Competição pelo talento tecnológico: oferta escassa ou abundância inexplorada?

  • Hugo Filipe
  • 27 Setembro 2023

Os discretos vencedores silenciosos desta batalha são aqueles que alargam o funil de candidatos e procuram profissionais com um leque mais vasto de competências.

A concorrência pelo talento tecnológico continua acesa, e sem fim à vista. Infelizmente, para este problema não há soluções rápidas e milagrosas, nem trunfos transformadores. Mas há escolhas que podem atenuar significativamente o impacto realmente negativo que este problema está a ter no mercado, a vários níveis.

A falta de recursos está a levar as empresas a tomar decisões precipitadas que violam todas as boas práticas de gestão. Custos de contratação acima da capacidade financeira da empresa, recrutamento urgente de profissionais de baixa qualidade ou com competências desajustadas, entre outras opções que comprometem não só a viabilidade financeira da empresa, mas também a própria qualidade do serviço e tudo o que vem por inerência: confiança, credibilidade, reputação, imagem de mercado.

Neste domínio, a rapidez é a maior inimiga da perfeição. É verdade que a pressão imposta pela agressiva competitividade do mercado é grande, mas também é verdade que nesta batalha são poucas as empresas que têm verdadeira consciência do que se está a passar e do que o descontrolo neste contexto pode provocar.

É crucial percebermos que se trata de um fenómeno mundial e que afeta todas as empresas, não estamos a falar de uma dor exclusiva das tecnológicas. Na economia digital todas as empresas são tecnológicas, direta ou indiretamente. Isto significa que todas as empresas estão na corrida pelos mesmos talentos. Portanto: se não há talento tecnológico para todos, mas o sucesso e a sobrevivência na economia digital dependem da tecnologia, o que fazemos? Desistimos, abdicamos da qualidade ou fazemos escolhas “fora da caixa”?

Enquanto os grandes players se digladiam unicamente pelo Top Talent, os discretos vencedores silenciosos desta batalha são aqueles que alargam o funil de candidatos e procuram profissionais com um leque mais vasto de competências. É óbvio que o domínio das competências técnicas continua a ser crítico, mas será que o é em todos os casos e em toda a extensão habitualmente exigida?

Muitas empresas estão a adotar uma abordagem que privilegia pessoas com competências mais preditivas de sucesso – as designadas power-skills: capacidade de solucionar problemas, tomar decisões inteligentes, gerir stress, colaborar, comunicar, capacidade de autogestão e autoconfiança, de ter visão, entre outros exemplos. As empresas podem potenciar estas competências com programas de formação dedicados, mentoring entre pares, learning on the job, isto é, uma jornada de aprendizagem à medida com rumo ao perfil desejado. O top talent não tem de ser o melhor das melhores competências, muitas vezes é o mais ajustado às necessidades e cultura da organização.

As empresas devem abandonar a abordagem ortodoxa atual e superar o preconceito (consciente ou inconsciente) em torno da aquisição e gestão de talentos vindos de áreas diferentes e até mais tradicionais. Apostar numa cultura inclusiva, diversificada, transparente, com uma liderança mais próxima e ativa, focada no conceito de experiência e no desenvolvimento contínuo de competências capaz de aumentar o capital humano e abrir a porta a um leque muito mais vasto de candidatos. Este é inclusive um ponto forte para a retenção: os trabalhadores que sabem que a empresa investe no seu sucesso sentem-se mais valorizados e criam mais facilmente um sentimento de pertença e um desejo de reforçarem o seu empenho.

As jornadas individuais ilustram como as pessoas entram na tecnologia e dominam competências técnicas distintamente novas. As empresas têm de repensar a forma como contratam talento tecnológico, e até olharem de uma forma diferente para os profissionais que têm dentro de casa. Muitas vezes, o melhor lugar para procurar pessoas com aspirações e potencial não explorado é internamente. Investir na formação e no desenvolvimento de pessoas que já conhecem o negócio, que provaram ser brilhantes e fiáveis.

Aprofundar e expandir as competências digitais de toda a equipa compensa sob a forma de produtividade, inovação e retenção. Ainda que exista a possibilidade de os colaboradores seguirem novos caminhos, não formar e desenvolver as nossas pessoas, é bem mais arriscado.

Eliminar lacunas nas competências digitais não pode ser esforço pontual, mas sim um processo contínuo. A rápida evolução tecnológica exige uma atualização permanente dos conhecimentos, mesmo aos nativos da tecnologia. Abrir as portas a todos os profissionais – especialmente às pessoas que querem reinventar-se – é uma tática inteligente para ativar talentos e vencer desafios. Esta perspetiva permite alterar as “regras” do jogo e transformar uma abordagem fechada à escassez existente, no acesso direto e amplo a um espetro abundante de pessoas.

  • Hugo Filipe
  • Partner da Nimble

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