Fit and Proper: desafios do futuro na supervisão financeira
Os processos fit and proper não são meramente jurídicos ou regulamentares; são profundamente estratégicos. Ao garantir que os líderes estão devidamente preparados.
O fit and proper, ou avaliação da adequação, tem-se tornado cada vez mais central na supervisão das instituições financeiras, focando-se no que há de mais essencial: as pessoas. Trata-se de uma ferramenta que incide sobre a idoneidade e competência de quem ocupa funções de administração, fiscalização e outras posições-chave, assegurando que essas figuras estão aptas a gerir o negócio e acautelar os riscos que lhe estão inerentes.
A avaliação baseia-se em quatro critérios fundamentais: idoneidade, qualificação e experiência, disponibilidade, e independência ou ausência de conflitos de interesse relevantes. Cada candidato é analisado com rigor, e a sua adequação é determinada com base em normas legais, que são desenvolvidas e densificadas por autoridades como o BCE, a EBA, a ESMA e, no plano nacional, o Banco de Portugal, a CMVM e a ASF. Contudo, esta não é uma avaliação estática; depende do contexto e de um juízo de proporcionalidade. Instituições maiores, com modelos de negócio mais complexos, exigem padrões mais elevados de experiência e disponibilidade por parte dos seus responsáveis. A aplicação concreta dos critérios também reflete os riscos específicos enfrentados por cada entidade, tendo em conta o seu modelo de negócio, os mercados em que atua, a eficiência dos procedimentos internos estabelecidos e o seu histórico.
Mas para além do referido, também as prioridades de supervisão existentes em cada momento ditam que aspetos serão mais valorizados nas avaliações fit and proper.
Nos últimos anos, estas prioridades têm evoluído em resposta às mudanças do mercado. Um exemplo disso foi o esforço inicial para elevar os níveis de qualificação dos órgãos sociais das instituições bancárias, objetivo que, uma vez alcançado, abriu caminho para novas exigências, como conhecimentos em matéria de prevenção de branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo. Nos anos mais recentes, o foco recaiu também sobre a diversidade nos órgãos sociais, em particular a diversidade de género, um tema que, embora tenha produzido avanços, ainda está longe de atingir os objetivos definidos.
No horizonte para 2025 há um conjunto de prioridades de supervisão que prometem influenciar significativamente os processos de avaliação.
Entre as áreas de maior destaque está a disponibilidade dos administradores não executivos (NEDs), cujo papel de fiscalização só pode ser eficaz se houver tempo e dedicação suficientes. O Banco de Portugal tem apontado para um reforço da exigência nesse aspeto, reconhecendo que o conhecimento aprofundado do negócio, dos riscos e da estrutura interna das instituições é imprescindível para garantir uma supervisão eficaz, o que implica que os NEDs aloquem tempo suficiente a essa função.
Outra prioridade crescente é a inclusão de critérios relacionados com riscos ESG (ambientais, sociais e de governação). A complexidade que estes fatores trazem para o setor bancário exige que os membros dos órgãos sociais disponham de competências específicas para compreender e gerir estes riscos. A transposição da CRD VI para o ordenamento jurídico português trará maior clareza e exigências nesta matéria. Paralelamente, a tecnologia da informação tornou-se um elemento central, exigindo que os responsáveis pelas instituições conheçam as tendências tecnológicas, a sua aplicação estratégica e os riscos de cibersegurança. O Banco de Portugal já estabeleceu expectativas claras sobre esta temática.
Outro ponto fundamental que promete ganhar destaque é a formação contínua. A necessidade de garantir que os membros dos órgãos sociais mantêm os seus conhecimentos atualizados é uma exigência cada vez mais evidente, sobretudo em áreas como ESG e tecnologia. A transposição da CRD VI reforçará esta necessidade, procurando que a atualização constante se torne uma prática institucionalizada.
Por fim, o papel dos compliance officers será alvo de maior escrutínio, especialmente no âmbito da supervisão da CMVM. Estes profissionais, essenciais para assegurar a conformidade regulatória e a gestão de riscos de compliance, deverão demonstrar capacidades reforçadas para lidar com as exigências crescentes das autoridades de supervisão.
Os processos fit and proper não são meramente jurídicos ou regulamentares; são profundamente estratégicos. Ao garantir que os líderes e principais players das instituições financeiras estão devidamente preparados, os supervisores não procuram apenas proteger o setor contra os riscos que enfrenta, mas promovem também a confiança no sistema financeiro. Assim, o futuro da supervisão continuará a ser moldado por estas exigências, procurando que as pessoas certas estejam nos lugares certos para enfrentar os desafios de um mercado em constante transformação.
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