O Chega fundado no “nacionalismo exclusivo” por comparação com o “socialismo inclusivo” inicia o trabalho de canibalização da grande nave política do PSD.

A AD é preguiça política pura. O nome tem uma conotação histórica estratosférica. A coligação à direita podia chamar-se Convergência Democrática, Alternativa Portugal, Democracia XXI. A coligação à direita não pode ser o repositório estafado de um alinhamento que revela desorientação e esgotamento. Desorientação política. Esgotamento de ideias.

O PSD não reflecte nada nem absorve nada, não passa de uma sombra invisível feita de acidentes políticos diários. O CDS renasce pela segunda vez porque ainda se julga que o CDS é o que já foi. Mas a incógnita é grande e as listas da coligação são um suplemento para mais uns anos de irrelevância. O PPM é qualquer coisa em forma de assim, mais um projecto reaccionário e marialva. Mas o contributo toca as notas solitárias de uma melodia política antiga no som das cordas de uma guitarra. Como construir a nova direita com a velha direita?

A nova direita exige uma visão para os portugueses, uma visão em forma de um projecto político, um projecto concretizado num programa político e um programa associado a uma acção política revolucionária. E revolucionária porque a política em Portugal mudou, o equilíbrio de forças está em transformação, as ideias políticas devem acompanhar as exigências do tempo social. A nova direita não pode ser um slogan contra o PS dominador e dominante. A identidade de um projecto político não pode ser a repugnância pelo adversário político. O que mantém a AD é o saudosismo de um projecto, há época revolucionário e a contabilidade do método de Hondt. Saudade é letra de fado menor. Contabilidade é prova de pensamento político menor. Falta o brilho de um projecto à direita para o Portugal do século XXI.

Por que ser de direita não é crime. O PS infectou o país com a ideia de que ser de direita é um defeito moral ao serviço de uma elite e de outros interesses inconfessáveis. O PS cria o mito de que só a esquerda compreende as necessidades e as dificuldades dos portugueses. Mas a direita faz parte do jogo democrático. Aliás, sem uma direita moderna, ideológica, inteligente, não existe democracia, pois o regime transforma-se numa alternância interna às nuances das várias famílias à esquerda. A esquerda que sucede à esquerda não é alternativa, é a representação de uma democracia diminuída até ao limite em que deixa de ser uma democracia. Nesta visão do PS para dominar as estruturas do Estado, que lugar para os portugueses democratas e de direita? A resposta parece estar na conversão da direita a uma espécie de centro-direita reinventado pelo PS. Será que a alternativa é a retirada dos direitos cívicos aos portugueses de direita? Entre a conversão e a expulsão não existe vestígio de uma democracia pluralista. A unicidade democrática do PS é a versão de um autoritarismo soft cell.

A ideia do PS não é inocente. O que é extravagante é a inépcia do PSD e da direita por “indecente e má figura”. É preciso afirmar e reafirmar que a direita em Portugal não é monopólio do Chega. O estereótipo de que toda a direita é extremista, radical e populista, faz parte do grande mito regenerador da democracia de um PS dominante. De um lado um Chega agressivo, racista, ofensivo, fascista. Do outro lado o escudo republicano do PS democrático, pluralista, histórico, progressista. Esta narrativa ideológica pode servir os interesses eleitorais do PS e das esquerdas, mas não corresponde à realidade nem à necessidade de uma democracia europeia consolidada. Com esta estratégia, o PS abre um oceano político entre o centro e a extrema-direita, deixando um vazio político que só fragiliza a democracia. Esta é a origem do “cordão sanitário” ao Chega. E como efeito político derivado deixa três opções possíveis para o lugar do PSD e da direita democrática na arquitectura do regime – o PSD subsidiário do PS; o PSD parceiro do Chega; o PSD perdido no mar oceano sem função ou ideologia. A AD é o PSD perdido no mar oceano sem função ou ideologia.

O congresso do Chega vem demonstrar estas movimentações sísmicas na política portuguesa. O Chega acredita com absoluta firmeza e por consequência não vê qualquer obstáculo em mudar e em ceder para servir as suas conveniências. O Chega não propõe “modelos” porque o único e superior “modelo” é estar permanentemente adaptado às circunstâncias. Esta é a natureza política de um partido típico da direita radical, quer com o princípio do “politique d’abord”, quer com uma espécie de “empirismo organizador” que a família política tem espalhado por toda a Europa.

A circunstância da AD provoca esta resposta política em que o Chega se coloca no epicentro da alternativa socialista. O Chega fundado no “nacionalismo exclusivo” por comparação com o “socialismo inclusivo” inicia o trabalho de canibalização da grande nave política do PSD. O Chega rejubila. O PS exulta. O PSD devia estar preocupado. O PSD está prisioneiro das “linhas melodiosas” da AD. Como podem os políticos evitar convencer-se por um mundo político em que a realidade é uma fantasia?

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