Em quase quatro horas de debate, o Governo joga trunfos e oposição aponta falhanços. Saúde, imigração, habitação, economia e defesa, conheça o estado do país em cinco áreas fundamentais.
Será uma espécie de antecâmara para as autárquicas, marcadas para 12 de outubro. O debate do Estado da Nação desta quinta-feira vai marcar o aquecimento para a pré-campanha com dois temas fundamentais na mira dos deputados: saúde e imigração, segundos os politólogos ouvidos pelo ECO.
Em quase quatro horas de oratória parlamentar, o elenco de Luís Montenegro vai jogar trunfos e conquistas da “maioria maior”, seja com a aprovação, ainda esta quarta-feira, da descida do IRS ou da lei dos estrangeiros, através de um acordo com o Chega. E a oposição vai disparar contra os falhanços do Executivo, designadamente na saúde ou na habitação. No que diz respeito ao SNS, o PS já desafiou o Governo a avançar com a criação de uma unidade de coordenação da emergência hospitalar e o Chega quer que Montenegro apresente, em seis meses, um plano para resolver os problemas do setor.
“Vai ser um debate baseado sobretudo na definição da agenda para os próximos meses, porque o Governo ainda não tem conseguido dar provas da ação desempenhada até agora e há muitas incertezas acerca do quadro económico”, segundo a análise de Marco Lisi, professor do departamento de estudos políticos da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH) da Universidade de Lisboa. “Por outro lado, o facto de haver um novo ciclo eleitoral (longo) faz com que este debate seja mais um evento eleitoral do que institucional. Ou seja, não serve tanto para a oposição responsabilizar o Governo, mas para dar sinais ao eleitorado e marcar as diferenças que separam os partidos”, acrescenta o politólogo.
Para Bruno Costa, professor de Ciência Política da Universidade da Beira Interior, “o facto de o país estar em pré-campanha para as autárquicas pode conduzir a um debate em que vários procurarão afirmar a sua posição e liderança na oposição ao Governo”. “Por sua vez, o Governo procurará evidenciar uma oposição à deriva ou sem força para implementar medidas, deixando espaço para o Governo implementar o seu programa”, salienta.
Governo e oposição vão esgrimir argumentos para ver quem fica melhor na fotografia e preparar caminho para as autárquicas de outubro e para o Orçamento do Estado para 2026.
Os temas dominantes serão “imigração, habitação e saúde”, na perspetiva de Hugo Ferrinho Lopes, investigador de doutoramento do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa. “Várias propostas do novo Governo focam-se nestes domínios, e a oposição já está a preparar críticas ou contrapropostas, seja porque é um tema saliente para alguns (Chega), seja porque o país se encontra em crise nesses setores (saúde e habitação)”, nota o politólogo.
Bruno Costa alinha pelo mesmo diapasão: “os temas mais quentes serão a imigração e saúde”. “Certamente a oposição irá aproveitar estes dois temas para demonstrar algumas das fragilidades do Governo bem como caracterizar o caminho ideológico do mesmo. Veremos considerações à esquerda sobre os entendimentos que o Governo tem alcançado com o Chega“, aponta o professor da Universidade da Beira Interior. Além disso, há ainda “a questão do reforço do Orçamento para o setor da defesa”, sublinha Bruno Costa. A este respeito, o líder do PS, José Luís Carneiro, já propôs ao Governo avançar com um “acordo estratégico” em três meses.
No debate antes de o Parlamento ir de férias, Governo e oposição vão esgrimir argumentos para ver quem fica melhor na fotografia e preparar caminho para as autárquicas de outubro e para o Orçamento do Estado para 2026, que começa a ser discutido logo após o ato eleitoral.
Saúde, imigração, habitação, economia e defesa — conheça o estado do país em cinco áreas fundamentais.

Saúde: crise no SNS e buraco nas contas
Grávidas a perder bebés às portas dos hospitais, comissão de inquérito ao INEM, falhas na emergência hospitalar, demasiado tempo de espera para cirurgias e buraco nas contas do SNS. A lista não podia ser mais negra para o Governo, sobretudo para a ministra Ana Paula Martins, que Luís Montenegro ainda tem segurado na cadeira do poder.
Depois da aprovação da comissão parlamentar de inquérito ao INEM, proposta pela Iniciativa Liberal, o Chega desafiou o Executivo a apresentar um plano para resolver os problemas do setor em seis meses e o PS propôs a criação de uma unidade de coordenação de emergência hospitalar. Tudo em vésperas do debate do estado da nação.
A comissão de inquérito vai “apurar as responsabilidades políticas, técnicas, contratuais, legais e financeiras, relativas à atual situação” do instituto de emergência médica e “avaliar a relação das diferentes tutelas políticas com o INEM”, segundo o diploma da IL. Como pano de fundo, a polémica greve às horas extraordinárias dos Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar, que se iniciou a 30 de outubro de 2024 e se prolongou até 7 de novembro, coincidindo com outras greves na Administração Pública.
Do lado do Chega, André Ventura já pediu ao primeiro-ministro para levar o tema da saúde ao debate do estado da nação. O líder partidário diz que vai apresentar um plano de seis meses para resolver os problemas no setor.
Um dia depois de Luís Montenegro ter reafirmado que a Saúde está melhor do que há um ano, Ventura acusou o chefe de Governo de olhar para esta área com “óculos cor-de-rosa”.
O secretário-geral do PS, José Luís Carneiro, também não quis ficar atrás e avançou com a proposta de criação de uma unidade de coordenação de emergência hospitalar, um dia antes do debate parlamentar. Numa fase experimental, este organismo irá custar 800 mil euros, e será constituído por elementos dos ministérios da Saúde, Administração Interna e da Defesa, da direção executiva do SNS e da Liga Portuguesa dos Bombeiros, anunciou o líder socialista.
O último relatório do Conselho das Finanças Públicas sobre a evolução do desempenho do Serviço Nacional de Saúde (SNS) em 2024 é bastante crítico. “Nos serviços de urgência e internamento, persistiram vários constrangimentos, em linha com o que se verificava em anos anteriores. Apesar da redução no número de episódios de urgência, os tempos de triagem foram cumpridos em apenas 56% dos casos, um valor inferior aos 60% registados em 2023, materializando-se uma tendência crescente de incapacidade de responder aos episódios nos prazos estipulados”, alerta a entidade, liderada por Nazaré Costa Cabral.
Entre 2015 e 2024, o saldo do SNS foi sistematicamente negativo, atingindo em 2024 o valor mais elevado, ultrapassando mesmo os níveis registados durante o período de pandemia.
Em relação às cirurgias, registou-se “uma ligeira deterioração dos tempos de resposta”. “Existiu um ligeiro aumento nas entradas em lista de Inscritos para cirurgia (LIC) (de 818 para 873 mil utentes), e no número de doentes inscritos nessa lista, (que passou de 262 para 266 mil utentes)”, dá conta o Conselho das Finanças Públicas. Ainda assim, “o total de operados no âmbito do SIGIC (Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia) aumentou, evidenciando um esforço de recuperação da atividade cirúrgica”.
No entanto, assinala o CFP, que “a percentagem de inscritos operados dentro do tempo máximo de resposta garantido (TMRG) registou uma ligeira quebra, o que confirma o desafio do SNS para garantir uma resposta cirúrgica atempada”.
As contas públicas do SNS também não estão de boa saúde. No ano passado, o setor registou um défice de cerca de 1.377 milhões de euros, representando uma deterioração de 741 milhões relativamente a 2023. “Entre 2015 e 2024, o saldo do SNS foi sistematicamente negativo, atingindo em 2024 o valor mais elevado, ultrapassando mesmo os níveis registados durante o período de pandemia, não obstante o orçamento aprovado prever um saldo nulo”, alerta o estudo sobre o desempenho do serviço público de saúde no último ano.
Segundo a entidade independente que fiscaliza o cumprimento das regras orçamentais e a sustentabilidade das finanças públicas, esta evolução desfavorável resultou de um aumento da despesa de cerca de 1.298 milhões de euros face a 2023, que superou significativamente o crescimento da receita de 557 milhões de euros.

O CFP adianta que a despesa do SNS totalizou 15.553 milhões de euros em 2024, um aumento de 9,1% face ao ano anterior, devido a despesas com pessoal, fornecimento de serviços externos e compras de inventários. A despesa do SNS corresponde já a 5,5% do produto interno bruto (PIB) e a 12,8% da despesa pública total do país.
O custo com pessoal totalizou 6.520 milhões de euros, um aumento de 12,1% (cerca de 704 milhões) relativamente a 2023, explicando mais de metade do crescimento da despesa do SNS. O número de trabalhadores das entidades que integram o SNS atingiu os 154.635, um acréscimo de 1.435 em relação a 2023, e o SNS representava mais de 20% do emprego total das administrações públicas no final de 2024.
O CFP avisa ainda que a despesa de capital representou apenas 2,4% da despesa total do SNS em 2024, o que reflete o “reduzido peso estrutural do investimento no setor da saúde, face à predominância de despesas correntes”. Nesse ano, o investimento no SNS registou um decréscimo de quatro milhões de euros, totalizando cerca de 375 milhões de euros, contrariando a tendência de crescimento registada nos dois anos anteriores.
Os dados do CFP indicam também que a dívida a fornecedores do SNS aumentou 237 milhões de euros em relação a 2023, situando-se nos 1,4 mil milhões de euros, um acréscimo que resulta de um aumento da dívida vincenda em 395 milhões de euros, que não foi totalmente compensada pela redução da dívida vencida em 158 milhões.
Imigração: das “portas escancaradas” ao controlo de fronteiras
A imigração é um dos temas que tem estado debaixo de fogo e foi eleita como uma das prioridades deste Governo, olhando para as propostas que rapidamente foram aprovadas em Conselho de Ministros e submetidas à Assembleia da República. Se a ideia era tirar palco ao Chega, o Governo acabou por receber a mão do partido de André Ventura que lhe ajudou a viabilizar quer a lei dos estrangeiros, que retira a nacionalidade a imigrantes condenados a cinco anos de prisão, quer a nova unidade de estrangeiros e fronteiras na PSP, com fortes críticas à esquerda, desde logo do PS.
O discurso do Governo tem sido pautado pela necessidade de regulamentação e fim das portas escancaradas, tendo em conta o número crescente de população estrangeira que tem entrado em Portugal. O dossiê já tinha estado na agenda do primeiro Governo de Luís Montenegro, quando, entre as primeiras medidas, avançou o fim da manifestação de interesse, obrigando à apresentação de uma promessa ou contrato de trabalho.
De facto, a quantidade de imigrantes a viver em Portugal aumentou significativamente. Os dados mais recentes da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) mostram que o número de cidadãos estrangeiros residentes em Portugal com processos de regularização em dia já passou a fasquia dos 1,5 milhões. No final do segundo semestre de 2024 eram 1.546.521. Estes dados são preliminares e, segundo a estrutura de missão, o número de cidadãos estrangeiros com autorização de residência em Portugal em 2023 foi, afinal, de 1.293.463 e não de 1.044.606, como inicialmente contabilizado.
Os dados de 2024 também deverão ser revistos em alta, segundo a AIMA, ou seja, prevê-se que a contabilização chegue afinal aos 1,6 milhões de imigrantes, refere a agência em comunicado. Se se confirmarem as previsões da estrutura de missão, a população estrangeira chegará, assim, a representar cerca de 15% dos 10,6 milhões de residentes registados em Portugal. É um aumento que quadruplica os valores de 2017.
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O aumento previsto deve-se aos cerca de mais 50 mil cidadãos estrangeiros, abrangidos pelo “regime transitório” criado pela Assembleia da República, que já estavam em Portugal antes de 3 de junho de 2024, e já apresentaram pedido de regularização da sua presença. Foi naquela data que o Governo acabou com o regime da “manifestação de interesse”.
Ainda de acordo com o relatório intercalar “Recuperação de Processos Pendentes na AIMA. População Estrangeira em Portugal” –, o fim do regime da manifestação de interesse fez descer o fluxo de regularização em 59%.
Aquele mecanismo foi apelidado por este Governo como “regime de portas escancaradas”. Criado em 2017, durante o Governo de António Costa, este regime haveria também de ser criticado pelo ex-líder do PS, Pedro Nuno Santos, por ter alegadamente produzido um “efeito chamada” de imigrantes. Com as alterações introduzidas em 2019, dispensava-se o visto de entrada legal como condição para a regularização da presença no território a quem estivesse a descontar há um ano para a Segurança Social.
Nas contas feitas agora pelo Governo para medir o efeito do fim da manifestação de interesse, “o fluxo de entrada de cidadãos estrangeiros que tinham em vista a obtenção de uma autorização de residência passou de 156.951 no primeiro semestre de 2024 para 64.848 no segundo semestre de 2024”.
O relatório da AIMA fez ainda uma “distribuição” das manifestações de interesse despachadas pela estrutura de missão — contabilizadas em 241.183 — pelo ano em que deram entrada. Esta entidade estava a regularizar cerca de 450 mil processos atrasados, que tinham entrado no sistema em diferentes anos. Por isso, os dados de todos os anos a partir de 2019 foram revistos em alta — o que significa que havia pessoas com processos pendentes há cinco anos.

Habitação: a crise que ameaça o futuro de uma geração
O primeiro trimestre de 2025 trouxe números que confirmam aquilo que milhões de portugueses já sabiam: a habitação transformou-se num luxo inacessível. Com +o preço mediano por metro quadrado das casas a disparar, em termos homólogos, 18,7% nos primeiros três meses do ano, a maior subida histórica desde 2019, e as rendas a atingirem valores recordes, Portugal enfrenta uma crise habitacional sem paralelo na sua história recente. Os dados não mentem: comprar ou arrendar casa deixou de ser um direito para se tornar um privilégio reservado a poucos.
A escalada dos preços da habitação assumiu proporções alarmantes. Entre 2020 e 2024, o preço médio das casas aumentou a um ritmo anual de 10%, enquanto o rendimento disponível dos portugueses cresceu apenas 8,13% no mesmo período. Esta divergência significa que os preços das casas aumentaram a uma velocidade 1,2 vezes superior ao crescimento dos rendimentos, criando um fosso cada vez maior entre aquilo que as famílias ganham e o que precisam de pagar pela habitação.
No mercado de arrendamento, a situação é igualmente preocupante, com a renda mediana dos novos contratos a atingir 8,43 euros por metro quadrado no último trimestre de 2024, representando um crescimento homólogo de 9,3%.
Esta situação leva a que os custos com habitação representem quase 40% da despesa média das famílias portuguesas, um valor que disparou 45% nos últimos sete anos, segundo dos dados do último Inquérito às Despesas das Famílias do Instituto Nacional de Estatística.
Esta pressão financeira é particularmente sentida pelos jovens, que se veem obrigados a adiar indefinidamente o sonho da independência habitacional, apesar de iniciativas como a garantia pública para o financiamento de 100% da primeira casa e da isenção do pagamento de IMT e IS na compra da primeira casa por jovens até aos 35 anos. Segundo dados do Eurostat, cerca de 45,9% dos jovens com idades entre os 18 e os 34 viviam no final de 2024 com os seus pais (face a uma taxa de 35% na Zona Euro), e entre os principais obstáculos à emancipação destacam-se os preços elevados das habitações e os rendimentos insuficientes para pagar uma casa.
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A insuficiência crónica da oferta face à procura constitui um dos fatores centrais desta crise. Nos últimos cinco anos, foram colocadas no mercado menos de 106 mil casas novas, um número inferior à média de 110 mil casas anuais registada entre 1999 e 2003. No ano passado foram licenciados apenas 34.476 fogos para habitação, menos de metade dos 77.115 fogos licenciados em 2003. Esta escassez de habitação nova, combinada com uma procura robusta que levou a 156.325 transações habitacionais em 2024 (mais 14,5% que em 2023), tem alimentado a espiral inflacionária dos preços.
A Comissão Europeia tem alertado para a ineficácia das medidas implementadas pelos sucessivos governos, considerando que as políticas adotadas têm sido meramente paliativas para um problema estrutural. Bruxelas recomenda medidas mais interventivas, incluindo o controlo de rendas e restrições ao alojamento local, reconhecendo que Portugal não está a conseguir responder adequadamente à crise habitacional.
A crise na habitação não é apenas um problema económico, mas uma ameaça ao tecido social do país. Com os custos da habitação a absorverem quase 40% do orçamento familiar, e com os jovens a serem empurrados para uma “geração adiada” que não consegue aceder à independência habitacional – apesar das várias medidas colocadas em prática pelo atual governo — Portugal enfrenta um desafio que exige respostas estruturais urgentes. A manutenção do atual ritmo de crescimento dos preços, num contexto de rendimentos que não acompanham esta escalada, poderá ter consequências profundas nas perspetivas de vida de gerações inteiras.
Economia: crescimento mais moderado e regresso aos défices
Os últimos meses têm sido marcados por uma onda de revisões em baixa das previsões de crescimento do PIB por parte de várias instituições, que ainda apontam para um iminente regresso a uma situação de défice das contas públicas. O Banco de Portugal, por exemplo, cortou drasticamente as suas projeções de crescimento do PIB para este ano, de 2,3% para apenas 1,6%, uma revisão em baixa de 0,7 pontos percentuais que reflete a contração em cadeia de 0,5% registada no primeiro trimestre.
A contração económica entre janeiro e março foi um “balde de água fria”, representando o pior desempenho da economia nacional desde a pandemia. As previsões do Fórum para a Competitividade apontam para que o PIB tenha uma recuperação entre 0,2% e 0,5% no segundo trimestre, o que corresponde a uma variação homóloga entre 1,4% e 1,7%. Esta evolução deixa a economia “longe” de atingir os 2,4% estimados pelo Governo, como recentemente admitiu pela primeira vez o ministro da Economia.
O regresso a uma situação de contas negativas parece inevitável já este ano, com o Banco de Portugal a antecipar um défice orçamental de 0,1% do PIB, após o excedente de 0,7% registado em 2024, agravando-se para 1,3% em 2026. Esta deterioração é atribuída à orientação expansionista da política orçamental, que inclui medidas como a nova formulação do IRS Jovem, a redução da taxa de IRC e o aumento extraordinário das pensões.
Apesar destes números, a economia nacional mantém fundamentos sólidos que sustentam algum otimismo.
- O mercado de trabalho continua resiliente, com o Banco de Portugal a prever que a taxa de desemprego se mantenha estável nos 6,4% até 2027. O emprego deverá continuar a crescer, mas a um ritmo mais moderado: 1,4% em 2025, 0,7% em 2026 e 0,5% em 2027, segundo as previsões presentes no Boletim Económico de junho do Banco de Portugal. Esta robustez beneficiou significativamente do afluxo de mão-de-obra estrangeira, que entre 2019 e 2024 contribuiu com 12,1 pontos percentuais para o crescimento do emprego.
- A inflação apresenta também perspetivas favoráveis, com o Banco de Portugal a antecipar que se mantenha em 1,9% este ano, descendo para 1,8% em 2026. O FMI confirma esta trajetória, prevendo uma descida para 1,9% em 2025 e aceleração para 2,1% em 2026.
- O turismo mantém-se como um motor vital da economia, com o setor a registar 3,2 milhões de hóspedes em maio de 2025, mais 2,6% face ao período homólogo, que contribuíram para alcançar receitas de 9,8 mil milhões de euros nos primeiros cinco meses do ano, um aumento de 5,6% comparativamente ao mesmo período de 2024.
Contudo, os riscos para a economia nacional permanecem significativos. O Banco de Portugal alerta que “os riscos em torno das projeções são predominantemente negativos para o crescimento”, destacando as tensões comerciais internacionais, a incerteza política e as dificuldades na execução integral dos fundos europeus. A OCDE sublinha que o crescimento das exportações continuará a desacelerar devido ao abrandamento da procura global, ao aumento das barreiras comerciais e à taxa aduaneira de 10% imposta pelos EUA às importações de produtos portugueses.
A produtividade continua a ser um desafio estrutural, mantendo-se significativamente abaixo da média europeia, e o contexto internacional adiciona complexidade ao quadro nacional. As políticas protecionistas e a imposição de tarifas de larga escala representam riscos significativos para a economia mundial e para Portugal, justificando a preservação de espaço orçamental para eventuais medidas de mitigação.
Portugal encontra-se assim numa encruzilhada. Se, por um lado, beneficia de fundamentos sólidos como a estabilidade do emprego, o controlo da inflação e a vitalidade de um setor tão importante para as contas nacionais como o turismo; por outro, depara-se com desafios estruturais significativos num contexto de crescente incerteza internacional.
Defesa: O investimento e risco ao Estado social e contas públicas
Portugal vai gastar mais 1,3 mil milhões em defesa só este ano, naquele que é o primeiro passo de uma série de despesas que terá de culminar com uma aposta nesta área que represente até 5% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2035. Esta foi a percentagem que o Governo acordou com os outros 31 países da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO) em junho, mas praticamente um mês depois da cimeira, o plano para atingir esses compromissos com os aliados militares mantém-se uma página quase em branco.
O esforço bélico é, consequentemente, um esforço orçamental, pelo que a segurança das contas públicas e as responsabilidades sociais do Estado darão azo ao debate na Assembleia da República. Aliás, os cálculos do economista Pedro Braz Teixeira, diretor do gabinete de estudos do Fórum para a Competitividade, para o ECO mostram que, se o PIB crescer em média 2% ao ano, daqui uma década, os tais 5% significam um peso no orçamento superior a 18 mil milhões de euros (a preços de 2025). Entre os peritos existem dúvidas sobre se será possível manter o excedente orçamental este ano (ou, pelo menos, tão elevado) ao aumentar os gastos com defesa para 2% do PIB.
O primeiro-ministro assegura que não é necessário qualquer Orçamento Retificativo, porque o país “tem dinheiro” para fazer face ao esforço financeiro deste ano. E que, para alcançar os 2% do PIB em defesa exigidos para 2025, existirão três eixos: manter e reforçar o apoio à Ucrânia, fazer mais compras e reavaliar investimentos em curso.
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Segundo explicou Luís Montenegro na conferência “A nova Defesa”, organizada pela SIC em Oeiras, envolve “acelerar a aquisição de equipamentos, alcançar metas relativamente a investimentos em infraestruturas” (antecipar verbas da LPM – Lei de Programação Militar) e fazer “reclassificação e reavaliação de alguns investimentos que estão em curso e outros que vão ser efetuados” de “natureza dual” – ou seja, de uso militar e civil. Ademais, está a contar com a ficha de Alcochete na contagem (o Aeroporto Luís de Camões), embora também não se saiba qual a fatia do investimento que pode ser contabilizado através desta infraestrutura.
Com a sombra das contas públicas pressionadas por trás, os países atrasados na meta da NATO, como Portugal, Espanha, Malta ou Irlanda, devem analisar a hipótese de criar um novo imposto ou contribuição que ajude a pagar os gastos em defesa, aconselha o think tank Bruegel. O economista Zsolt Darvas, deste centro de investigação em Bruxelas que costuma aconselhar os legisladores europeus, propõe “tributar o défice dos países em relação a um valor de referência para as despesas com a defesa”, por exemplo os 2% do PIB que antes eram a meta da Aliança Atlântica.
Para o ministro da Defesa, não só essa hipótese está posta de parte como os investimentos serão realizados sem risco de pôr em causa o Estado social. “Seremos capazes de satisfazer este compromisso com a NATO. Não precisamos de mais impostos”, garantiu Nuno Melo em declarações à agência Lusa, após a divulgação da proposta do Bruegel no Diário de Notícias.
O secretário-geral do PS, José Luís Carneiro, está disponível para um entendimento, como expôs numa carta enviada a Luís Montenegro, na qual sugere um grupo de trabalho PSD/PS, negociar um “Acordo Estratégico para um Plano de Desenvolvimento Nacional e de Capacitação da Defesa” a três meses e defende que a decisões da dimensão das tomadas em Haia exigem consenso político alargado.
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