Direito à defesa: dilemas e interrogações

O direito à defesa de Israel não pode ser posto em causa. E para os devidos efeitos, embora possa parecer inverosímil, Israel está a agir de acordo com o direito internacional.

1. Recentemente, tive a oportunidade de visionar imagens sobre os acontecimentos de 7 de outubro (ataque do Hamas a Israel). Talvez a melhor maneira de descrever o que vi seja dizer que assisti à materialização do ódio através da banalização da violência. Hannah Arendt descreveu as acções dos nazis, particularmente as de Eichmann, como a banalização do mal. Eu vi agora um ódio que usa a violência ao ponto de a tornar trivial e aceitável.

É difícil compreender pessoas que baleiam mulheres, já feridas e prostradas no chão, na cabeça. Porém, está para além da minha capacidade de compreensão entender como é que alguém atinge um bebé, deitado no berço, e depois canta entusiasticamente “Allahu Akbar”. Notem que não me refiro a tiros à distância, mas a execuções sumárias à queima-roupa.

Perante o frenesim de júbilo a que assisti pela possibilidade de assassinar pessoas, pergunto-me como é possível dialogar com pessoas que afirmam a violência em nome de Deus? Mas também me questiono se não seria melhor divulgar estas imagens? Apesar da violência que as mesmas transmitem. Até porque posteriormente também serviam para estabelecer distinções entre Israel e o Hamas.

2. A probabilidade de ambos os lados cometerem atrocidades é alta. Em guerra não é surpreendente acontecerem comportamentos irracionais e emocionais. Mas eu estou certo de que se do lado de Israel forem encontrados indícios de crimes de guerra, os mesmos serão investigados e sendo confirmados, os responsáveis pagarão pelos seus actos. Do lado o Hamas, não acredito que tal se venha a verificar. O caso de Vittorio Arrigoni, um activista italiano pró-palestina que se mudou para Gaza, e que acabou por ser raptado e morto pelo grupo salafista Jahafil Al-Tawhid Wal-Jihad fi Filastin demonstra isso mesmo. Este acto foi condenado por várias facções palestinianas, mas os responsáveis não foram criminalizados.

Este caso permite-nos fazer outra analogia. Os israelitas estão unidos na pressão ao seu Governo pelo resgate dos reféns. Porém, nas sondagens não apoiam o Likud. Isto significa que Netanyahu pode deixar de ser Primeiro-ministro. Ora, isto é o expectável em democracia. Mas, e com o Hamas? Quem é que retira o Hamas do poder?

3. Durante a Segunda Guerra Mundial, independentemente de ter sido uma resposta ao Blitz nazi e aos bombardeamentos de Coventry, Manchester e Londres, é inegável que a campanha estratégica britânica de bombardeamentos que incluiu cidades – Colónia e Dresden – acabou por ser instrumental no âmbito da guerra total contra a Alemanha. Ora, nem todos os alemães eram apoiantes de Hitler. Civis, entre os quais mulheres e crianças, perderam a vida nesses bombardeamentos. Nessa altura, tal como agora, houve críticas às decisões tomadas, especialmente às do Marechal da Força Aérea Real Arthur Travers Harris. Contudo, a estratégia foi mantida. Mesmo tendo os aliados conhecimento de não existirem instalações militares na cidades alemães. Porquê? Porque era imperioso acabar com o regime nazi e como mal que dele emanava. Infelizmente haverá sempre baixas colaterais na guerra.

4. A “arte da guerra” foi evoluindo ao longo do tempo. Apesar das tácticas de guerrilha remontarem à Antiguidade, julga-se que o termo foi utilizado pela primeira vez na Guerra Peninsular (1808-1812). O objectivo da guerrilha é uma guerra de resistência que procura levar um adversário mais forte a combater em condições difíceis e duras onde seja possível empregar contra ele recursos limitados de modo a prolongar o conflito até se atingirem os objectivos. É precisamente isto que o Hamas faz. Tem como objectivo eliminar o Estado de Israel e utiliza todos os meios para o conseguir. Ao contrário do que aconteceu na Alemanha de Hitler, o Hamas serve-se deliberadamente do povo palestiniano como escudos humanos. Como se explica que assim que o Hamas chegou ao poder tenha optado por transformar Gaza num base operacional para actividades terroristas em zonas residências e de hospitais? Como se explica que o Hamas tenha optado por uma resistência de guerrilha que apenas potencia a morte de mais palestinianos, incluindo mulheres, crianças e bebés?

5. Também contrariamente ao verificado nos bombardeamentos aliados às cidades alemães durante a Segunda Guerra Mundial, Israel deu tempo aos palestinianos se deslocaram para longe das áreas onde está a operar, avisa antecipadamente que vai atacar onde o Hamas tem as suas instalações militares e, ironia das ironias, é Israel (e não o Hamas) quem está a proteger os palestinianos que aproveitam os corredores humanitários para se deslocarem para zonas mais seguras. Não posso deixar de salientar um episódio muito recente. Os palestinianos foram brutalmente espancados pelos partidários do Hamas quando tentavam levar alimentos de um camião de ajuda humanitária.

6. Cada vez estou mais convencido de que não haverá paz na região enquanto organizações como Hamas existirem por serem organizações que nem sequer respeitam a vida do seu próprio povo. Ismail Haniyeh, Moussa Abu Marzuk, Khaled Mashal entre outros lembram-me os dirigentes comunistas. Lenine, Estaline, Brejnev, Fidel Castro, Pol Pot, Mao, etc., para além de não pagarem impostos, viveram na abundância enquanto os “proletários” eram pobres. Os líderes do Hamas vivem na riqueza, seguros no Qatar ou no Líbano, longe do sofrimento dos palestinianos.

Curiosamente, também aqui pode ser feito um paralelismo com o actual dirigente do regime russo. A guerra na Ucrânia acaba assim que Putin o desejar. A intervenção militar de Israel acabará assim que o Hamas libertar todos os reféns.

O direito à defesa de Israel não pode ser posto em causa. E para os devidos efeitos, embora possa parecer inverosímil, Israel está a agir de acordo com o direito internacional. Apliquem, por exemplo, aos actos de Israel e do Hamas o Art.º 52º (Protecção geral dos bens de carácter civil) do Protocolo 1 Adicional às Convenções de Genebra de 1949 relativo à Protecção das Vítimas dos Conflitos Armados Internacionais e a Convenção Internacional contra a Tomada de Reféns (1979) para ver a diferença.

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