Editorial

Costa em cinco pontos e mais uma coisinha…

Costa igual a si próprio, um habilidoso político. E não é um elogio. Mas sozinho neste deserto político, diz o que quer, nos termos em que quer. A preparar o ano das legislativas.

António Costa marcou o fim-de-semana com uma grande entrevista ao Expresso (leia-se entrevista longa e a abrir a pré-campanha eleitoral), cheia de anúncios para 2019 que são mão-cheia de quase nada, recados aos parceiros e abraços a Rui Rio, remoques a Marcelo, demagogias e cinismo político, tudo à altura da habilidade que se lhe reconhece. As perguntas estavam lá, as respostas são outra história. Verdade seja dita, não tem competidor e se passar o verão com “sucessos” na frente dos incêndios, isto é, sem tragédias florestais ou mortes, a única dúvida será saber qual vai ser a dimensão da vitória nas legislativas de 2019. Sozinho no deserto da política portuguesa (só arcelo lhe pode fazer frente), tem a confiança para dizer tudo. E para não dizer nada ou para dizer o contrário do que o país precisa.

Dentro do governo, a entrevista trouxe uma novidade que não foi ainda devidamente notada. Provavelmente porque estamos à beira de mais uma negociação do orçamento para 2019, talvez sobretudo porque o próximo ano é de eleições, europeias, primeiro, legislativas, depois, António Costa tentou diminuir o peso político e as virtudes de Mário Centeno. Foi talvez a primeira entrevista em que o primeiro-ministro pôs Centeno ao nível de todos os outros ministros, e até disse que não há um bom ministro das Finanças sem um bom ministro da Saúde. Importa-se de repetir!? Será um tema para acompanhar nas próximas semanas.

Marcelo Rebelo de Sousa, esse, não ficou sem respostas. Depois de passar o pior sobre o incêndio de Monchique, o que, nas palavras do primeiro-ministro foi um “sucesso” porque não houve mortes como em 2017, Costa lembrou-se do que o Presidente lhe fez no verão passado. E lá recordou que Marcelo é do PSD, e que, para o Presidente, a família é uma coisa muito importante. Isto a propósito das ideias de Santana Lopes de lançar um novo partido e criar divisões nos social-democratas.

Os parceiros da coligação parlamentar, claro, não foram esquecidos. É muito importante que o PS ganhe força, leia-se mais votos, porque o BE e o PCP não se governam nem se deixam governar e, portanto, para Costa, só é possível uma frente de esquerda a funcionar se, na verdade, aqueles dois partidos estiverem controlados. Se forem os partidos-satélite do PS para zonas do eleitorado onde Costa não pode ir (mas gostava). Para o PSD, que “não tem lepra”, são elogios que Rui Rio dispensava. Ou não. É o novo partido-satélite do PS, mas à direita, para assinar pactos vazios, mas cheios de politica, o que dá um grande jeito. Vai servir para quê, afinal?

As promessas para o Orçamento de 2019 são, sobretudo, bandeiras políticas com impactos orçamentais limitados. É o aumento do orçamento para a Cultura (embora ainda longe dos reclamados 1% do PIB), é a aposta na ciência e inovação, é o programa para fazer regressar emigrantes (sim, já havia um, o VEM, do anterior governo, com resultados muito limitados, a que Costa decidiu pôr fim), é o apoio fiscal ao investimento no interior. Vão diretos a segmentos eleitorais socialistas descontentes ou, mais do que isso, desiludidos, ou a áreas que podem ser bandeiras da oposição. Mas se têm um peso mediático, não vão ter um peso orçamental relevante. Mais para a frente, em função da execução deste ano, e da margem que se vier a confirmar, nomeadamente na Segurança Social por causa da baixa do desemprego, dará mais qualquer coisa à Função Pública. Aposto aqui, singelo contra dobrado, que haverá aumentos salariais no Estado em 2019.

É claro que não poderiam faltar as alfinetadas à EDP e a António Mexia. Desta vez a propósito dos salários (e aqui até ocupa o espaço tradicional do PCP e do Bloco), mas poderia ser por outra coisa qualquer. É barato, todos gostam e dá sempre bons títulos. Porque os salários dos gestores são muito elevados, e as empresas não são feitas dos CEO, mas dos quadros intermédios. Porque atirar ao mais bem pago de todos é coisa que fica sempre bem a um primeiro-ministro de esquerda. Mas Costa mistura alhos com bugalhos (lá está a habilidade política a vir ao de cima) para fazer o seu ponto.

Haverá muita coisa a mudar nas políticas salariais das empresas em Portugal, mas o alvo escolhido é definitivamente o errado. Porque a elétrica, na verdade, não é uma empresa portuguesa, é uma multinacional que tem sede em Portugal. Porque a EDP terá, seguramente, os salários mais elevados para os mais jovens em comparação com os que se praticam em Portugal. Porque uma parte significativa dos lucros da EDP é gerada fora do país, por tantas razões que só a obsessão de António Costa por António Mexia pode explicar este alvo. Porque o problema de Portugal, entre outros, é ter apenas uma EDP – e já agora uma Galp, uma Portucel, uma Jerónimo Martins ou uma Sonae, uma Mota-Engil, empresas com base em Portugal a competir no mundo. Porque deveríamos ter este número multiplicado por dez, ou por vinte. Deveria ser essa a preocupação de António Costa. Não é, como se percebeu ao longo de toda a entrevista. Sim, já sei, Costa dirá “Temos pena”. Pois temos.

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

Costa em cinco pontos e mais uma coisinha…

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião