Inteligência artificial: estratégia ou sobrevivência?

  • Tiago do Couto Venâncio
  • 7 Fevereiro 2023

Tiago do Couto Venâncio, CEO das seguradoras Aegon Santander em Portugal, explica por que automatizar de forma acelerada e recorrer à inteligência artificial vai reescrever a omnicanalidade.

O século XX foi marcado por vários desenvolvimentos tecnológicos importantes: a lâmpada, o automóvel, o telefone. O fascínio pelo desconhecido e as capacidades industriais desenvolvidas impulsionaram a imaginação e a ficção científica, e esta familiarizou o mundo com conceito de robôs artificialmente inteligentes. Por curiosidade, o termo “robô” foi utilizado pela primeira vez no início da década de 1920 por Karel Tchápek na sua obra A fábrica de robôs, que conta a história de um cientista que desenvolve máquinas inteligentes para substituir os humanos nas tarefas árduas.

Na década de 1950, o conceito de inteligência artificial enraizou-se na comunidade científica. Alan Turing, um jovem matemático britânico, destaca-se ao explorar a inteligência artificial no seu artigo Computing Machinery and intelligence, no qual disserta sobre como construir e testar máquinas inteligentes, iniciando a sua reflexão com uma questão: podem as máquinas pensar?

É a Alan Turing que se deve também o primeiro programa – escrito em 1951, em papel – capaz disputar um jogo de xadrez, dando origem a um dos duelos mais mediáticos das últimas décadas, entre o homem e a máquina, e, possivelmente, ao movimento precursor da inteligência artificial.

O ano de 1996 inicia-se com um jogo de xadrez, colocando o campeão mundial Gary Kasparov contra Deep Blue, computador desenvolvido pela IBM. Saliento este acontecimento por dois motivos especiais: porque foi a primeira vez que uma máquina conseguiu vencer uma partida de xadrez contra um grande mestre, no final a vitória ficou do lado de Gary Kasparov, e porque teve impacto nas minhas escolhas. Aquele jogo mediático tornou claro que a matemática faria parte do meu futuro. Apenas um ano depois, a máquina prevalece sobre o homem, Deep Blue vence. No xadrez, a inteligência artificial foi posta ao serviço dos seus jogadores, impulsionando o treino, desenvolvendo as suas capacidades e a qualidade dos jogos de alto nível. É quase impossível classificar ou comparar um jogador moderno com um jogador lendário das últimas décadas, graças à enorme melhoria que esses motores de xadrez proporcionaram.

com a informação trocada através de perguntas e respostas, entre clientes e chatbots passa a ser possível analisar as interações dos clientes, identificando padrões, detetando oportunidades de melhoria, permitindo que as seguradoras se posicionem proativamente, antecipando as necessidades de serviço dos seus clientes, acomodando o futuro de forma ágil

A inteligência artificial (IA) incorporou-se nas últimas décadas em distintos setores de atividade económica, e a atividade seguradora não é exceção. Entre os seguros e a IA existe uma relação simbiótica, na medida em que aquela incorpora vários processos, fornecendo as seguradoras os dados e os recursos necessários para o seu avanço e consolidação.

O processo de subscrição de riscos foi um dos primeiros a ter a incorporação da IA. A capacidade acrescida na análise de grandes quantidades de dados possibilitou a deteção de padrões e riscos impossíveis de detetar pelo olho humano, o que contribuiu para uma melhor qualidade de subscrição, com impacto evidente na redução de custos para clientes decorrente da menor sinistralidade. O mesmo princípio foi transposto para os processos de análise e resolução de sinistros, contribuindo para incrementar a experiência de cliente, acelerando o processo de gestão, bem como para melhorar os modelos de deteção de fraude.

A IA está a ganhar espaço na construção de modelos de preço que permitem a customização cliente a cliente, bem como através de chatbots que impulsionam a experiência de cliente a subir ao próximo nível, aproximando as seguradoras dos seus clientes. Mais do que a informação trocada através de perguntas e respostas, entre clientes e chatbots passa a ser possível analisar as interações dos clientes, identificando padrões, detetando oportunidades de melhoria, permitindo que as seguradoras se posicionem proativamente, antecipando as necessidades de serviço dos seus clientes, acomodando o futuro de forma ágil.

O ano 2023 ainda agora começou, mas estou certo de que a incorporação de inteligência artificial e de machine learning na atividade seguradora será ainda mais rápida do que nos anos anteriores, tanto pelo impacto positivo nas margens de exploração como pelo salto qualitativo na experiência de cliente. Como tendências de investimento na implementação da IA, identifico a continuidade da automatização de processos, o foco na personalização, as análises preditivas de comportamento de clientes, a incorporação de conhecimento proporcionado por dispositivos conectados (internet of things) e a cibersegurança. As oportunidades de inovação trazem responsabilidade, exigindo foco contínuo em assegurar a equidade e a transparência das decisões tomadas por motores de IA, bem como na governação de dados.

Por último, destaco o lançamento do ChatGPT, possivelmente o primeiro passo de integração da inteligência artificial no quotidiano de qualquer utilizador. Ao entusiasmo gerado juntou-se a necessidade de antecipar capacidades futuras e aplicações, bem como o impacto na indústria de seguros ou de serviços financeiros. Certamente, os modelos de apoio e de serviço a cliente beneficiam desta tecnologia, e esta desafiará o status quo, produzindo mais e melhor informação disponível e acessível para todos, clientes e operadores de mercado. A omnicanalidade vai ser reescrita.

A automação inteligente tornou-se, silenciosamente mas de forma irreversível, um pilar para muitos dos serviços que usamos diariamente. Adotar a automação reflete o compromisso das empresas em permanecer relevantes na era digital. Não é estratégia, é sobrevivência.

 

  • Tiago do Couto Venâncio
  • CEO Aegon Santander Portugal Seguros

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