“Queremos uma agenda da fiscalidade digna”

O presidente da Iniciativa Liberal, Rui Rocha, afirmou em entrevista ao ECO que o país está a ser gerido em função da agenda mediática do primeiro-ministro. E defende uma agenda da fiscalidade digna.

Portugal precisa de uma agenda da fiscalidade digna, em complemento à nova agenda do trabalho digno que entrou em vigor neste dia 1 de maio. “Obviamente, o trabalho tem que ser digno, tem que ter regras claras, tem que haver responsabilidade social, mas não podemos ter uma sucessiva e sistemática exigência sobre as empresas, quando, depois, não temos de facto aquilo que considero ser uma agenda da fiscalidade, nomeadamente sobre os rendimentos do trabalho”, afirmou Rui Rocha em entrevista ao ECO.

O presidente da Iniciativa Liberal considera que, neste momento, “o país está a ser gerido em função da agenda mediática do primeiro-ministro”. O que fariam de diferente face ao Governo? “O que dizemos é que, para aqueles que têm rendimentos, não se faça esta política de distribuição de pacotes, de medidas avulso de 15 em 15 dias, de três em três semanas, porque as pessoas não sabem com o que contam“.

O ministro Fernando Medina está ferido na sua autoridade política?

Desde o princípio…

Depois de ter sido derrotado em Lisboa, foi uma surpresa, mas definiu como primeira prioridade a redução da dívida pública. Não é um objetivo que a Iniciativa Liberal também partilha?

Não questionámos [a redução da dívida], sempre defendemos que o país tem que ter contas contas certas, tem que estar equilibrado, e que a dívida é claramente um problema e um estrangulamento…

…portanto, Fernando Medina está a fazer bem?

Fernando Medina está a aproveitar uma conjuntura… A inflação tem coisas boas, como sabemos, está obviamente a utilizar a inflação para abater aquilo que eram esses problemas estruturais de Portugal. Agora, a questão é sobretudo do equilíbrio. A redução da dívida é um desígnio obviamente importante que está a ter um contributo muito importante…

…e que nos tira do foco dos investidores, das agências de rating, do risco de voltarmos ao passado.

Sem dúvida, mas a inflação, para o mal e para o bem, não é responsabilidade de Fernando Medina, teve uma ajuda muito grande para esses indicadores. Agora, temos que ter também uma visão sobre o crescimento do país e, portanto, aquilo que criticamos, sobretudo, é que o crescimento da economia continua a não ser uma prioridade do Partido Socialista e da sua governação. E quando olhamos para o Plano de Estabilidade que foi agora apresentado, vemos o crescimento a partir de 2023 até 2027 abaixo dos 2%. Aliás, se não estou em erro, mais baixo do que aquilo que estava previsto no Programa de Estabilidade anterior, que está aqui.

Sim, apontava para um crescimento superior a 3%.

No discurso político, passámos de 1,3% para 1,9% no curto prazo, é uma notícia, enfim, razoável dentro da mediocridade geral, mas se olharmos, depois, aos dois programas de estabilidade, estamos com crescimentos mais frágeis e mais medíocres.

O conjunto de problemas que temos está muito ligado à questão do crescimento económico. Se olharmos para as questões da natalidade, aí temos, obviamente, uma questão de crescimento económico. Se olharmos para o futuro próximo, para o despovoamento do país, temos uma questão de crescimento económico, se olharmos para a emigração, sobretudo dos jovens mais qualificados, temos um problema de crescimento económico. Se olharmos para a questão da sustentabilidade da Segurança Social, aí temos o problema do crescimento económico e, portanto, há muito que isto possa parecer ‘monotema’, creio que o crescimento tem de ser mesmo o objetivo o objetivo central.

neste momento, o país está a ser gerido em função da agenda mediática do primeiro-ministro. Há duas coisas distintas. Por um lado, temos as famílias que têm os seus rendimentos, sabemos que genericamente são baixos comparativamente. e não precisam que o Estado esteja depois a fazer pequenos pacotes, umas vezes a 30€ por mês, outras vezes a 90€, outras vezes é 120€… Aquilo que era necessário, e temos defendido isso, é que haja uma redução de impostos, nomeadamente impostos sobre o trabalho.

Rui Rocha

Esse é um objetivo estrutural, mas o Governo tem respondido às urgências que têm surgido com os sucessivos planos de apoio. Era possível fazer de forma diferente essa estratégia de apoio às famílias e às empresas?

Mas esse é mesmo o problema. É que, neste momento, o país está a ser gerido em função da agenda mediática do primeiro-ministro. Há duas coisas distintas. Por um lado, temos as famílias que têm os seus rendimentos, sabemos que genericamente são baixos comparativamente. e não precisam que o Estado esteja depois a fazer pequenos pacotes, umas vezes a 30€ por mês, outras vezes a 90€, outras vezes é 120€… Aquilo que era necessário, e temos defendido isso, é que haja uma redução de impostos, nomeadamente impostos sobre o trabalho.

Temos condições orçamentais para isso? É possível defender a redução de impostos em IRS e defender uma redução da dívida pública e do défice?

Aparentemente, temos um plano do ministro Medina para a redução de impostos na ordem dos dois mil milhões, nomeadamente o IRS, até 2027. Porquê? Porque, entretanto, esteve nos últimos anos, últimos três anos, a cobrar mais três mil milhões. Para além do desfasamento entre o que cobra e aquilo que, depois, devolve, há o desfasamento temporal entre ter já no bolso do Governo aquilo tem cobrado e aquilo que depois vai devolver. Quando a Iniciativa Liberal diz “baixem-se os impostos”, pergunta-se onde é que vão cortar, não é? Mas quando o ministro Fernando Medina apresenta uma baixa de impostos…

Mas o ministro Fernando Medina tem anunciado objetivos de baixas de impostos depois de apresentar resultados nas contas públicas. A Iniciativa Liberal propõe outra coisa, ir mais longe na redução de impostos do que aquilo que está a ser feito.

Há uma semana, semana e meia, estive reunido com a Associação Empresarial do Minho e, estranhamente, aquilo que me dizem é que gostariam de ter um contexto fiscal para as empresas mais favorável, mas o pedido que fazem é para a baixa dos impostos sobre o trabalho. Quando o primeiro-ministro diz que as empresas têm que subir os salários aos portugueses, sim, estão disponíveis para fazer esse esforço e vão fazê-lo, mas pedem a baixem, depois, os impostos às pessoas.

Rui Rocha, presidente da Iniciativa Liberal, em entrevista ao ECO - 28ABR23
Rui Rocha, presidente da Iniciativa Liberal, em entrevista ao ECO Hugo Amaral/ECO

Como é que se paga essa baixa de impostos?

Temos um setor empresarial do Estado e não sabemos o que lá está, há uma opacidade, uma falta de transparência do setor empresarial do Estado. Olhamos para a TAP, que é uma empresa, apesar de tudo, sujeita a um conjunto de regras de governança que aparentemente garantiriam alguma transparência na sua gestão e, com esta comissão de inquérito, vemos o que é que estava lá dentro. O que é que estará dentro do restante setor empresarial do Estado que não é sujeito a este tipo de escrutínio? Há milhares de milhões que, neste momento, estão metidos no setor empresarial do Estado, muitos deles não conhecemos contas…

…Poderia ser uma fonte de financiamento, para exemplo, para financiar a descida de impostos?

É verdade…

…Neste contexto em que estamos a falar, a Iniciativa Liberal continua a defender a evolução no curto prazo para um modelo de IRS de ‘flat tax’ ou, no limite, duas taxas?

Como visão, é essa a proposta da iniciativa Liberal, mantendo a progressividade, nomeadamente, por exemplo, com as duas taxas, mas também das isenções dos salários mais baixos. de reações. Em 2026, a Iniciativa Liberal manterá essa proposta. Entretanto, do ponto de vista de curto, nomeadamente para o orçamento de 2023, já o tínhamos feito o Orçamento 2022. Depois, fizemos uns ajustamentos e fizemos uma proposta de lei para 2023 que visou baixar o IRS para os cinco primeiros escalões, uma ‘flat tax’ para os cinco primeiros escalões. É aí que está concentrado o maior peso, o maior peso do sacrifício que está a resultar da inflação.

Mas, o que fariam de diferente face ao Governo?

O que dizemos é que, para aqueles que têm rendimentos, não se faça esta política de distribuição de pacotes, de medidas avulso de 15 em 15 dias, de três em três semanas, porque as pessoas não sabem com o que contam. Teria sido muito mais sensato fazer uma redução do IRS, como a proposta que fizemos, para que as pessoas possam organizar-se. O dinheiro é das pessoas. Às vezes, é como se o dinheiro desaparecesse. O dinheiro não desaparece, o dinheiro deixa de estar no bolso, mas passa a estar no bolso do Estado, passa a estar no bolso das famílias que, por sua vez, investem, consomem ou poupam. Mas, para isso, precisam de poupança.

A Iniciativa Liberal defendeu também, ou apoiou, a descida do IVA nos bens alimentares, e até considera que chegava tarde. Ao fim de três semanas, a descida do IVA tem um efeito absolutamente marginal. Continua a considerar que foi uma boa decisão, mesmo que tardia?

Sim, tínhamos proposto também no Orçamento 2023 uma descida do IVA, mas era uma mais ampla do IVA. Era uma descida do IVA mais generalizado, mas sempre o fizemos no contexto de um pacote fiscal. Também propusemos a descida do IVA dos alimentos, a descida do IVA da energia e propusemos sobretudo a baixa do IRS. A descida isolada do IVA de 44 ou 46 categorias de produtos alimentares não era a visão que tínhamos. Aliás, nos próximos dias [1 de maio] entra em vigor aquilo que é a agenda do trabalho digno, a Iniciativa Liberal via essas propostas fiscais que acumulavam o IVA da energia, o IVA dos alimentos, o IRS, nomeadamente para os referidos cinco escalões, uma espécie de agenda da fiscalidade digna. Obviamente, o trabalho tem que ser digno, tem que ter regras claras, tem que haver responsabilidade social, mas não podemos ter uma sucessiva e sistemática exigência sobre as empresas, quando, depois, não temos de facto aquilo que considero ser uma agenda da fiscalidade, nomeadamente sobre os rendimentos do trabalho.

O Governo anunciou também aumentos intercalares de pensões. A Iniciativa Liberal também considera necessário o aumento de pensões nos termos anunciados pelo Governo?

É muito estranho… Todos nos recordamos de que, na altura, em setembro ou outubro, o aumento feito de acordo com a fórmula legal, naquela altura, poria em causa 13 anos de estabilidade da Segurança Social, poria em causa o sistema no seu conjunto. Nesse momento, foi tomada aquela decisão [aumento das pensões em duas tranches, em 2022 e 2023] porque era necessário preservar o sistema. Qualquer um de nós percebe que, quando estamos a fazer projeções até 2060, é impossível que em seis ou oito meses tenha havido uma mudança desta natureza. Ou estava errado naquela altura, ou está errado agora. É muito difícil fazer política quando temos sistematicamente os responsáveis políticos que têm os dados mais robustos revelam uma divergência tão grande em seis meses. Como é que se pode fazer política se não há dados credíveis para os pensionistas?

Mas os pensionistas precisam de resposta agora? Isto é, face à inflação que temos…

Face aos dados possíveis, e com esta reserva, teria sido prudente fazer uma atualização em função da inflação…

Todos nos recordamos de que, na altura, em setembro ou outubro, o aumento feito de acordo com a fórmula legal, naquela altura, poria em causa 13 anos de estabilidade da Segurança Social, poria em causa o sistema no seu conjunto. Nesse momento, foi tomada aquela decisão [aumento das pensões em duas tranches, em 2022 e 2023] porque era necessário preservar o sistema. Qualquer um de nós percebe que, quando estamos a fazer projeções até 2060, é impossível que em seis ou oito meses tenha havido uma mudança desta natureza.

Rui Rocha

Cumprindo a lei de atualização das pensões que está em vigor?

Cumprindo… Admitindo que aquilo que dizem agora é minimamente adequado, não se percebe porque é que não se cumpriu a lei de aumento das pensões na altura, não se percebe porque é que são precisas medidas extraordinárias. Parece ser a gestão da agenda política e mediática do primeiro-ministro, de acordo com os altos e baixos das sondagens.

Nos próximos dias, próximos semanas, vai ser discutido o plano da habitação no Parlamento. A Iniciativa Liberal aponta a urgência de aumentar a oferta de imóveis, mas sabe-se que oferta não reage no imediato. Como é que é possível responder às necessidades de habitação dos portugueses mos próximos dois ou três anos?

É desde logo uma questão que seguinte: Este pacote “Mais habitação” que, tudo indica, entrará em vigor por haver maioria absoluta, não vai resolver o problema nos próximos 24 meses ou 36 meses.

Há apoios que já estão em vigor, subsídios para os juros da habitação…

…estamos sempre na dimensão dos apoios, estamos sempre na dimensão do Estado, a colocar as pessoas dependentes e agradecidas por devolverem, por via de subsidiação e por via do apoio, aquilo que de facto devia estar no bolso das pessoas. Depois, creio que se tem falado pouco disso…

…da travagem administrativa ao aumento das rendas?

Exatamente. Esta é uma má forma de fazer as coisas. Já tivemos dados de Espanha que saíram há cerca de uma semana, e o que é que acontece? Os preços a aumentarem, e menos oferta no mercado. Não há maneira de fugir disto. Por muito que seja uma medida política que agrada ao Governo do ponto de vista da sua propaganda, a consequência é sempre a mesma.

O que é que pode ajudar a resolver, mais no curto prazo?

Sendo certo que, concordo, não se começa a construir hoje e está disponível amanhã. Onde é que a Iniciativa Liberal está a preparar medidas, para apresentar nos próximos meses, porque é de facto algo que tem de ser bem pensado, bem bem trabalhado, é intervir no mercado de arrendamento. O mercado de arrendamento é demasiado rígido, o mercado de arrendamento tem agora uma probabilidade de rigidez ainda maior com a questão do congelamento das rendas, e esse é o elefante no meio da sala. Temos que gerar confiança…

É qual é o caminho?

Claramente, de flexibilidade. Tem de ser revisto tudo que seja congelamento de rendas, etc, tendo preocupação social, sim. Depois, temos de ver como avançam as questões dos litígios, que estão neste pacote do Governo e parecem-me boas, e, depois, também a questão da fiscalidade. Ou seja, um sinal positivo no arrendamento.

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