Aumento dos salários depende da produtividade

Subir os salários depende de aumentarmos a produtividade, excecionalmente baixa entre nós, e com crescimentos desanimadoramente medíocres desde há duas décadas.

Desde 2000 que a economia Portuguesa está praticamente estagnada. Conforme é visível no gráfico abaixo, a economia Portuguesa passou por quatro recessões (2002-20023; 2008-2009; 2011-2013; 2020). Em termos acumulados, o PIB real cresceu 20%, o que dá uma média anual de 0.7%. Pior do que Portugal na União Europeia somente a Grécia e a Itália.

A economia portuguesa não cresce de forma sustentada e prolongada acima de 2% porque é pouco competitiva e tem uma baixa produtividade. Sei que alguns dirão que, entre 2017 e 2019, a economia cresceu acima dos 2%.

Mas é preciso considerar três fatores. Primeiro, a economia entre 2013 e 2018 limitou-se a recuperar o nível do PIB de 2007. Entre 2008 e 2013, o PIB caiu 8% em termos acumulados, o crescimento até 2018 foi apenas uma recuperação dessa quebra. Segundo, as previsões económicas no final de 2019, antes da pandemia, apontavam para que em 2020 e anos seguintes a economia já cresceria abaixo dos 2%. Terceiro, o crescimento nesses três anos foi substancialmente acima do PIB potencial, fruto do efeito dos preços do imobiliário e turismo.

Portugal tem um PIB potencial muito baixo. O PIB potencial, como o nome sugere, indica o potencial de crescimento de médio e longo prazo da economia, utilizando todos os fatores de produção. O crescimento do PIB potencial de Portugal ronda os 1,5% ao ano, um dos mais baixos da União Europeia.

O PIB potencial de Portugal é muito baixo porque a produtividade dos três fatores (trabalho, capital e produtividade total dos fatores – TFP) é bastante diminuta, uma vez que o investimento (formação bruta de capital fixo), quer privado, quer público, tem sido muito baixo (quase ao nível de apenas repor a depreciação do stock de capital) e porque as empresas têm reduzidos níveis de internacionalização, bem como baixos níveis de I&D, inovação e criação de valor.

As causas (prefiro chamar-lhe os “estrangulamentos da competitividade e produtividade) estão perfeitamente identificados e estudados: custos de contexto e burocracia; elevada despesa corrente primária e serviços públicos pouco eficientes; sistema fiscal instável, complexo, com elevados custos de cumprimento das obrigações e com elevada tributação em IRS e IRC; sistema de Justiça complexo, oneroso, moroso e pouco eficiente; baixos níveis de qualificações e de inovação; elevado endividamento (externo, privado e público); falta de Capital Humano qualificado em diversos setores; pouca concorrência em diversos setores, com elevados custos de entrada; rigidez e dicotomia laboral, bem como elevados custos unitários de trabalho; e empresas com baixa dimensão, baixa capitalização e baixa internacionalização.

As consequências são também claras: estagnação de rendimentos e baixos salários; aumento das desigualdades; endividamento; aumento da carga fiscal; divergência com a UE e com os países do Leste Europeu.

A mais grave das consequências é, sem dúvida, a estagnação dos rendimentos e os baixos salários. Segundo a Pordata, o PIB per capita (a preços constantes) era, em 2000, de 17 230€, sendo em 2022 de 20 217€. Em quase 25 anos, cresceu apenas 17%, ou seja, cerca de 0.5% ao ano. A este ritmo, a riqueza per capita de 2000 levará 140 anos a duplicar o seu valor.

De acordo com a UTAO, o PIB per capita de Portugal, em 2000, era 72.3% da média da UE (61.9% da média da zona Euro), sendo que em 2022 era apenas de 67% da média da UE (61% da média da zona Euro). Em termos relativos, estamos mais pobres passados estes quase 25 anos. Isto apesar de a UE ter acolhido no mesmo período 13 economias com PIB por habitante inferior ao português no momento das respetivas adesões – o que levou a uma redução da média. Ainda assim, Portugal desceu face a essa média mais baixa. Em Paridades do Poder de Compra (PPC), Portugal tinha, em 2000, 85% do PIB per capita da UE (ocupando a 15ª posição). Em 2002, tinha apenas 77% da média (ocupando a 22ª posição).

As tabelas abaixo mostram o salário mínimo em 21 países e o salário médio em 22 países, para os quais a OCDE tem dados. Portugal tem o 10º pior salário mínimo, mas tem o 4º pior salário médio. Entre 1995 e 2022, o salário médio anual subiu em quase todos os países e estagnou em Portugal (*).


Nota: Em ambas as tabelas, a remuneração total paga pelas empresas e exclui os impostos pagos sobre a remuneração. O salário bruto representado é o valor antes de impostos sobre o rendimento pessoal e contribuições para a Segurança Social.

A tabela seguinte mostra, para estes 22 países, o nível de produtividade (produtividade horária é em USD, em Paridades de Poder de Compra). Não surpreendentemente, Portugal ocupa a 4ª pior posição. Ou seja, o salário médio está na mesma posição relativa da produtividade. Os países que divergem mais em termos de posição são a Eslováquia (tem a 10ª pior produtividade, mas o 2º pior salário médio); a Estónia (tem a 2ª pior produtividade, mas o 7º pior salário médio) e a Irlanda (tem a maior produtividade, mas apenas o 7º melhor salário médio).

Refira-se que a UTAO tem um gráfico, na página 32 do relatório sobre o OE24, que mostra a mesma realidade para um conjunto mais alargado de países do que os membros da OCDE. Um valor hora de cerca de 42 dólares, colocando, em 43 países, Portugal no 12º pior.

Adicionalmente, nos últimos 20 anos, a produtividade da economia portuguesa praticamente estagnou (e daí a estagnação económica atrás referida), tendo mesmo divergido face à média europeia. Mas não é apenas um problema da produtividade do fator trabalho. Verifica-se o mesmo na produtividade do fator capital, bem como na TPF (Total Productivity Factor). Mais uma vez, a UTAO salienta que, em Portugal, a variável TPF não cresceu entre 2005 e 2020. Subiu ligeiramente até 2007, para depois recuar e estagnar até 2020 no nível verificado em 2010, além de divergir dos países com maior produtividade desde 2015.

O gráfico abaixo mostra a correlação elevadíssima entre produtividade e salário médio. Quanto mais elevada for a produtividade de um país, maior será a média dos seus salários. Trata-se de algo relativamente consensual entre os economistas, mas que no debate público raramente é referido. Mas a correlação é por demais evidente.

O que se infere deste gráfico, além dessa elevada correlação entre produtividade e salário médio, sobre o caso português? Portugal está muito próximo da reta de regressão linear (ligeiramente abaixo). O salário médio em Portugal é exatamente aquele que o seu nível de produtividade faria esperar.

Isso significa que apenas haverá aumento do salário médio se houver aumentos de produtividade. A margem existente é muito curta. Qualquer subida de salários acima da produtividade colocaria Portugal mais distante da reta de regressão, e acima desta, tornando a economia portuguesa ainda menos competitiva e aumentando os seus desequilíbrios, o que não seria sustentável no médio e longo prazo.

Subir os salários depende de aumentarmos a produtividade, excecionalmente baixa entre nós, e com crescimentos desanimadoramente medíocres desde há duas décadas. A produtividade é um tema totalmente ausente do debate público. Mas há poucas coisas mais determinantes para o nosso futuro.

Temos de aumentar a produtividade para podermos aumentar os rendimentos, salários, pensões, prestações sociais e os recursos para o Estado Social e as funções do Estado.

(*)

Ainda de acordo com a UTAO, no relatório do OE24 (pag. 35): “De 979 € em 2006 chegou a 1124 € em 2020, um acréscimo real de 14,9% em 14 anos. No percentil 90, o crescimento foi de apenas 7,5%. Em 2020, o salário bruto médio, a preços de 2006, dos 10% melhor pagos valia 1975 €. Os 10% pior pagos recebiam, em média, 620 euros em 2020, contra 450 € em 2006 (+ 37,7%), reflexo da subida da remuneração mínima mensal obrigatória. Metade dos 4,4 milhões de trabalhadores no sector privado ganhava menos de 872 euros em 2020.”

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