“Quanto mais tempo mantivermos políticas expansionistas, maior é o risco”, alerta Lagarde

Pela primeira vez desde que é presidente do BCE a participar num plenário do Parlamento Europeu, a francesa deixou alertas para que políticos apoiem o trabalho dos estímulos monetários.

O Banco Central Europeu (BCE) tem sido eficaz na estratégia, mas não pode atuar sozinho até porque o risco está a aumentar, alerta a presidente Christine Lagarde. Na primeira participação do plenário do Parlamento Europeu desde que ocupa o cargo, a francesa pediu aos governos da Zona Euro que usem a política orçamental e aos eurodeputados que reforcem a união monetária por considerar que os dois passos são necessários para estimular a economia da moeda única.

“A nossa política de estímulos tem apoiado o crescimento económico, resultando em mais empregos e salários mais elevados para os cidadãos da Zona Euro. Mas a política monetária não pode, nem deve, ser a única solução. Quanto mais tempo mantivermos em curso medidas de política expansionista, maior é o risco que os efeitos secundários se tornem mais pronunciados”, afirmou Lagarde, esta terça-feira, no debate no Parlamento Europeu.

Lagarde referia-se às taxas de juro em mínimos históricos e ao programa de compra de ativos que o BCE tem levado a cabo desde a crise e não tem perspetivas de alterar. Quando a sucessora de Mario Draghi chegou à presidência do banco central, em novembro, já estava planeada uma nova ronda de estímulos, desta vez com uma medida de mitigação dos efeitos secundários para a banca.

A francesa sublinha agora que o BCE está a acompanhar esse risco, mas incentiva outros players a agirem. Por um lado, “outras áreas políticas — em especial políticas orçamental e estrutural — devem fazer a sua parte”, disse, em linha com a ideia que tem defendido sobre o aumento da despesa pública por Estados com excedente orçamental.

“Estas políticas podem impulsionar o crescimento da produtividade, aumento o potencial de crescimento e apoiar a eficácia das nossas medidas. De facto, quando as taxas de juro estão baixas, a política orçamental pode ser muito eficiente”, sublinhou Lagarde.

Por outro, lembrou a importância do papel do Parlamento Europeu enquanto colegislador. Lagarde lembrou que ao longo dos anos, a arquitetura da Zona Euro evoluiu substancialmente, mas há elementos essenciais “ainda em falta ou incompletos”, o que impede a sua capacidade de conseguirem atingir o seu total potencial para os cidadãos da Zona Euro. “É por isso que o BCE tem defendido, e continuará a fazê-lo, para a completude a união económica e monetária”, disse ainda.

Apontou para a união bancária, o sistema de seguro de depósitos ou a união do mercado de capitais, defendendo que é preciso uma função central de estabilização que funcione como linha de defesa contra choques. “Uma união económica e monetária mais resiliente com estes elementos iria não só ajudar a proteger os nossos standards de vida contra desenvolvimentos domésticos e globais adversos, mas iria também apoiar a influência da Europa no mundo, incluindo tornando o euro mais atrativo”.

Socialistas portugueses concordam com Lagarde. PCP vê o euro como problema

A francesa deslocou-se a Estrasburgo para participar na sessão plenária em que se discutiu o parecer do Parlamento Europeu sobre o relatório anual do BCE.

O Parlamento Europeu publicou no final de janeiro um relatório em que concorda que o BCE tem ajudado a estimular a economia da Zona Euro, mas em que alerta que a estratégia não pode substituir reformas estruturais O relator, o eurodeputado cipriota Costas Mavrides, clarificou no debate desta terça-feira que o Parlamento Europeu está preocupado com a desaceleração da economia da Zona Euro e que pede ao BCE que continue a monitorizar os riscos associados às políticas não convencionais.

Entre os eurodeputados, as posições foram muito diferentes com vários elementos da assembleia a apontarem para efeitos adversos como o risco de bolha nos preços do imobiliário ou o disparo nas comissões cobradas pela banca para fazer face à pressão nas margens financeiras.

Mas os portugueses concordam com Lagarde. Pedro Silva Pereira, socialista e vice-presidente do Parlamento Europeu, reconheceu que “há novos desafios” como as alterações climáticas ou a digitalização, considerando que é importante que o BCE olhem para eles, mas defendeu que é também “preciso que a política monetária continue a apoiar a economia”.

Numa altura em que o Governo socialista português se prepara para conseguir o primeiro excedente orçamental em democracia, Silva Pereira acrescentou concordar que “países com espaço [orçamental] devem usá-lo”. A também socialista Margarida Marques focou-se na união bancária e dos mercados de capitais, dizendo que são necessários “progressos significativos” pois os conseguidos até agora têm sido “lentos e muito limitados”.

Um papel fortalecido do euro precisa antes de tudo de vontade política. Há que completar a união económica e monetária como instrumento orçamental capaz de responder a choques a exógenos e com um safe asset. O BCE precisa de ter um papel fundamental neste debate como precisa de ter um papel fundamental no combate às alterações climáticas”, sublinhou.

Do lado do PCP, João Ferreira fez um discurso, sem surpresa, contra a moeda única, em que defendeu que a “armadilha do euro” deixa os países — especialmente os mais endividados como Portugal — vulneráveis a uma nova crise. “As prolongadas medidas de política monetária não têm sido por si só suficientes para travar a desaceleração económica além de estarem a esgotar o seu alcance. Não sabemos quando será o novo pico de crise, mas sabemos que encontrará as economias da periferia da zona euro tão desprotegidas como há uma década“, disse o eurodeputado.

(Notícia atualizada às 16h00)

(A jornalista viajou a convite do Gabinete do Parlamento Europeu em Portugal)

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