tenham acesso a financiamento. Entendemos que as startups são um motor de dinamização da economia, inovação e renovação do tecido económico.

E quanto às linhas para business angels. Já estão duas operacionais?

Sim. Na primeira linha colocámos 18 milhões de euros e os privados vão pôr cerca de mais 20. E essa primeira linha já realizou 120 operações de investimento (tem 120 empresas investidas). Já realizou investimentos de 14 milhões de euros. Na segunda linha, as entidades já estão escolhidas e contratadas. A linha foi assinada durante os meses de verão deste ano, protocolámos mais 35 entidades de business angels, com outros 18 milhões de euros, aos quais elas vão acrescentar outro tanto. Creio que falta assinar contratos com duas ou três. Essas 35 entidades já estão a operar e já foram realizadas duas operações de investimento em empresas nesta segunda fase.

Os atrasos nos pagamentos aos business angels já foram regularizados?

Neste momento, se falar com qualquer business angels vai ver que está tudo em dia. Temos um compromisso contratual com eles de fazer análise da candidatura, temos de a pré-enquadrar à luz das regras comunitárias e pagamento em 21 dias e estamos a cumprir isso.

Neste momento, se falar com qualquer business angels vai ver que está tudo em dia. Temos um compromisso de pagamento em 21 dias e estamos a cumprir isso.

Henrique Cruz

CEO da IFD

Os atrasos decorreram das perturbações que a IFD sofreu?

Pode ter havido um momento ou outro que, por via da transição de saldos de um ano para o outro, do ponto de vista orçamental, houvesse um atraso. De facto, em janeiro de 2018 houve um atraso da nossa parte que teve a ver com isso. A partir do momento em que isso foi resolvido entrámos em velocidade cruzeiro. Pode haver situações pontuais mas, neste momento, não tenho notícia de que haja algum problema.

Não há o risco de a situação se repetir em janeiro de 2019?

Não porque, entretanto, o Governo fez, em maio, um decreto-lei específico para os nossos fundos para afastar todos os problemas burocráticos que tínhamos com o instrumento de capital.

Do conjunto de linhas que operacionalizam existe ainda o 200M que apesar de ter demorado a sair agora até já tem as candidaturas fechadas.

Atribuímos a gestão do 200M à PME Investimento. Foi selecionada por concurso público internacional. O papel da IFD é dotar o fundo com dinheiro proveniente do nosso fundo de capital, coisa que já fizemos. A partir do momento em que contratámos a sociedade gestora todo o processo de análise de candidaturas e decisão de investimento está delegada na PME Investimentos.

O reforço da IFD passava por integrar a PME Investimentos, mas também a Portugal Ventures. Como está esse processo?

Há uma preocupação e um objetivo de reforçar a coordenação das entidades no seio do Ministério da Economia. Temos estado a fazê-lo. Se vir as apresentações recentes da IFD, procuramos divulgar todos os instrumentos de apoio às empresas, incluindo a garantia mútua, a PME Investimentos e a Portugal Ventures. Esse esforço de coordenação da nossa intervenção já existe na prática. A questão da arquitetura da organização das empresas carece de autorização da Comissão Europeia.

Esse esforço de coordenação da nossa intervenção já existe na prática. A questão da arquitetura da organização das empresas carece de autorização da Comissão Europeia.

Henrique Cruz

CEO da IFD

A linha Capitalizar Mais tem uma dotação de mil milhões. Quanto já foi utilizado?

Em dezembro do ano passado sofreu uma grande alteração de condições, porque financiava projetos só até seis anos passou a financiar até 12 e o nível de garantia passou de 65 para 80%. A partir daí a execução aumentou significativamente. Reunindo todos os instrumentos financeiros da IFD, há um ano tínhamos 50 milhões de euros disponibilizados às empresas, no final de setembro passámos os 300 milhões. E o grosso é a linha capitalizar Mais.

Por que razão foram introduzidas essas alterações?

Porque estava a ter uma execução baixa. Temos reuniões semestrais com os programas financiadores e aproveitámos uma delas para introduzir essas alterações.

Ou seja, esta linha é financiada pelos Programas Operacionais Regionais?

Sim.

No âmbito da reprogramação do Portugal 2020 parte do dinheiro dos PO Regionais que estava inicialmente destinado à IFD vai ser alocado a outros fins. Como vai a IFD colmatar essa redução de financiamento?

Não lhe vou responder porque é um tema que vai resultar da reprogramação. Só posso dizer que o montante disponível às empresas não vai ser diminuído.

No âmbito da IFD também? No âmbito da reprogramação, o Governo já disse que vão estar disponíveis mais 5 mil milhões de euros para as empresa?

Da IFD também. Mas não quero falar mais sobre isso.

Este cuidados de ir alargando as regras de modo a que a IFD possa chegar mais às empresas visa responder aos apelos de fortalecimento da IFD, como pediu a CIP no seu caderno de encargos para o Orçamento do Estado para 2019?

Estamos a trabalhar em tudo aquilo que é o nosso espaço estatutário. O alargamento que o Governo decidiu, em meados do ano passado, às mid caps estamos a aproveitá-lo — aliás foi anunciada a linha de mid caps há pouco tempo precisamente para cobrir essa franja de mercado — e na parceria com o FEI também as mid caps vão ser elegíveis para serem financiadas.

O que senti ao longo deste tempo que estive na IFD é que há essa força por trás do projecto. Há uma vontade que vem da Comissão Europeia para que esta instituição exista, porque faz falta.

Henrique Cruz

CEO da IFD

Foi o único elemento que passou da anterior direção para a atual. O anterior chairman, Alberto de Castro, reconheceu que tinha expectativas demasiado elevadas para a IFD. Já o vice presidente do BEI diz que tem expectativas enormes. Em que ficamos?

As instituições europeias têm promovido muito a existência de um banco promocional em cada um dos Estados membros porque entendem que deve haver um extensão do Banco Europeu de Investimentos em cada país. O que senti ao longo deste tempo que estive na IFD é que há essa força por trás do projeto. Há uma vontade que vem da Comissão Europeia para que esta instituição exista, porque faz falta. E, por outro lado, o que me fez ficar aqui é que isto está a começar. Há um ano tínhamos 50 milhões, não era quase nada. O facto de termos passado para 300 demonstra que estamos a conseguir fazer a diferença. E depois, todo o projeto está a ser criado, a constituir a equipa, as pessoas e o projeto. Foi com esse espírito que estive, desde junho do ano passado, no projeto. Foi esta onda que vem lá de fora favorável e este desafio de criar uma coisa nova.

Existem de facto falhas de mercado que justifiquem instituições como a IFD?

Claro que sim. É o caso das startups. Também se costuma dizer que já passou a falta de liquidez do sistema bancário é preciso ver que existe liquidez, mas é de curto prazo. É importante que haja financiamento de longo prazo e nós estamos a trabalhar nisso. Em cada momento do ciclo económico há vários tipos de falhas de mercado e a IFD tem essa missão de tentar procurar em cada momento onde é que deve intervir.

A IFD tem a gestão de um fundo de fundos de 100 milhões de euros para apoiar a internacionalização. Já foram realizadas operações?

Ainda não está operacional.

E já foi criado o conselho geral?

Ainda não está operacional.

Em julho falou-se da possibilidade de ser criada uma segunda versão do Portugal Venture Capital Iniciative (PVCI II). É algo que está na calha para avançar?

Vai depender primordialmente do próprio Fundo Europeu de Investimentos, porque o PVCI foi muito centrado em private equity e este é centrado no segmento de venture capital, ou seja, numa fase mais inicial das empresas. É um tema que, neste momento, não temos em cima da mesa. A IFD funciona muito na lógica da identificação de falhas de mercado, por detrás de qualquer iniciativa nossa está identificada uma falha de mercado: situações que do ponto de vista do benefício social e comunitário têm interesse económico, mas pela relação risco/retorno não são apetecíveis no curto prazo ao investidor exclusivamente privado. O que a IFD procura fazer é melhorar essa relação risco retorno ou através da partilha de investimento ou de uma garantia, ou através da estabilidade do investimento a longo prazo tornar esses investimento viáveis.

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