“Se o BCE falhar no controlo da inflação, não será só Portugal a ter problemas”, prevê Ricardo Reis

Ricardo Reis acredita que a forte determinação do BCE em controlar a inflação na Zona Euro deverá levar a aumentos de 50 a 75 pontos base das taxas de referência do BCE nas próximas reuniões.

O Fórum do Banco Central Europeu (BCE) que decorreu nos últimos dois dias em Sintra mostrou a forte convicção dos governadores dos principais bancos centrais do mundo em controlarem a inflação nas suas economias a qualquer custo.

Para Ricardo Reis, professor da London School of Economics e vencedor do prémio Yrjo Jahnsson em 2021, esta foi uma “mensagem acertada” e essencial para retirar muita da incerteza que existia no mercado, particularmente por parte dos mercados financeiros, que achavam que “as taxas de juros fossem baixar em breve ou não fossem subir muito mais.”

À margem do Fórum do BCE, Ricardo Reis revelou ao ECO que antevê mais duas ou três subidas das taxas de referência do BCE, num agregado de 50 a 75 pontos base e, posteriormente, a manutenção das taxas de juro neste nível por um período de cerca de um ano e meio.

Para o economista, o controlo dos preços é condição imperativa para uma boa gestão das finanças públicas e a promoção do crescimento económico. Por essa razão, Ricardo Reis considera acertada a política de “whatever it takes” do banco central em puxar a inflação para a meta de 2%, dado que caso isso não seja conseguido, as consequências podem ser muito graves para Portugal mas também para a economia da moeda única.

Mesmo com um aumento da taxa de desemprego nos próximos meses ou no próximo ano, embora esse não seja essa a previsão corrente, a determinação em trazer para baixo a inflação é a grande prioridade dos bancos centrais.

Quais são as grandes mensagens que retira do Fórum do BCE?

De uma forma uniforme, quer BCE quer a Reserva Federal, e até mesmo o Banco de Inglaterra, estão completamente comprometidos em trazer a inflação para baixo. Não há o mínimo de hesitação nem a consideração sobre outras coisas que não seja trazer a inflação para baixo no foco dos bancos centrais.

Essa mensagem conjunta dos líderes dos mais importantes bancos centrais do mundo ajudou a retirar alguma da incerteza do mercado?

Sim. Se havia alguma incerteza, alguma consideração por parte dos mercados financeiros de que talvez as taxas de juros fossem baixar em breve ou não fossem subir muito mais, por preocupações financeiras, taxa de desemprego ou quaisquer outras, foram muito claramente postas de lado. O foco absoluto dos bancos centrais é trazer a inflação para baixo.

Significa que, no espaço do euro, é expectável haver novos aumentos das taxas de referência do BCE nas próximas duas reuniões?

No que diz respeito às taxas de juro do BCE, Lagarde foi muito clara de que as taxas de juro vão subir mais e ficar altas durante mais tempo do que muitos, sobretudo os mercados financeiros, antecipavam antes desta reunião.

Estamos perante uma posição de “whatever it takes” por parte do BCE para baixar a inflação na Zona Euro?

Estamos claramente perante um “whatever it takes” no sentido de que os bancos centrais relembraram a todos repetidamente, em todos os painéis e discursos que fizeram durante estes dias, que o seu mandato é claríssimo: o seu mandato é trazer inflação para 2%. Isso é o mais importante e é nisso que estão completamente focados.

Mas as previsões sobre quando essa meta será atingida divergem um pouco.

Embora isso aconteça, tanto o BCE como a Reserva Federal dos EUA apontam para 2025 como sendo o ano em que chegarão a uma inflação de 2%. No entanto, a presidente Lagarde, por várias vezes, repetiu que até gostaria que fosse mais cedo.

Acredita que mesmo num cenário de recessão na Zona Euro, essa determinação de continuar a subir as taxas de juro por parte do BCE para baixar a inflação irá manter-se?

Essa foi precisamente a mensagem do BCE e dos outros bancos centrais. Mesmo com um aumento da taxa de desemprego nos próximos meses ou no próximo ano, embora esse não seja essa a previsão corrente, a determinação em trazer para baixo a inflação é a grande prioridade dos bancos centrais.

A grande prioridade é apoiar o BCE ou, mais do que apoiar, exigir que o BCE faça o seu trabalho e estabilize a inflação.

A mensagem de Lagarde e de outros membros do BCE vai no sentido de promover novas subidas das taxa de referência. Qual é a sua previsão para a taxa de juro?

Neste momento é claro que o Banco Central Europeu está a olhar para os dados com muita atenção e não há decisões fixas. No entanto, tendo em conta a minha informação dos dados, parece-me que, estando a taxa de depósitos nos 3,75%, as taxas vão subir, pelo menos, mais 50 pontos base, talvez 75, ou seja, mais duas ou três subidas nos próximos meses. E depois entraremos numa fase seguinte, de quanto tempo as taxas se manterão nestes níveis altos.

A política monetária do BCE fortemente assente na subida das taxas de juro não poderá criar grandes dificuldades no plano da gestão da dívida pública?

O mais importante de tudo é, sem dúvida, controlar a inflação, voltarmos aos 2% no final de 2024 ou início de 2025, estabilizar o nível dos preços porque a inflação volátil traz grandes prémios de risco na dívida pública e provoca taxas de juro da dívida pública persistentemente altas. A grande prioridade é apoiar o BCE ou, mais do que apoiar, exigir que o BCE faça o seu trabalho e estabilize a inflação.

Mas atendendo ao previsível caminho das taxas de juro nos próximos tempos, as novas emissões de dívida contarão com preços mais elevados.

Sim, mas no caso de Portugal, a política de extensão das maturidades que foi aplicada mesmo antes da Covid deu-nos uma grande almofada de segurança para podermos navegar este período temporário, de cerca de um ano e meio, de taxas de juro altas sem comprometer as finanças públicas. Mas, se o BCE falhar no controlo da inflação e as taxas ficarem altas mais do que um ano e meio, não será só Portugal a ter problemas, mas também muitos outros países.

E o processo de desalavancagem do balanço do BCE, que arranca a 1 de julho, como acha que será feita?

Como a presidente Lagarde falou no último painel do Fórum, neste momento, o balanço não é uma política ativa do Banco Central Europeu. O instrumento principal é a taxa de juro. O balanço está a contrair de uma forma automática, simplesmente tendo em conta as políticas adotadas de não reinvestimento das obrigações que expiram e os reembolsos de TLTRO normais e antecipados. E Lagarde disse também que não espera que isso mude no próximo ano.

Não vamos assistir a uma onda vendedora de ativos por parte do BCE?

Nada disso. Lagarde excluiu claramente isso. Nem em termos de encolher, nem em termos de aumentar o balanço. Ficou claro que o balanço não é uma política ativa do BCE.

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