O que separa Bruxelas e Pequim

O 5G tem sido vendido aos consumidores através de chavões extraordinários no que toca a velocidades de download e armazenamentos ilimitados. Mas é muito mais do que isso.

Com a nova tecnologia de comunicações muito vai mudar. A infraestrutura base de cada país vai estar mais conectada, com mais pontos de acesso e mais dependente de um modelo tecnológico cujos responsáveis públicos podem não dominar – ou, pelo menos, podem não ser os únicos a dominar.

A União Europeia identificou um crescente perfil de risco num relatório que traça de forma clara a necessidade de garantir a qualidade e a integridade das redes 5G, explicando que algumas medidas não podem ser apenas de natureza técnica. É aqui que entra a questão política e, mais uma vez, a participação de empresas não-europeias no 5G.

O nome que voltou à baila esta semana é o da Huawei, graças à revelação dos apoios que esta recebeu do Governo chinês, alimentando a ligação entre a tecnológica e Pequim. Não é tão grave o facto de a Huawei ter recebido subsídios governamentais, embora a escala seja assustadora (foram mais de 75 biliões em subsídios diretos e indiretos, de acordo com o Wall Street Journal).

É mais grave a forma como a Huawei se está a revelar um produto direto da mentalidade repressiva instalada pelo governo chinês. Os tiques anti-democráticos da empresa expressam-se de forma cada vez mais notória. Em reação à investigação do WSJ, a empresa começou por negar, depois confirmar mas tentando desvalorizar os factos apresentados.

Já o mesmo se tinha visto na semana passada, depois de o presidente da câmara de comércio chinês em Berlim ter tentado censurar uma entrevista que deu corrigindo as suas respostas… e as perguntas do jornalista. Em França, a Bloomberg noticiou que a empresa chinesa está a processar três pessoas, entre elas um jornalista e um investigador, graças à publicação de notícias sobre a relação da empresa com o seu governo.

A China é uma ditadura que reprime os seus cidadãos e que não demonstra qualquer respeito pelas liberdades individuais. Pior, o seu governo usa todos os instrumentos tecnológicos que tem à disposição para reprimir as populações, como se vê diariamente no que se passa em Hong-Kong. E a verdade é que a Huawei, tal como qualquer empresa sujeita ao enquadramento legal determinado pelo governo chinês, representa uma ameaça ao modo de vida europeu.

No mínimo a China é um concorrente económico, no máximo um adversário geoestratégico – cujos interesses são antagónicos aos europeus. Como quem dominar a rede 5G vai controlar a infraestrutura essencial das nações, o que está em causa com a Huawei é saber se queremos dar à China esse controlo. E, já agora, perder a oportunidade histórica de desenvolver capacidades tecnológicas dentro da própria UE, graças às oportunidades de negócio que se estão a abrir e que podem ser canalizadas para empresas do continente.

Afinal, os apoios a empresas locais por parte dos governos centrais foram a prática traçada pela própria China, que deu origem à Huawei. Talvez esteja na altura de a Europa fazer o mesmo, sem os tiques repressivos e expansionistas da ditadura do oriente.

Ler mais: O relatório dos estados-membro da UE sobre os riscos do 5G merece ser lido com atenção, para que se perceba o que está em causa. E o texto antecipa também a divulgação da lista de medidas de mitigação de risco que será divulgado pela Comissão até ao fim do ano.

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