Editorial

Maioria absoluta, o tudo ou nada de Costa

António Costa vai ter de ir a eleições, depois do chumbo daqueles que o ajudaram a chegar a São Bento. E só ficará se tiver maioria absoluta, vai ser o tudo ou nada.

Acabou. A esquerda que pôs António Costa em São Bento chumbou o orçamento para 2022 e criou as condições para uma clarificação política não apenas desejável como obrigatória, porque a democracia é mesmo isto, a possibilidade de um Governo sair de funções de forma pacífica e dar lugar a outro, qualquer que seja, através do voto. O primeiro-ministro fez um discurso que foi uma espécie de balanço de seis anos de governação e primeiro dia de campanha eleitoral, já a pedir uma maioria absoluta. Vai ser essa a sua luta, o tudo ou nada, porque sabe que isso determinará se fica ou vai embora.

Quem diria, há um mês, antes das autárquicas, que o Governo poderia cair já aqui, neste orçamento para 2022? Poucos. Muitos desejariam, mas poucos acreditariam que o PCP e o BE fossem capazes de repetir o PEC4, o ‘orçamento’ que serviu para mandar José Sócrates para casa. Agora, perante a ausência de apoio político, a ideia de que pode continuar em funções em regime de duodécimos é impensável e ingerível. Como saberá Costa, apesar de dizer que está disponível para governar em duodécimos. Só poderia dizer isso, mas o que o primeiro-ministro quer agora é ir a eleições, e se fosse possível já amanhã. Não é, só entre o final de janeiro e a primeira quinzena de fevereiro.

António Costa pediu uma maioria reforçada e estável. Só faltou dizer que quer uma maioria absoluta, porque sabe que isso é uma condição necessária para manter-se em funções. Não chegará a Costa ganhar outra vez por maioria relativa (se ganhar…). Porque não poderá ir para campanha dizer que quer uma nova geringonça, a que falhou agora. Nem poderá dizer o contrário do que disse nos últimos seis anos, isto é, uma gestão à linha, à espera do PSD e de um qualquer bloco central formal ou à medida de uma qualquer decisão.

António Costa perdeu. O líder do PS deu a mão ao PCP e Bloco em 2016, jogou tudo na esquerda, fechou a porta ao PSD, mais, ao PSD de centro esquerda de Rui Rio. Ao fim de seis anos, a estratégia esgotou-se com o orçamento em que mais deu aos comunistas e bloquistas. É uma ironia trágica, mas que acaba bem com eleições, porque o orçamento que já era mau passou a ser pior. As eleições nunca podem ser más (e só faltava mesmo ouvir a repetição de uma ideia defendida há anos por Manuela Ferreira Leite, seis meses de ditadura). Para a economia, para os agentes económicos, o que é mau é a incerteza, não é a clarificação política, que só as eleições garantem.

Agora, António Costa, o político habilidoso que parecia ter tudo na mão, que tinha sempre uma carta na manga para gerir uma minoria, vai ter de encostar o PCP e o BE à parede para reforçar a votação. Vai apontar o dedo a Jerónimo de Sousa e a Catarina Martins e explicar ao eleitorado da esquerda que não há aumento de pensões nem descida (marginal) de IRS ou creches em vias de passar à gratuitidade.

O espetáculo não vai ser bonito, vai ser duro e agressivo, como já se pressentiu esta tarde. Mas terá de ser ainda mais porque haverá seguramente transferência de votos do PS para o PSD com um novo líder (com Rui Rio será mais difícil). É nesta geometria variável que vai construir-se o próximo ciclo político. Com António Costa se conseguir maioria absoluta, sem Costa (e com outro líder, provavelmente Pedro Nuno Santos) se ficar com a posição atual ou até pior.

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