Cavaco Silva: “Só se Portugal enlouquecesse é que saía da zona do euro”

  • ECO
  • 19 Março 2017

Para Cavaco Silva, só a Alemanha poderia sair sem grandes custos da zona euro. No entanto, não o faria "porque o marco valorizar-se-ia imediatamente".

Cavaco Silva não prevê “o desmoronamento do euro” e salienta que a maior parte dos políticos que defendem essa opção “ignoram as consequências”.

“Quanto ao desmoronamento, queria já agora explicar: eu acho que não se vai desmoronar a zona do euro, porque qualquer governo com o mínimo de bom senso que à sexta-feira pense em tirar o seu país do euro, no domingo entra em pânico sobre aquilo que acontece na segunda-feira”, afirmou o antigo Presidente da República em entrevista ao Público (acesso pago).

“A maior parte dos políticos por essa Europa fora e em Portugal que falam na retirada do seu país da zona euro eu acho que ignoram as dificuldades e ignoram as consequências”, acrescenta.

Para ilustrar as consequências no caso de Portugal, o ex-chefe de Estado cita as conclusões de um economista francês, Jean Pisani-Ferry, a propósito da Grécia: “a situação seria financeiramente caótica, socialmente devastadora e economicamente ruinosa”. “Estou convencido que Portugal será membro da união monetária, da zona do euro, enquanto ela existir, porque eu não prevejo que Portugal enlouqueça — porque só se Portugal enlouquecesse é que saía da zona do euro“, remata.

Num cenário destes, o país regressaria à moeda própria: “o escudo não é uma moeda aceite nas transações internacionais; uma moeda que não é aceite nas transações internacionais suporta o custo de transformação da sua moeda nas outras, um custo de transação e a incerteza cambial; como há uma incerteza cambial, as taxas de juro que esse país suporta são elevadíssimas”, diz.

“Há políticos que olham para a zona do euro e dizem que a zona do euro é a bruxa má, quando deviam agradecer as taxas de juro que este momento pagam em resultado da política seguida pelo BCE. De acordo com as contas da Comissão, só em juros da dívida pública o conjunto dos países da zona euro já poupou cinquenta mil milhões de euros”, adianta ainda Cavaco Silva.

 

Portanto, para o antigo Presidente, estão em causa “coisas óbvias”, ou seja, “só um enlouquecimento da parte de Portugal é que podia levar a que os políticos perdessem o pavor que devem ter, se forem responsáveis em relação ao dia seguinte”. Só a Alemanha poderia sair sem grandes custos da zona euro, mas não o faria “porque o marco valorizar-se-ia imediatamente”, declara.

Nesta segunda parte da entrevista — a primeira foi publicada no sábado –, Cavaco Silva também frisa que a saída do Reino Unido da União Europeia tem custos para os dois lados. No caso do Reino Unido, aponta a dificuldade em defender interesses na cena internacional; já a UE “perde um parceiro importante, que tem algumas especificidades únicas”. “É o que acontece em matéria de serviços financeiros. Todos sabemos que é um dos países mais desenvolvidos na área dos serviços financeiros, e também a capacidade militar. Quando se fala da necessidade de uma política europeia de defesa comum, a Grã-Bretanha tem uma capacidade militar e uma disponibilidade para a utilizar que os outros não têm”, acrescenta. Já “Portugal não tem razão para se preocupar mais do que se preocupa a média da UE” com o Brexit.

Questionado sobre o referendo, Cavaco Silva nota: “sou daqueles que têm alguma dúvida que numa democracia se possa decidir por um voto algo que ponha em causa os avanços institucionais, económicos, sociais alcançados durante décadas e que se lance uma carga muito forte, uma herança pesada sobre a geração futura”. E perguntou: “Costumo dizer: poder-se-ia decidir por referendo, por um voto, que se vá pôr fim à abolição da pena de morte? Que se deixe de proibir o trabalho de menores, de crianças? Há questões civilizacionais”. No caso da saída da UE, “são as gerações mais velhas que votaram claramente pela saída — que vão desaparecer não daqui a muito tempo”, concluiu o ex-chefe de Estado.

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