“Se Lula tivesse vindo noutra data, estaríamos no plenário”

O presidente da Iniciativa Liberal, Rui Rocha, garante em entrevista ao ECO que os deputados estariam na sessão solene de Lula da Silva se a data fosse outra. E rejeita semelhanças com os extremos.

O presidente da Iniciativa Liberal, Rui Rocha, garante em entrevista ao ECO que os deputados da Iniciativa Liberal não teriam saído do Plenário da Assembleia da República se o presidente do Brasil, Lula da Silva, tivesse sido recebido noutra data que não o 25 de abril. “Creio que é necessário distinguir, de facto, aquilo que é a relação diplomática e económica daquilo que são as posições políticas do seu presidente”, afirma.

Rui Rocha rejeita qualquer tipo de semelhança entre a estratégia da Iniciativa Liberal e do Chega. “Se há pessoa que merece o crédito de ser muito clara relativamente ao Chega sou eu”, recorda. E também não se revê nas críticas de um grupo de militantes do partido que anunciaram a sua desfiliação porque consideram que os liberais transformaram-se no “Bloco de Esquerda da Direita”. “Há um conjunto de questões que fazem parte daquilo que é o património político da Iniciativa Liberal, sempre assumido e que agora é apresentado como um motivo para uma divergência. Eu não posso realmente fazer nada, se as pessoas queriam que a Iniciativa Liberal mudasse para outro tipo de abordagem“.

A Iniciativa Liberal abandonou o hemiciclo na sessão solene a Lula da Silva, É uma atitude à altura das responsabilidades de um partido que quer ser Governo?

A Iniciativa Liberal não abandonou, a bancada ficou representada pelo líder parlamentar Rodrigo Saraiva, e ficou representada por dois motivos. Por respeito ao povo brasileiro, portanto, um sinal institucional, e também para, com algum simbolismo, manifestar solidariedade com o povo ucraniano. Dito isso, enquanto estivemos presentes, estivemos presentes institucionalmente…

Mas os mandatos dos deputados são individuais, Quem votou no distrito que elegeu Rodrigo Saraiva [líder parlamentar] não votou no distrito de Braga, que o elegeu. Portanto, os eleitores que votaram na Iniciativa Liberal fora do distrito de Lisboa não estiveram representados naquela sessão solene.

A interpretação que fizemos é que o Rodrigo Saraiva, como líder parlamentar, faria essa representação institucional. A não presença dos outros deputados tem a ver com o entendimento de que o 25 de Abril foi instrumentalizado. Estamos a falar de alguém, Lula da Silva, cuja legitimidade democrática não se questiona, mas que tinha feito um conjunto de declarações que já não eram de agora, já vinham de antes, mas que agora foram repetidas no périplo que fez e que manifestam um total alinhamento com os interesses de Putin.

Se o presidente Lula da Silva estivesse em Portugal numa data diferente, a Iniciativa liberal estaria presente na sessão solene?

Sim, sim, seguramente. É mesmo uma questão de data. Aquilo que entendemos é que a data em si é a data da liberdade em Portugal e, portanto, a presença de Lula com o discurso alinhado com os interesses de Moscovo era mais grave acontecendo naquele dia, correspondendo até a uma instrumentalização da data que, eu acho, não foi inocente. Respondendo claramente à pergunta, se tivesse sido noutra data, a iniciativa Liberal teria estado representada por todos os seus deputados.

É mesmo uma questão de data. Aquilo que entendemos é que a data em si é a data da liberdade em Portugal e, portanto, a presença de Lula com o discurso alinhado com os interesses de Moscovo era mais grave acontecendo naquele dia, correspondendo até a uma instrumentalização da data que, eu acho, não foi inocente. Respondendo claramente à pergunta, se tivesse sido noutra data, a iniciativa Liberal teria estado representada por todos os seus deputados.

Rui Rocha

Como deve ser a relação de Portugal com o Brasil?

Tem que ser uma relação profícua para os dois lados. Creio que é necessário distinguir, de facto, aquilo que é a relação diplomática e económica daquilo que são as posições políticas do seu presidente. E é verdade que temos uma grande comunidade de brasileiros em Portugal, crescente…

…e necessária.

Também é absolutamente necessária, e tem contribuído para o desenvolvimento económico também do país. Eu fui eleito por Braga, e este concelho recebeu dezenas de milhares de cidadãos brasileiros nos últimos anos, com um contributo, obviamente, para o desenvolvimento económico da região, para uma vitalidade que não estava presente até 2013, 2014, portanto, é uma comunidade muito bem vinda. Temos também uma comunidade portuguesa relevante no Brasil e, portanto, temos toda a abertura para que seja estabelecida. Relações económicas.

Portanto, não fazem depender a relação política e diplomática do Estado português com o Brasil da presidência de Lula da Silva, especialmente por causa dos processos judiciais do caso Lava-Jato?

Não, de todo. Não vou pronunciar-me sobre questões judiciais do Brasil, bem nos bastam as nossas, não precisamos de procurar outras paragens para termos comentários sobre questões judiciais. Lula da Silva foi eleito de forma democrática e legítima, portanto, há toda a legitimidade de Lula da Silva, por isso mesmo é que, se não fosse no 25 de abril também nós estaríamos presentes com a representação normal.

João Cotrim Figueiredo anunciou a sua saída da liderança da Iniciativa Liberal e um dos argumentos usados foi a necessidade de haver um ação política mais abrangente e mais popular. A reação à visita de Lula da Silva e, depois, o confronto com Augusto Santos Silva na sequência de um vídeo divulgado pela própria ARTV, colaram a Iniciativa Liberal ao Chega, É esse o tipo de posicionamento que a Iniciativa Liberal que ter, ao lado do Chega de André Ventura?

Se há pessoa que merece o crédito de ser muito clara relativamente ao Chega sou eu, fiz questão de deixar isso muito claro já na campanha interna e tenho afirmado claramente ao longo do tempo, portanto, não se trata disso. Aquilo que eu digo é o seguinte: Entre o populismo estridente e quem aproveita esse populismo estridente para ter benefício próprio…

…está a referir-se ao PS e a Augusto Santos Silva?

O PS, o Governo e, depois, individualmente, Augusto Santos Silva. Entre uns e outros há um caminho e é um caminho melhor para os portugueses. A questão dos diagnósticos é muito simples, todos percebemos que as coisas não estão bem, a questão está nas soluções. Quem é capaz de apresentar soluções, quem é capaz, sobretudo, de apresentar soluções que não passam por pôr portugueses contra portugueses, que não passam pelo ressabiamento, que não passam pelas soluções simples para problemas complexos. E isso é a marca do populismo.

Quando o Rui Rocha dramatizou o confronto com Augusto Santos Silva por causa daqueles comentários, não está a seguir um modelo de intervenção que cria a perceção de que a Iniciativa Liberal precisa de falar tão alto como o Chega para ser ouvido.

Não, não creio que seja isso. A Iniciativa Liberal fará sempre uma avaliação dos momentos, e há momentos em que tem que falar alto, e falará. Noutros momentos, o nível de decibéis será menor e será mais focado em soluções. A Iniciativa Liberal fará sempre essa avaliação e esse equilíbrio.

Há o risco de colagem ao Chega na avaliação do eleitorado da Iniciativa Liberal, mas também do aproveitamento dos adversários que querem passar o discurso de que não há diferenças entre os dois partidos.

Esses adversários têm uma atuação muito clara. Há os populista e, depois, o debate político está sempre a fazer-se entre a equiparação, ou não, e esses populistas. É uma tática conhecida, o PS, o Governo de António Costa e Augusto Santos Silva estão a explorá-la de forma, eu diria até, inaceitável, mas nós não deixaremos que isso nos condiciona. Volto a insistir, não há ninguém que tenha sido tão claro no sistema político português e acho até que haveria benefício em que outros pudessem ter essa clareza. Com quem nos entendemos e com quem não nos entendemos, isso está absolutamente claro.

Esses adversários têm uma atuação muito clara. Há os populista e, depois, o debate político está sempre a fazer-se entre a equiparação, ou não, e esses populistas. É uma tática conhecida, o PS, o Governo de António Costa e Augusto Santos Silva estão a explorá-la de forma, eu diria até, inaceitável, mas nós não deixaremos que isso nos condiciona.

Rui Rocha

A Iniciativa Liberal promoveu neste último ano uma moção de censura ao Governo, por outro lado, já pediu a demissão de vários ministros ao fim de um ano e três meses de eleições. É assim tão diferente da estratégia do Chega, partido para o qual tudo é uma vergonha?

É muito diferente. Eu percebo que, do ponto de vista do diagnóstico, pode ser semelhante a muitos partidos, não apenas à Iniciativa Liberal ou aos populistas. Depois, a divergência está em absoluto nas soluções.

Recentemente, saiu um grupo de militantes do partido, acusando a Iniciativa Liberal de ser o “Bloco de Esquerda da direita”?

Não é de todo, não é de todo. Eu percebo a necessidade de catalogar, passamos da colagem à extrema direita…

…Foram militantes da Iniciativa Liberal que acabaram de se desfiliar e que denunciam esse posicionamento político.

Eu percebo isso tudo, mas como passámos de uma colagem da extrema-esquerda à extrema-direita em pouco tempo. Todos nós, seres humanos, procuramos encontrar categorias para classificar as pessoas, as propostas, porque nos é mais fácil. Mas essa é a originalidade da Iniciativa Liberal. É que temos um programa tão próprio, tão assumido, tão ideologicamente assumido que, depois, deixamos as pessoas um bocado baralhadas. Às vezes eu percebo isso, mas não nos conseguem rotular. A Iniciativa Liberal é um partido com uma visão muito clara e, portanto, quem nos coloca sistematicamente de um lado ou do outro ainda não percebeu que o nosso caminho não é comparável com o caminho de mais ninguém.

O Rui Rocha é presidente do partido há cerca de três meses e a Iniciativa Liberal tem a primeira crise interna, com a saída de militantes que defendiam um partido liberal, mas mais conservador nos costumes. O que é que isto demonstra da sua liderança?

Eu admito que haja pessoas que saem dos partidos todos os dias…

Estes militantes saíram em grupo e quiseram marcar uma posição a afirmar que a Iniciativa Liberal é o “Bloco de Esquerda da Direita”…

…mas, quer dizer, tivemos uma convenção disputada, apresentei uma moção de estratégia muito clara relativamente a muitas destas coisas. Aliás, alguns dos motivos que são apresentados para estas saídas nem sequer são privativos da minha posição estratégica, são pontos que a Iniciativa Liberal já tinha defendido nos seus programas iniciais.

As causas de género, por exemplo.

Há um conjunto de questões que fazem parte daquilo que é o património político da Iniciativa Liberal, sempre assumido e que agora é apresentado como um motivo para uma divergência. Eu não posso realmente fazer nada, se as pessoas queriam que a Iniciativa Liberal mudasse para outro tipo de abordagem e se, sistematicamente, os membros da Iniciativa Liberal, nos atos democráticos de eleição, nas suas funções estratégicas e das suas comissões executivas e dos seus órgãos dirigentes, apontam o caminho que estamos a seguir, é nesse caminho que vamos continuar.

Em todo o caso, quero dizer que da mesma maneira que saíram pessoas, tivemos muitas entradas desde as eleições e, portanto, entraram muitas mais dezenas de pessoas, mais por cada uma das que saiu.

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