Editorial

“São todos contra 12. Quem vai ganhar este jogo?”

12 dos maiores clubes do mundo vieram abalar o sistema europeu de futebol, mas na verdade estão a dar uma enorme oportunidade à UEFA para mudar de vida.

E de repente, um grupo de 12 dos maiores clubes de futebol do mundo, alguns deles controlados por investidores milionários, anuncia o lançamento da “Superliga”, mas sobretudo põe em causa o poder estabelecido, a UEFA e a FIFA, e as regras que são dados como “escritas na pedra”. Em menos de 24 horas, levantou-se um coro de críticas contra a proposta da “Superliga”, até de líderes políticos europeus (António Costa também tem uma opinião sobre isto…), discutiu-se muito os deméritos do projeto porque visa mercantilizar um jogo que, como todos sabemos, não liga nenhuma ao dinheiro…

Esta proposta de 12 dos maiores clubes da Europa tem desde logo um mérito, e não é propriamente o modelo de “Superliga” que apresentam, é o de forçar a discussão sobre o regime monopolista que existe hoje no futebol. Sim, se há algum problema de concorrência no mercado do futebol é mesmo o de ser controlado pela UEFA (e a FIFA) que acumula várias funções, como a gestão das competições e o regulador do cumprimento de regras que ela própria estabeleceu. Há maior conflito de interesses? Imaginem agora o se se diria se sucedesse esta acumulação de funções noutras áreas de atividade?

O modelo da “Superliga” não é assim tão diferente daquele que existe hoje na Liga dos Campeões, é levado a um extremo. Para quem acompanha o mundo do futebol, seguramente percebeu a pressão a que estão sujeitos os clubes que estão fora dos cinco maiores mercados, como é o caso de Portugal, para entrar na Champions, porque a diferença de receitas em relação aos que ficam de fora desta competição é abissal, e cria um enorme fosso e uma enorme desigualdade de condições de partida para a disputa das competições internas.

Já nesses maiores mercados, como o inglês, entram na Liga dos Campeões pelo menos quatro clubes, quando só um foi campeão. E porquê? Porque é preciso ter, por exemplo, o Manchester City permanentemente naquela competição, porque os mercados asiático e americano estão dispostos a pagar muitos milhões para ver os jogos da equipa de Pep Guardiola pela televisão. Em Espanha, Itália, Alemanha e França é mais ou menos a mesma coisa. Mais equipas e mais jogos para assegurar mais receita, que acentuam as diferenças nos respetivos campeonatos nacionais.

Há várias condições indesejáveis na “Superliga”, como a desvalorização do mérito e dos resultados a cada ano, sobrevalorizando as marcas e o marketing. Mas a UEFA e a FIFA não fazem exatamente a mesma coisa, não impedem a concorrência de outras competições? Competições que dominam e pelas quais ganham muito, muito dinheiro. As receitas da UEFA na época 2019/2020 atingiram os quatro mil milhões de euros, sobretudo por via das receitas de televisão. Sim, há uma distribuição de fundos por projetos das federações nacionais que são entidades de interesse público, e que financia por exemplo o desporto jovem, mas convém pôr a discussão onde ela deve estar e não tentar convencer-nos de que há o lado bom e o lado mau da história. É pouco mais do que pueril. O futebol é um enorme negócio, e estes 12 clubes querem na verdade sentar-se à mesa para acederem a uma fatia maior do bolo.

Aliás, a reação da UEFA e da FIFA, as ameaças de sanções contra os clubes e, incompreensivelmente, contra os jogadores que são apenas trabalhadores e respondem perante a sua entidade patronal, são o pior dos caminhos, são reveladoras do peso que aqueles clubes têm. Parece, para as entidades donas do futebol europeu, que a concorrência de uma competição como a anunciada “Superliga” acabará com o negócio da Liga dos Campeões. Mas se é mesmo assim, então, aqueles 12 clubes que foram alimentados pelo regime que a UEFA criou têm algumas razões para abrir esta discussão.

Os adeptos querem competição, emoção e incerteza no resultado, querem acreditar que a sua equipa pode ganhar a qualquer outra. A “Superliga” não é obviamente a resposta, mas o atual modelo da Liga dos Campeões já deixou de o ser há anos. Por isso, estes 12 clubes, liderados pelo Real Madrid e Juventus, deram uma enorme oportunidade à UEFA para fazer a sua própria reforma, prometida e metida na gaveta. O que está em causa nesta guerra é uma luta de poder e a UEFA pode mudar as regras, e fazer ela própria uma reforma que promova o espírito desportivo que tantos apregoam e que se perdeu há muitos anos.

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