Da diversificação de mercados à limitação de acesso de bancos americanos: como os partidos querem responder às tarifas de Trump

Partidos são unânimes nas críticas à política comercial de Trump. Porém, as soluções para a resposta variam. Pacote de apoio do Governo às empresas criticado por parte das forças políticas.

  • O ECO vai divulgar cinco séries semanais de trabalhos sobre temas cruciais para o país, no período que antecede as eleições legislativas de 18 de maio. Os rendimentos das famílias, a execução dos fundos europeus, o crescimento da economia nacional, a crise da habitação e o investimento na Defesa vão estar em foco. O ECO vai fazer o ponto da situação destes temas, sintetizar as propostas dos principais partidos e ouvir a avaliação dos especialistas.

A política comercial da Administração Trump está a provocar uma disrupção no comércio mundial. Perante o anúncio do presidente norte-americano de impor tarifas de 20% às importações da União Europeia (atualmente suspensas), o Governo liderado por Luís Montenegro avançou com um pacote de apoio às empresas portuguesas, criticado por parte dos partidos que concorrem às legislativas de 18 de maio.

O ECO questionou os partidos com assento parlamentar sobre que medidas propõem para apoiar a economia portuguesa e os empresários face às tarifas dos EUA. À exceção do Chega que não respondeu, os partidos são unânimes nas críticas à política comercial de Donald Trump. Porém, as soluções para a resposta variam.

A AD – Coligação PSD/CDS-PP salienta ao ECO que a história ensina que “o protecionismo gera inflação, ineficiência económica, menos inovação e mais retaliações comerciais“, garantindo, tal como tem sido sinalizado pelo primeiro-ministro, que “Portugal continuará a trabalhar a nível europeu, nomeadamente com a Comissão Europeia, para que seja dada uma resposta robusta e proporcional na defesa dos Estados-membros”.

Este não é o momento para reações irrefletidas“, assinala a coligação liderada por Luís Montenegro, defendendo que se combate “a incerteza com responsabilidade e preparação e não com aventuras ou receitas ilusórias”.

O PSD e CDS assinalam assim que em resposta aos desafios colocados pelo contexto internacional, o Governo, “no seguimento de intensos contactos com associações empresariais e económicas”, avançou o “Programa Reforçar“, com um volume superior a dez mil milhões de euros e que contempla instrumentos financeiros dirigidos a empresas com atividade exportadora e internacionalizada, com especial atenção à diversificação de mercados.

Entre as medidas incluem-se o reforço das linhas de financiamento do Banco Português de Fomento (BPF), com um total de 5.185 milhões de euros destinados a fundo de maneio e investimento empresarial e uma nova linha de financiamento no valor de 3.500 milhões de euros, incluindo 400 milhões em subvenções, orientada para o investimento de empresas exportadoras.

“Este não é o momento para reações irrefletidas”, assinala a AD, defendendo que se combate “a incerteza com responsabilidade e preparação e não com aventuras ou receitas ilusórias”.

O reforço dos plafonds de seguros de crédito à exportação, no valor de 1.200 milhões de euros, para apoiar a diversificação de mercados, através da Agência de Crédito à Exportação do BPF, e um novo programa de incentivos no âmbito do Portugal 2030, no valor de 200 milhões de euros, para apoio à internacionalização e exportação, são outras das medidas.

Um conjunto de medidas sobre o qual os socialistas consideram que deveriam ter sido ouvidos. “Temos alertado para a passividade do Governo e a ausência de articulação com o maior partido da oposição num momento sensível para a economia”, refere o partido liderado por Pedro Nuno Santos ao ECO.

Sem entrar em detalhes, o PS “defende uma resposta firme e coordenada na UE às tarifas impostas pelos EUA, com apoio direto aos setores mais afetados, promoção das exportações e reforço da diplomacia económica“. “É urgente proteger a produção nacional e reforçar a autonomia estratégica da Europa, com incentivos à diversificação de mercados e à internacionalização”, aponta.

O PS defende uma resposta firme e coordenada na UE às tarifas impostas pelos EUA, com apoio direto aos setores mais afetados, promoção das exportações e reforço da diplomacia económica.

Partido Socialista

A necessidade de diversificação de mercados é sinalizada por outros partidos, como a Iniciativa Liberal (IL). “Portugal deve trabalhar para acelerar acordos comerciais com outros países e regiões. Quanto mais mercados tivermos, menos dependemos de um só país e mais protegidas ficam as nossas empresas”, refere ao ECO.

Como o ECO noticiou, os 20 países para os quais Portugal mais exportou em 2024 representaram 85% do valor total de vendas de bens ao exterior. Dez anos antes, o peso não chegava aos 80%. Uma tendência que também se verificou no peso dos cinco primeiros destinos. De 58% em 2014, aumentou para 61,7% em 2024.

Nota: Se está a aceder através das apps, carregue aqui para abrir o gráfico. O INE desagrega desde 2020, os valores exportados para o Reino Unido não incluindo a Irlanda do Norte e a Irlanda do Norte. Para permitir as comparações diretas com valores do período anterior, o ECO optou por somar ambos.

O partido encabeçado por Rui Rocha sublinha que “as tarifas impostas pelos EUA são um retrocesso nas relações comerciais internacionais e penalizam injustamente empresas exportadoras”, considerando que “o Governo parece mais preocupado em dar uma imagem de ação do que em resolver o problema“. Neste sentido, defende que “o que Portugal precisa é de medidas que reforcem a nossa economia, tornem as empresas mais competitivas e reduzam a dependência de apoios públicos”.

As tarifas impostas por Donald Trump estão atualmente suspensas enquanto decorrem negociações. Como contrapartida, a União Europeia também decidiu pôr em pausa as medidas de retaliação, até ao dia 14 de julho, de modo a permitir que o processo negocial decorra.

Para a IL, “é urgente reduzir a carga fiscal e a burocracia que continuam a ser um peso enorme para quem quer investir, contratar ou crescer“, pelo que, “em vez de distribuir apoios, o Estado deve criar condições para que o investimento privado em tecnologia, exportação e inovação floresça”. “Portugal deve assumir um papel ativo na União Europeia, liderando uma resposta conjunta, equilibrada e firme, mas mantendo sempre o diálogo aberto com os EUA”, advoga.

“Tarifas impostas pelos EUA são um retrocesso nas relações comerciais internacionais e penalizam injustamente empresas exportadoras”, considera IL, que “o Governo parece mais preocupado em dar uma imagem de ação do que em resolver o problema”.

É certo que a IL e o Bloco de Esquerda (BE) se situam em polos opostos na política e na estratégia de resposta à questão das tarifas a fotografia não é diferente. “Em primeiro lugar, o Governo já devia ter anunciado que irá defender medidas de resposta contra quaisquer tarifas impostas pelos Estados Unidos em setores de atividade da economia portuguesa que dependem das exportações. Essas medidas devem proteger esses setores, mas também atingir por exemplo os oligarcas tecnológicos dos Estados Unidos”, considera o partido coordenado por Mariana Mortágua.

Para o BE, “as indústrias portuguesas que dependem das exportações terão naturalmente de ser apoiadas no cenário de uma transição abrupta, e essa transição deve incluir políticas ativas de diversificação dos nossos parceiros comerciais“.

A diversificação é, aliás, também uma recomendação de instituições como o Banco de Portugal. A instituição liderada por Mário Centeno estima que o impacto global da guerra de tarifas, e consequente aumento da incerteza, poderá levar a uma redução cumulativa do PIB português de cerca de 1,1% no final de três anos, com os efeitos concentrados nos dois primeiros anos. Neste cenário adverso, nas contas do supervisor, a economia portuguesa cresce apenas 1,4% este ano, ao invés dos 2,3% estimados no cenário base.

No “Boletim Económico de dezembro“, ainda antes da escalada da tensão, a instituição já defendia ser “importante reforçar o apoio às empresas na procura de novos mercados, promover o investimento direto estrangeiro e continuar a flexibilizar a alocação de recursos na economia“.

Nota: Se está a aceder através das apps, carregue aqui para abrir o gráfico. O INE desagrega desde 2020, os valores exportados para o Reino Unido não incluindo a Irlanda do Norte e a Irlanda do Norte. Para permitir as comparações diretas com valores do período anterior, o ECO optou por somar ambos em 2024.

O BE considera “lamentável que sejam sequer contempladas medidas “apaziaguadoras” de Donald Trump como o aumento de compra de gás natural aos Estados Unidos”, argumentando que “o efeito de tais decisões seria simultaneamente o de recompensar a chantagem e agravar a dependência”. “A transição deve também incluir o desenvolvimento de indústrias fundamentais, processo que já deveria ter sido lançado a partir das lições da pandemia”, aponta.

As indústrias portuguesas que dependem das exportações terão naturalmente de ser apoiadas no cenário de uma transição abrupta, e essa transição deve incluir políticas ativas de diversificação dos nossos parceiros comerciais.

Bloco de Esquerda

O desenvolvimento da produção nacional é também advogado pelo PCP, que defende a “melhoria do perfil tecnológico e da produtividade, com adequadas políticas de apoio às PME, com o crescimento da componente nacional das exportações, com a diversificação dos mercados externos e reforço do mercado interno numa base consistente de maiores salários e pensões e rendimentos das pequenas empresas”.

“As medidas avançadas pelo Governo PSD/CDS são um balão cheio de propaganda eleitoral e vazio de conteúdo, uma invenção fraudulenta de 10 mil milhões”, aponta. Os comunistas advogam que “as tarifas dos EUA são uma operação de intimidação e chantagem do imperialismo norte-americano, procurando criar condições favoráveis em negociações país a país para procurar responder a graves problemas da economia americana”.

“No imediato, o Governo deve acompanhar o ‘carrossel’ de decisões, e desenvolver linhas de resposta perante os setores mais expostos em função dos impactos que possam vir a verificar-se”, consideram.

Governo deve acompanhar o “carrossel” de decisões, e desenvolver linhas de resposta perante os setores mais expostos em função dos impactos que possam vir a verificar-se.

PCP

Por sua vez, o Livre defende como “fundamental que a resposta de Portugal esteja integrada numa estratégia coordenada entre Estados-Membros da União Europeia, e da União Europeia com os principais parceiros globais, em particular o Canada, Reino Unido, Japão e México”. “Isso passaria pela criação de uma zona de comércio livre que exclua os EUA, impondo de igual forma tarifas a todas as importações aos EUA”, propõe.

O partido liderado por Rui Tavares elenca entre as medidas concretas de resposta às tarifas americanas “limitar o acesso dos bancos dos EUA aos mercados de capitais da UE e restantes países referidos”, bem como “estabelecer limites ao que os cidadãos desse grupo de países podem investir em empresas americanas anualmente e aumentar os impostos e reforçar a regulação que incide sobre plataformas digitais Americanas”.

“Não é o cenário mais desejável, seria preferível que os EUA recuassem nas suas tarifas, mas pode ser o cenário necessário. Caso não recuem, o essencial será manter unida uma frente de resposta conjunta, sendo para isso fundamental que Portugal resista ao impulso de negociar individualmente com os EUA e procure criar as pontes para uma colaboração tão alargada quanto possível”, argumenta.

Do lado da resposta direta às empresas, considera que “faria sentido que esse fosse um dos braços da estratégia coordenada ao nível da União Europeia“, uma vez que o desafio não é exclusivo das empresas portuguesas.

Livre propõe “limitar o acesso dos bancos dos EUA aos mercados de capitais da UE e restantes países referidos”, bem como “estabelecer limites ao que os cidadãos desse grupo de países podem investir em empresas americanas anualmente”.

Para o PAN, o pacote anunciado pelo Governo é, em grande medida, “a recauchutagem do programa acelerar a economia, que o Governo apresentou no ano passado, pelo que não há grande novidade nisso”. Ainda assim, considera importante que este tenha incluído as linhas de apoio às despesas de tesouraria ou de reforço de formação profissional em setores afetados.

O partido da deputada única Inês Sousa Real “condena claramente” o que apelida de “apoio acrítico dado pelo primeiro-ministro ao acordo UE-Mercosul, que considera ser “um verdadeiro atentado ambiental”.

“Neste pacote de medidas teria sido importante que o Governo tivesse apostado, de forma clara, na transição para uma economia verde por forma a dar vantagem competitiva a Portugal, algo que se conseguiria por exemplo com o pagamento dos apoios previstos no PRR para a descarbonização da indústria – verba só foi executada em 41,83% até agora e há 429 milhões de euros em apoios que estão por executar”, propõe.

Simulações da Comissão Europeia sobre o impacto dos direitos aduaneiros nos Estados Unidos, aponta para um impacto económico de até 0,6% no Produto Interno Bruto (PIB) da União Europeia. No contexto europeu, Portugal é, ainda assim, um dos Estados-membros com menor nível de exposição à economia norte-americana, com 2,5% do PIB direta e indiretamente exposto à procura final nos EUA, recordou o Conselho das Finanças Públicas (CFP). A instituição liderada por Nazaré da Costa Cabral estima que, em conjunto, o impacto direto, sem contar com efeitos de confiança, poderá alcançar os -0,5% do nível do PIB.

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