Taxas de juro, o presente e o futuro

A taxa de juro natural continuará aos níveis pós-2008. O fim anunciado da era dos juros baixos parece, assim, manifestamente exagerado.

A taxa de juro real (isto é, ajustada pela inflação) é um dos preços preço mais importantes numa economia. Afeta as decisões das famílias sobre a compra de casa ou o crédito automóvel, molda as decisões de investimento em capital fixo das empresas e influencia a política orçamental e monetária.

Daí ser muito pertinente a questão de saber se, uma vez passado o atual episódio inflacionista e a inflação voltar a estabilizar em torno de 2%, as taxas de juro se manterão altas dando fim à dita era dos juros baixos ou se, pelo contrário, baixarão e retornaremos ao “normal” pré-pandemia. A resposta a esta questão depende da evolução daquilo a que os economistas chamam a taxa de juro natural. Esta taxa (não observada) é pensada como a tendência de longo prazo da taxa de juro real. O facto de as taxas de juro reais nas economias avançadas se encontrarem em queda continuada há 40 anos (cerca de 5p.p. em todas maturidades), sugere que a taxa de juro natural também terá caído sustentadamente neste período.

A evolução da taxa de juro natural resulta de fatores essencialmente estruturais: Aqueles que afetam o equilíbrio entre a poupança e o investimento à escala global. Muitos fatores terão contribuído para a queda desta taxa natural (e, concomitantemente, das taxas de juro reais) desde os 1980´s.

Entre os mais importantes destacam-se os demográficos (envelhecimento das populações e abrandamento do crescimento da força de trabalho), o abrandamento do crescimento tendencial do produto, aquilo a que Ben Bernanke chamou “savings glut” (excesso de oferta de poupanças resultantes das rendas associadas ao aumento do preço do petróleo e da integração da China nos mercados globais) e, mesmo, o aumento da desigualdade na distribuição do rendimento. No mesmo sentido terá também contribuído a queda generalizada do investimento em fração do PIB.

Nenhum destes fatores pesados sofrerá alterações no futuro antecipável. Mesmo choques como a covid-19 ou a guerra na Ucrânia terão efeitos alinhados com a tendência geral, deprimindo a taxa de juro natural. Tudo isto indica que a taxa de juro natural continuará no futuro aos níveis pós-2008. Estimativas desta taxa apontam para valores próximos, mas inferiores a 0,5%. O fim anunciado da era dos juros baixos parece, assim, manifestamente exagerado.

Qual o interesse desta digressão algo académica para os portugueses sobrecarregados com elevados encargos financeiros? Penso que, por uma vez, a teoria económica traz boas notícias para as famílias e para os governos.

Em primeiro lugar, quando a inflação voltar ao alvo do BCE, deveremos antecipar taxas de mercado apenas ligeiramente acima dos 2%.

Em segundo lugar, sendo as dificuldades causadas pelo aperto monetário transitórias, justificam-se políticas públicas de apoio aos que estão em maiores dificuldades. A moratória parcial dos juros e a sua bonificação são dois bons exemplos, mas deveriam contemplar-se outros, mais agressivos em matéria orçamental.

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