O fim das remunerações secretas está a chegar

  • Luís Cadillon
  • 3 Abril 2024

Utilizar a tecnologia para acabar com o secretismo à volta dos salários pode pôr fim a uma das maiores discriminações de que são alvo alguns trabalhadores.

Clara respondeu a um anúncio para uma posição cuja descrição de perfil e funções faz uma combinação perfeita com as suas caraterísticas. E é claro que o resultado final da sua candidatura dependerá da análise de palavras-chave feita pelo software de triagem, da análise do CV pelo responsável de RH e pelo seu futuro supervisor, e da entrevista que se poderá seguir. Mas desde o anúncio de emprego até à entrevista, e por vezes, mesmo depois desta, há algo que hoje, em muitos casos, permanece obscuro: a remuneração. Mas esse suspense tem os dias contados.

Desde abril de 2023 que o Conselho Europeu aprovou novas regras sobre a transparência salarial, que obrigam os empregadores a incluir nos anúncios de emprego, pelo menos, a faixa salarial para a função em questão, e corrigir situações de empresas com 100 ou mais trabalhadores em que existam disparidades salariais entre homens e mulheres superiores a 5%.

Neste último caso, a legislação portuguesa é mais abrangente porque exige a correção a empresas com 50 ou mais trabalhadores. Mas os dados mais atuais mostram que há muito por fazer: em abril de 2023, os cálculos do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social mostravam que em Portugal as mulheres ganham, em média, menos 16,2% que os homens (consulta do Pordata). Pior do que a média europeia, situada nos 12,7%, mas ainda assim, mais do dobro do máximo permitido.

No caso dos valores de remuneração, uma breve pesquisa por portais de emprego ou pelo LinkedIn demonstra que muitas empresas ainda aguardam pela transposição da diretiva para a legislação portuguesa para agirem. Mas o mercado de trabalho está atento. De acordo o estudo “O estado da compensação 2023-2024”, publicado em outubro pela consultora Coverflex, 90% dos colaboradores de empresas portuguesas inquiridos considera que a faixa salarial deve constar nas ofertas de emprego.

Os RH terão de fazer um exercício de transparência, atualizando a informação colocada nos processos de seleção internos e externos, bem como a comunicação aos colaboradores sobre as suas possíveis atualizações de salário e critérios usados para definir a progressão salarial.

A partilha dessas informações também com as autoridades estatais que regulam este domínio é obrigatória. É há sanções previstas para quem não cumpra, com o ónus da prova de não discriminação e de transparência a recair sobre os empregadores.

Perante estes desafios, a mudança nas empresas pode e deve ser suportada por soluções tecnológicas inovadoras, apoiadas por Inteligência Artificial (IA), análise de dados, Machine Learning, que atualizadas para o cumprimento destes novos deveres, permitirão que grande parte deste trabalho se faça de forma automática e com menos intervenção humana.

Assim, os profissionais de RH ficarão mais livres para o contacto com os colaboradores, e, sobretudo, neste caso, para serem elementos ativos na prevenção da discriminação salarial, seja esta baseada no género, idade ou qualquer outro fator que não o mérito, na análise de soft skills e nos resultados alcançados.

Utilizar a tecnologia para acabar com o secretismo à volta dos salários pode pôr fim a uma das maiores discriminações de que são alvo alguns trabalhadores. Talvez desta forma, um dia, a Clara ganhe tanto como o seu colega da mesma área, e, o Bruno, saiba até se vale a pena abraçar aquela outra oportunidade que viu na página de LinkedIn da empresa da sua amiga Joana.

  • Luís Cadillon
  • Diretor da unidade de negócio HCM na Cegid em Portugal

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