Editorial

Secretária de Estado da Mobilidade tem autoridade política?

Cristina Dias recebeu 80 mil euros de uma empresa pública para mudar de emprego, não foi despedida, demitiu-se, e isso faz toda a diferença em relação ao caso Alexandra Reis. Tem condições políticas?

A pergunta é incómoda, especialmente para um Governo que, na oposição, foi particularmente severo com o caso TAP e a indemnização de 500 mil euros a uma gestora: Cristina Dias ou Alexandra Reis, qual é o caso mais grave?

Cristina Dias é secretária de Estado da Mobilidade, Alexandra Reis foi secretária de Estado do Tesouro (por uns dias apenas), a atual governante foi administradora da CP, recebeu 80 mil euros para sair da empresa pública por decisão própria e foi, nesse momento, para uma entidade reguladora. Já Alexandra Reis foi ‘despedida’ da administração da TAP, recebeu uma indemnização de 500 mil euros e passados uns meses foi convidada para a gestyão de outra empresa pública, a NAV.

Há uma diferença óbvia, e que salta à vista: Os valores da indemnização são substancialmente diferentes, mas será esse o critério principal para avaliar a gravidade política do que está em causa? Não. O ponto é outro, de princípio, e da forma como as próprias acabaram a sair das respetivas empresas com um cheque na mão (o de Alexandra Reis foi devolvido, depois do relatório da IGF e da CPI, na sua quase totalidade).

Sim, a indemnização a Alexandra Reis foi resultado de uma negociação, enquanto a de Cristina Dias obedeceu às regras que estavam em vigor na CP em 2015, quando saiu, o que parece favorecer a atual secretária de Estado. Mas a forma como lá chegou torna-a uma governante politicamente fragilizada.

Com os factos que foram conhecidos esta semana na audição parlamentar de Cristina Dias, há um dado que torna a situação da atual governante politicamente mais grave: A então gestora saiu porque quis, saiu porque tinha outro emprego à espera, saiu para uma função que sabia ter uma remuneração muito mais elevada. Qual é o sentido que faz uma empresa pagar uma indemnização a um seu quadro que quer ir para outro desafio profissional? Qual é a empresa privada (e espera-se que pública, também) que paga um bónus por um pedido de demissão do próprio trabalhador?

A atual governante beneficiou, como dezenas de outros trabalhadores, de um regime, demitiu-se da administração da CP para, no dia seguinte, na qualidade de quadro superior da empresa, pedir à mesma administração uma indemnização por acordo mútuo quando queria, ela própria, sair da empresa. Como explicou, quase exasperado, o deputado Carlos Guimarães Pinto, o prémio de 18 anos de trabalho era o salário mensal que Cristina Dias recebia. Os 80 mil euros foram um bónus, legal, mas imoral, ou indecente, como notou o deputado liberal.

Cristina Dias bem pode invocar as regras gerais para defender a legalidade da indemnização, uma aberração ao abrigo de um regime de acordo de rescisão mútuo, que serve basicamente para dar prémios aos melhores, aos que têm outro emprego, e para ficar com os piores. Mas o ponto é outro: Agora, como governante, qual é a sua autoridade e legitimidade política para exercer a função?

Alexandra Reis tomou posse e saiu pouco depois das Finanças, penalizada por ter sido despedida e por um valor de indemnização que, num país de pobres e remediados, era uma afronta. Tinha deixado de ter condições políticas para exercer as suas funções públicas. E Cristina Dias?

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