Impactos dos Eventos Climáticos Extremos, na Produtividade, Demografia, e Gestão de Riscos

  • Helena Chaves Anjos
  • 18 Dezembro 2024

Helena Chaves Anjos descreve todas as ferramentas de gestão de risco face a eventos climáticos extremos que os operadores do setor dos seguros devem conhecer e utilizar.

O estudo mais recente do Banco Central Europeu (BCE), de 27 de novembro1, analisa os impactos macroeconómicos a médio prazo de eventos climáticos extremos, como ondas de calor, secas e inundações. O estudo avalia os riscos climáticos ao nível sub-nacional, em mais de mil regiões da União Europeia, utilizando o conceito de Nomenclatura das Unidades Territoriais Estatísticas (NUTS), para destacar as vulnerabilidades específicas regionais. A abordagem explora em que medida estes eventos afetam a estabilidade económica da Zona Euro e alerta para a importância de adaptar estratégias económicas de mitigação e políticas financeiras eficazes de resposta aos desafios impostos pelas alterações climáticas, preservando a estabilidade financeira a prazo.

O estudo alerta para os desafios crescentes decorrentes do aumento projetado de eventos climáticos extremos, que afetam a Europa, em várias dimensões económicas, incluindo a produtividade e a demografia, com especial relevância para o setor segurador. As ondas de calor e as secas apresentam impactos negativos no crescimento económico a médio prazo, reduzindo a produção nas regiões mais atingidas, enquanto as inundações têm efeitos variáveis segundo os níveis de rendimento: regiões mais ricas tendem a recuperar rapidamente devido à capacidade de reconstrução, contudo, as regiões menos favorecidas tendem a enfrentar consequências mais prolongadas. Adicionalmente, as áreas mais afetadas pelos eventos climáticos extremos registam um declínio populacional e, apesar dos investimentos em adaptação serem fundamentais, estes podem comprometer a produtividade regional dos fatores económicos no médio prazo.

A análise, mais detalhada, da influência destes eventos climáticos extremos, nas economias regionais, destaca o impacto nos fatores do capital, do trabalho e da produtividade, com efeitos diferenciados a variar de acordo com as condições climáticas regionais e os rendimentos locais. Estes impactos, frequentemente persistentes, traduzem-se em perdas prolongadas de rendimento e menor atividade económica nas regiões mais afetadas, com o produto regional a cair até 2,4 pontos percentuais, após períodos de secas. O aumento da frequência e intensidade dos eventos acentua as desigualdades e assimetrias regionais, agravando os desafios de produtividade e demografia, fomentando fenómenos migratórios. Embora as regiões mais ricas apresentem maior capacidade de recuperação, beneficiando da existência de seguros e acesso a créditos, os investimentos em adaptação nas áreas vulneráveis têm-se mostrado menos produtivos, contribuindo para o declínio demográfico e para a queda da produtividade dos fatores. Assim, o estudo sublinha a importância de políticas regionais de adaptação eficazes, para mitigar catástrofes e promover recuperações sustentáveis.

O aumento de preços na habitação foi mais acentuado em centros urbanos e na faixa litoral, áreas de maior densidade populacional, atividade económica e turismo, sendo influenciado por variáveis como taxa de desemprego, taxas de juro, crescimento populacional e novas construções.

Por sua vez o relatório de estabilidade do Banco de Portugal, de 26 de novembro2, analisa a evolução regional dos preços da habitação em Portugal, cujo aumento foi mais pronunciado nos centros urbanos e zonas do litoral, devido à maior densidade populacional, atividade económica e turismo.

A análise evidencia que, em regiões economicamente menos dinâmicas, o crescimento dos preços da habitação foi mais moderado, refletindo fatores da procura, como mercado de trabalho e fluxos migratórios, e da oferta, como capacidade de construção e custos associados. Após a crise financeira, os preços registaram uma descida, mas duplicaram no período da última década. Com base nos dados desagregados por concelho, verifica-se que o aumento foi mais acentuado em centros urbanos e na faixa litoral, áreas de maior densidade populacional, atividade económica e turismo, sendo influenciado por variáveis como taxa de desemprego, taxas de juro, crescimento populacional e novas construções. A procura por alojamento local também contribuiu para a tendência, apesar das estimativas sujeitas a sazonalidade. No futuro, é relevante estudar os impactos diferenciados na distribuição dos preços e os efeitos de contágio entre concelhos.

Uma análise, ao nível nacional, que se revela de potencial interesse para avaliação do valor patrimonial residencial por concelhos, em Portugal, a considerar na avaliação de riscos das coberturas de seguros contra catástrofes naturais. Nomeadamente, de acordo com o dinamismo económico diferenciado, entre centros urbanos e zona costeira, cujas regiões apresentam diferentes graus de exposição a eventos extremos e consequentes impactos socioeconómicos e capacidade de recuperação e resiliência. Em particular, à luz do estudo acima, no que respeita aos impactos dos eventos climáticos com assimetrias regionais na produtividade e demografia, dimensões chave, para a evolução da atividade seguradora.

De acordo com a intensificação e frequência de fenómenos naturais, a Autoridade Europeia dos Seguros e Pensões Complementares de Reforma, em inglês European Insurance and Occupational Pensions Authority, EIOPA, propõe na sua recente consulta pública3, de 28 de novembro de 2024, o desenvolvimento de uma ferramenta de sensibilização que possa ser utilizada por todos os operadores para compreender os impactos das alterações climáticas nas suas propriedades. O objetivo da consulta pública, em curso até 28 de fevereiro de 2025, será reforçar a consciência e a preparação das instituições financeiras e do público em geral, destacando a importância da gestão de riscos de catástrofes, com impacto potencial significativo no setor financeiro e na economia real:

  • A proposta visa uma abordagem estratégica para identificar e mitigar os riscos das catástrofes naturais, promovendo maior integração da resiliência climática nos processos de tomada de decisão financeira, sugerindo a criação de uma plataforma que permita aos operadores avaliar os desastres;
  • Além disso, enfatiza a relevância de um sistema de alertas e monitorização, que permita dar visibilidade sobre exposição aos riscos físicos, de inundações e incêndios, e integrar a adaptação e a mitigação destes riscos nas decisões de políticas públicas e modelos de supervisão sustentáveis;
  • Por fim, o parecer convida os interessados a partilhar opiniões sobre o desenho, com vista à melhoria da transparência e maior cooperação internacional, na prevenção e redução dos impactos.

A proposta oferece uma visão detalhada das ferramentas e plataformas, atualmente disponíveis, permitindo aumentar a sensibilização e compreensão dos riscos de catástrofes naturais, ao fornecer informação de medidas preventivas de mitigação de riscos, ao público-alvo na gestão de catástrofes naturais.

  • Nome e Detalhes das Ferramentas: lista dos diferentes fornecedores ou proprietários, de origem nos setores públicos ou privados, com uma abrangência geográfica variável (nacional, regional ou global), destinados ao público-alvo, desde o cidadão comum a profissionais especializados na gestão de riscos;
  • Avaliação de Riscos e Cobertura de Catástrofes: os critérios de avaliação de riscos são definidos para cada ferramenta, cobrindo múltiplos riscos de catástrofes naturais (inundações, incêndios e sismos), com o número de perigos cobertos a variar com as ofertas de coberturas alargadas às catástrofes naturais;
  • Medidas de Mitigação e Visualização: contém recomendações de mitigação, que podem incluir orientações de prevenção de desastres naturais e visualizações para facilitar a compreensão do risco e medidas de mitigação, incluindo gráficos, escalas e codificação por níveis de risco, com opções visuais interativas ou estáticas e facilidade de uso classificada de acordo com a experiência do utilizador;
  • Conteúdo e Personalização: inclui ainda conteúdo e pareceres específicos e personalizáveis, permitindo adaptar os resultados ao perfil do utilizador, incluindo recursos adicionais para os utilizadores definirem parâmetros de localização e tipo de propriedade, de acordo com exposição aos riscos;
  • Acessibilidade e Interatividade: a fácil utilização por todos os usuários, garante a inclusão de portadores de deficiência e a interatividade permite a interação do utilizador com os dados e a personalização das análises, com opções de guardar as análises ou consultar outros recursos externos;
  • Ecossistema e Integração digital: a proposta envolve a integração com outras ferramentas e plataformas, alargando o alcance e impacto, com recursos adicionais frequentemente fornecidos, com ligação a outras fontes ou ferramentas complementares, reforçando a dimensão da gestão de riscos;
  • Tipologia e Método de Cálculo de Riscos: considera diferentes metodologias para avaliar os riscos de catástrofes naturais, com descrição dos métodos, para a vasta lista das ferramentas disponíveis.

Salienta-se que tais ferramentas podem ainda ser associadas a mecanismos de gestão de riscos de catástrofes nacionais e supranacionais ou a potenciais exclusões por jurisdições aplicáveis ao nível regional.

Vários organismos internacionais e governamentais integram a lista de fornecedores, com soluções de prevenção de eventos extremos, reforçando a necessidade de abordagens integradas de gestão de riscos.

Em conclusão, é fundamental que as seguradoras implementem práticas integradas de gestão de risco, de acordo com os impactos económicos, climáticos e demográficos das catástrofes naturais. Este alinhamento é essencial para traduzir as análises técnicas em práticas de gestão eficazes e políticas públicas pragmáticas, promovendo a robustez financeira do mercado e a resiliência económica da sociedade.

Em particular, em Portugal, face às assimetrias regionais do valor patrimonial habitacional e elevada exposição a catástrofes naturais, cabe aos supervisores adotar uma abordagem estratégica integrada e intersectorial, assegurando a estabilidade e a sustentabilidade do sistema financeiro.

1 BCE, “Going NUTS: The Regional Impact of Extreme Climate Events over the Medium Term”, 27 November 2024.
2 Banco de Portugal, Relatório de Estabilidade Financeira, Preços da habitação regionais, 26 de novembro de 2024.
3 EIOPA, Consultationon a blueprint for awarenesstool for natural catastropherisksandpreventionmeasures, from 28 Nov.2024 to 28 Feb.2025.

  • Helena Chaves Anjos
  • Economista e Mestre em Finanças. Especialista em gestão de risco nos seguros

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

Impactos dos Eventos Climáticos Extremos, na Produtividade, Demografia, e Gestão de Riscos

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião