A descarbonização escreve-se no feminino?
de acordo com o Global Gender Gap Index (2022) do World Economic Forum, precisaremos de mais 132 anos para atingirmos a paridade de género. Apenas em 2154.
“Quem se preocupa com os seus netos, planta um sobreiro” é um ditado popular que traduz a importância desta árvore na cultura portuguesa. Um sobreiro pode viver mais de 200 anos e produzir cortiça a cada 9 anos. A cortiça é um material natural e renovável e plantar estas árvores é uma forma de investimento no futuro e de deixar um legado para as próximas gerações.
E é numa perspetiva de futuro que podemos olhar para o Green Deal, o Pacto Ecológico Europeu, que tem como objetivo tornar a Europa no primeiro continente neutro em carbono até 2050, o que pressupõe uma eletrificação massiva de processos nos vários setores e uma aceleração exponencial da incorporação de energias renováveis e de desenvolvimento de novas tecnologias: 75% das emissões de gases com efeito de estufa na UE provêm do consumo e da produção de energia, pelo que neutralizar estas emissões constitui um passo crucial no sentido de retardar o aquecimento global e atenuar os seus efeitos.
Há cerca de 2 semanas, a presidente da comissão europeia Ursula von der Leyen, na sua visita a Islândia disse à primeira-ministra deste país, Katrín Jakobsdóttir, que o mesmo sabe melhor do que ninguém como combater as alterações climáticas, elogiando o seu ambicioso plano para se tornar neutro em carbono em 2040. Hoje, a sua quase totalidade da produção de eletricidade já vem de energias renováveis. Estas duas mulheres são um exemplo de liderança e de como podemos olhar para as alterações climáticas como um multiplicador de ameaças, mas simultaneamente para as mulheres enquanto multiplicadoras de soluções, como um dia referiu Sima Bahous, Directora Executiva da ONU Mulheres.
No entanto, de acordo com o Global Gender Gap Index (2022) do World Economic Forum, precisaremos de mais 132 anos para atingirmos a paridade de género. Assim, apenas em 2154, homens e mulheres estarão lado a lado em direitos. No contexto mundial, quem lidera este ranking é a Islândia, tal como lidera noutras áreas, de que as renováveis são exemplo acima.
Sabemos que atingir a igualdade de género pode ser mais complexo do que o complexo desafio da descarbonização. Se não avançarmos rapidamente no segundo desafio, até que ponto não estaremos a atrasar ainda mais o primeiro? Num contexto em que as mulheres são responsáveis entre 50% a 80% pela produção de alimentos mundial, mas possuem menos de 10% das propriedades e que 80% dos deslocados por desastres e mudanças climáticas em todo o mundo são mulheres e meninas, o investimento em tecnologias de baixo carbono é essencial para impedir também que o fosso entre este grupo vulnerável aumente.
Para atingirmos as metas de descarbonização, não temos dúvidas de que são necessárias mais oportunidades para mulheres neste setor. No ano em que pela primeira vez na história o investimento mundial em energia solar deverá ultrapassar os montantes investidos na extração de petróleo, novas oportunidades não faltarão. Segundo a IRENA, até 2030, irão ser gerados 29,5 milhões de empregos no setor de energias renováveis a nível global, dos quais 11,6 milhões estarão concentrados na indústria do solar.
Um dos maiores desafios para a operacionalização desta revolução climática tem sido a falta de recursos qualificados para dar resposta ao investimento e implementação de novas tecnologias. Globalmente é na área CTEM (Ciências, Tecnologias, Engenharia e Matemática) que existem menos participação das mulheres e será aqui que a Europa tem de investir nos próximos anos: trazer mais mulheres para uma força produtiva em crescimento exponencial. Em Portugal, em 2022, embora 54% dos estudantes inscritos no ensino superior fossem mulheres, as mesmas representavam apenas 27,7% do total de alunos inscritos em engenharia (Pordata, 2022).
Um estudo divulgado em março de 2020 pela Comissão Europeia mostra que, até 2050, uma maior igualdade de género poderá levar a um aumento de 6,1% do PIB per capita da União Europeia. A questão da igualdade de género é por isso importante a nível social, criando oportunidades iguais independentemente do género, mas também do ponto de vista económico. Promover uma transição energética justa, implica também promover uma sociedade melhor e mais equilibrada.
Porque a grande pergunta que se faz é, como é que as mulheres podem ser parte da solução dos desafios climáticos que temos pela frente? Desconstruindo o preconceito de um mercado tradicionalmente segregado e apostando em verdadeiras políticas de parentalidade de forma a que contratar homens ou mulheres seja exatamente igual: todas as pesquisas e estudos económicos mostram que as empresas que adotam a diversidade são mais bem-sucedidas e isto é aplicável nos negócios, na política e na sociedade como um todo.
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