Tempestade económica: o impacto das tarifas em Portugal

  • Miguel Pinto
  • 9 Abril 2025

Setores como automóvel, vinícola, farmacêutico, equipamentos industriais e produtos alimentares são dos mais expostos às novas tarifas dos EUA. A capacidade de inovar e de se adaptar será essencial.

A recente decisão do Presidente dos EUA de impor tarifas significativas às importações provenientes da União Europeia (UE) gerou apreensão nos mercados globais, e naturalmente também nas empresas portuguesas. Agora que foram implementadas, estas medidas poderão afetar substancialmente a economia exportadora de Portugal, exigindo uma reavaliação das estratégias de internacionalização, particularmente nos setores mais expostos, como o automóvel, vinícola, farmacêutico, equipamentos industriais e produtos alimentares, entre outros.

Os Estados Unidos representam o quarto maior mercado de exportação de Portugal, com exportações de bens que totalizaram 4,93 mil milhões de euros nos primeiros 11 meses de 2024, correspondendo a 6,7% do total das exportações portuguesas nesse período. As tarifas propostas ameaçam perturbar esta relação comercial vital, tornando os produtos portugueses mais caros e menos competitivos no mercado norte-americano. Além dos impactos diretos, existem preocupações crescentes quanto aos efeitos indiretos. A UE poderá enfrentar repercussões económicas significativas devido a estas tarifas, o que pode resultar na redução da procura por produtos portugueses dentro do mercado europeu. O Banco de Portugal estimou que o atual cenário económico internacional adverso, juntamente com o impacto das guerras tarifárias em curso, poderá reduzir o crescimento do PIB de Portugal em aproximadamente 1,1% nos próximos três anos.

O setor automóvel é particularmente vulnerável a estas tarifas. Fabricantes europeus, incluindo aqueles com operações em Portugal, enfrentam tarifas sobre importações provenientes da Europa, e também de componentes fabricadas em grande quantidade no México e no Canada. Esta situação poderá levar a alterações significativas nas estratégias de produção, pressionando as empresas a considerar a relocalização de fábricas para os EUA para evitar as tarifas, afetando assim as operações europeias. Além disso, a incerteza gerada por estas políticas protecionistas pode desincentivar novos investimentos no setor, prejudicando a inovação e a competitividade a longo prazo.

A produção de vinho português também está sob ameaça. O Presidente norte-americano ameaçou impor uma tarifa de 200% sobre todos os vinhos, champanhes e bebidas espirituosas provenientes da UE, o que afetaria diretamente o setor vinícola de Portugal, sendo os EUA o seu segundo maior mercado de exportação. Em 2024, as exportações de vinho português para os EUA atingiram 102,1 milhões de euros, marcando um crescimento de 2% em relação ao ano anterior. A imposição de tarifas tão elevadas poderia não apenas reduzir as vendas, mas também prejudicar a imagem e a presença dos vinhos portugueses no mercado norte-americano, dificultando a recuperação mesmo após a eventual remoção das tarifas.

Em resposta a estes desafios, o Governo português e Bruxelas têm enfatizado a importância de um diálogo robusto com a Administração dos EUA para evitar a escalada de tarifas que possam prejudicar os consumidores. A maior parte dos países europeus defende uma negociação construtiva (não nos podemos esquecer que os EUA são a maior economia mundial) para salvaguardar os interesses europeus e alertaram que medidas protecionistas prejudicariam os consumidores tanto nos países que as impusessem como nos mercados-alvo, pois o efeito imediato mesmo não aumentando significativamente a inflação, poderão levar a uma contração económica.

Embora o panorama imediato seja desafiador, existem oportunidades que as empresas portuguesas podem explorar. Diversificar os mercados de exportação além dos EUA pode mitigar os riscos associados à dependência de um único mercado. Fortalecer as relações comerciais com mercados emergentes e aprimorar a competitividade dos produtos portugueses através de inovação e melhorias na qualidade pode abrir novas oportunidades. Além disso, investir em tecnologias sustentáveis e práticas de produção ecológicas pode atrair novos consumidores e mercados que valorizam a sustentabilidade, criando uma vantagem competitiva adicional.

Não devem ser esquecidas, também, as oportunidades que, incontornavelmente, irão surgir no setor da defesa, e que terão uma componente importante na área das novas tecnologias. Tudo isto surge por via do aumento significativo que Portugal, e os restantes países da NATO, terão de efetuar no curto prazo nos seus orçamentos para a defesa, e que não se deverão limitar à simples aquisição de material bélico, mas antes com uma componente forte de desenvolvimento de equipamentos e tecnologias de ponta.

A imposição de tarifas representa um desafio multifacetado para as empresas portuguesas, exigindo uma adaptação estratégica e diversificação dos mercados. O envolvimento proativo com parceiros internacionais, aliado a estratégias empresariais ágeis, será crucial para que as empresas portuguesas naveguem nas complexidades do panorama comercial global em evolução. À medida que a situação se desenvolve, a avaliação contínua e a flexibilidade serão fundamentais para garantir o crescimento e a competitividade do país. A capacidade de inovar e de se adaptar rapidamente às mudanças nas políticas comerciais será essencial para transformar desafios em oportunidades. Como diz a expressão popular, “a necessidade aguça o engenho”. Esperemos bem que assim seja!

  • Miguel Pinto
  • Engenheiro e Gestor

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