Offshores: Governo quer restringir lista negra a territórios não cooperantes

Lista negra conta com 87 países e jurisdições, mais um "número indeterminado" de ilhas no Pacífico, acima da generalidade dos Estados-membros. O caminho passa pela "troca efetiva de informações".

A lista negra de offshores é mais extensa em Portugal do que na generalidade dos Estados-Membros, reitera o Governo. Numa altura em que a retirada de três territórios desta listagem provoca polémica, o gabinete do ministro das Finanças defende que é preciso “progressivamente, restringir a lista às jurisdições não cooperantes, em que a troca de informações não se afigura eficaz”. A ideia consta da resposta enviada à Comissão parlamentar de Orçamento, Finanças e Modernização Administrativa, a que o ECO teve acesso.

Já em janeiro, o secretário de Estados dos Assuntos Fiscais, Fernando Rocha Andrade, tinha defendido a redução da lista, pouco depois de Uruguai, Jersey e Ilha de Man terem sido excluídos.

O documento entregue no Parlamento, com a assinatura do chefe de gabinete do Ministro das Finanças, começa por rejeitar a existência de contradições entre as palavras de Mário Centeno e do secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e avança ainda que, no entendimento da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), os critérios previstos na Lei Geral Tributária (LGT) “são indicativos”. Depois, explica a “motivação” para iniciar o processo de revisão da lista negra de offshores, que gerou a saída daqueles três territórios. São cinco os fatores:

  1. “É mais importante para o combate à fraude e à evasão fiscal o acesso a informação financeira e fiscal disponibilizada por outras jurisdições do que a presença dessas jurisdições na lista”. A troca de informações é “aqui o meio eficaz”, porque não há “controlo efetivo de transferências ou acumulações de valores em offshores se o movimento for feito recorrendo a um terceiro país”.
  2. O novo mecanismo previsto na LGT, introduzido pelo Orçamento do Estado para 2017, “permite a tributação efetiva de rendimento gerado em Portugal sem recurso ao mecanismo da lista”, em casos “como o da presença de relações especiais com entidades que operem em territórios de tributação privilegiadas, ainda que cooperantes”.
  3. “As jurisdições estrangeiras estão geralmente pouco disponíveis para cooperar com países que as colocam numa lista de jurisdições não cooperantes”. Nos casos em que a troca de informações é cumprida, a presença na lista “pode tornar-se um obstáculo à descoberta de elementos que permitem a efetiva tributação de rendimento oculto”.
  4. “Há assim, que progressivamente, restringir a lista às jurisdições não cooperantes, em que a troca de informações não se afigura eficaz”.
  5. A dimensão da lista “coloca dificuldades diplomáticas a Portugal, bem como dificuldades às empresas portuguesas com relações económicas legítimas com esses territórios e a cidadãos que aí residem”.

No ponto 4, o Governo defende que a lista deve ser limitada a casos concretos. Em janeiro, o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais já dizia, citado pela Lusa, que “Portugal tem de longe a maior lista negra de paraísos fiscais da Europa” e que, depois da saída da Uruguai, Ilha de Man e Jersey, “provavelmente outros sairão no futuro”. “Para já, saíram três territórios e não creio que sejam os últimos, mas estes movimentos devem ser feitos com prudência”, frisou Rocha Andrade na altura.

Que critérios?

A resposta enviada a deputados também explica as duas partes da abordagem adotada pelo Governo na sequência de pareceres da AT “que apontavam no sentido de uma revisão da lista”. Desde logo, são identificados os critérios tidos em conta para retirar Uruguai, Jersey e Ilha de Man. Em causa estavam as jurisdições que tinham um instrumento de troca de informações com Portugal; que tinham sido avaliadas como compliant ou largely compliant pelo Fórum Global da OCDE; e sobre as quais não existia informação da AT sobre obstáculos significativos e injustificados à prestação de informações.

Estas mesmas ideias já tinham sido deixadas pelo ministro das Finanças, Mário Centeno, no Parlamento, quando referiu a existência de três critérios. Mas a oposição insistia em apontar para a LGT e para as quatro disposições aí elencadas. Cecília Meireles, do CDS, chegou a perguntar pelo critério que considerava mais importante: a inexistência de imposto idêntico ao IRC ou em que a taxa é inferior a 60% da aplicável.

No seu documento, o Governo explica a segunda parte da sua abordagem: propor no Orçamento do Estado para 2017 que passassem a ser considerados como territórios “com regime de tributação privilegiada, claramente mais favoráveis”, todos “os países com baixa tributação”. Ou seja, “para as jurisdições que apenas preenchessem o critério da baixa tributação, mas que se revelassem cooperantes, foi criada uma alternativa: em vez da sua inclusão da lista aprovada por portaria, passou a ser-lhes automaticamente aplicável um conjunto delimitado de normas anti-abuso“, refere. O documento frisa que existe assim um critério procedimental “mais exigente” e, também “de modo ainda mais exigente”, são aplicadas normas anti-abuso a territórios de baixa tributação, mesmo que fora da lista.

Ou seja, as jurisdições que tenham uma tributação “anormalmente baixa (os primeiros três critérios previstos na LGT) e, ao mesmo tempo, não cooperem com Portugal (o quarto critério da lei), “devem obrigatoriamente constar da lista aprovada pelo Governo”, diz a resposta do Executivo. A estas jurisdições são aplicadas normas para prevenir aquelas duas situações. Já os territórios que tenham uma “tributação anormalmente baixa mas cooperem com Portugal” — numa referência à norma introduzida pelo Orçamento do Estado — “não constam necessariamente da lista aprovada pelo Governo mas são automaticamente aplicadas as normas anti abuso para prevenir o desvio das bases tributáveis no quadro de esquemas de planeamento fiscal”.

Tirar um país da lista não significa que deixam de estar sujeitos “especial controlo bancário”, porque, para isso, vigora a lista do Banco de Portugal, “bastante mais lata” e que inclui os territórios excluídos no âmbito do artigo da LGT, avança ainda o documento.

Conclui o gabinete de Mário Centeno que “é muito mais relevante existir uma troca efetiva de informações” do que retirar os países cooperantes da lista do Governo e confiar apenas na comunicação de transferências. “Num mundo globalizado e, em especial, numa Europa em que não existem fronteiras financeiras, é bastante limitado o controlo que possa ser exercido apenas com base no reporte das instituições financeiras a operar em Portugal”, diz ainda.

Outros Estados têm listas muito mais reduzidas, nota o Governo:

  • Portugal: 87 países e jurisdições, mais um número indeterminado de ilhas no Pacífico;
  • Bélgica: 26 países e jurisdições;
  • Espanha: 33 países e jurisdições;
  • França: 6 países e jurisdições
  • Grécia: 57 países e jurisdições;
  • 16 estados, entre os quais Alemanha, Dinamarca, Luxemburgo ou Reino Unido, não têm lista.

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