Fundos de investimento já perderam 1,5 mil milhões devido ao vírus. Imobiliário resistiu

Há 11 meses que não havia tão pouco dinheiro nos fundos mobiliários e imobiliários. A principal causa foi a desvalorização das ações, enquanto obrigações e imobiliário mantiveram os fundos à tona.

Os fundos de investimento em Portugal perderam 1,5 mil milhões de euros só em março. Esse foi o mês em que o coronavírus chegou ao país, levando parte da economia a parar e gerando stress nas ações e nas obrigações. Apesar de desvalorizações e resgates espelharem essas tensões, o imobiliário foi o resistente.

O valor sob gestão dos organismos de investimento coletivo em valores mobiliários totalizou 11.455,0 milhões de euros, em março, segundo dados da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM). O montante representa uma perda de 1.452,7 milhões, ou seja 11,3% face a fevereiro.

“Penso que foi muito afetado pelas desvalorizações do mercado. Mais do que por resgates”, considera Virgílio Garcia, CEO da Sixty Degrees. Recém-chegada ao mercado português no início do ano, a gestora de ativos captou clientes, mas os atuais cinco milhões de euros em ativos sob gestão deixam-na atrás no objetivo de atingir 100 milhões a três anos.

“Após três meses de testes, começámos oficialmente em janeiro e aconteceu logo uma crise muito complicada. Agora, as coisas estão mais calmas, mas o que aí vem, em termos económicos, não vai passar assim tão rápido“, defende Garcia. Por considerar que o mercado estava à frente dos fundamentos, o CEO reduziu a exposição a ações a quase zero e conseguiu, assim, diminuir a perda: no primeiro trimestre desvalorizou menos de 1% e, desde então, já alcançou a linha de água.

Jerónimo Martins é o título preferido para fugir à crise

As bolsas europeias viveram, entre janeiro e março, o pior trimestre desde 2002 devido ao surto de Covid-19. No último mês, o valor das aplicações em ações dos fundos de investimento desceu 22,6% em relação a fevereiro nas de emitentes nacionais e 15,7% nas de emitentes estrangeiros.

"Aconteceu uma crise muito complicada. Agora, as coisas estão mais calmas, mas o que aí vem, em termos económicos, não vai passar assim tão rápido. O mercado já está a descontar um grande impacto de Covid-19.”

Virgílio Garcia

CEO da Sixty Degrees

Além da saída das ações, os gestores também se reposicionaram para reduzir as perdas. A Jerónimo Martins foi o título com maior peso nas carteiras dos fundos, representando 11% do total investido. Com uma subida mensal de 8,4%, a retalhista foi o único título que registou aumentos nas carteiras. A segunda cotada do PSI-20 com maior peso foi a EDP, cujo valor nas carteiras dos fundos desceu 23,6%, e terceira a Nos, cujo valor decresceu 17,4% face a fevereiro.

Em sentido contrário, os fundos reforçaram a aposta em dívida pública portuguesa. O valor das aplicações subiu 13,2% na nacional, enquanto na estrangeira recuou 15,6%.

Virgílio Garcia concorda que a liquidez da dívida é uma ajuda para fazer face à pandemia, mas no caso a preferida é a dos EUA. No único fundo gerido pela Sixty Degrees, o Sixty Degrees PPR/OICVM Flexível, as ações representam atualmente 30% da carteira, enquanto a maior parte do restante está alocado a obrigações. “O mercado já está a descontar um grande impacto de Covid-19 e nós continuamos concentrados em dívida de curto prazo“, sublinha.

Só a dívida salvou os fundos do vermelho

Fonte: Associação Portuguesa de Fundos de Investimento, Pensões e Patrimónios (APFIPP) | Rendibilidade dos 12 meses terminados a 27 de março

Fundos de investimento imobiliário contrariam

Se as obrigações suplantaram as ações na rendibilidade dos fundos, há outro investimento que superou ambos. O imobiliário funcionou como um pilar robusto no meio da tempestade. “Como é um investimento de mais longo prazo do que as ações ou as obrigações, a volatilidade dos preços é menor“, explica José Gavino, responsável para o mercado português da Corum Investments.

A sociedade gestora francesa, que chegou a Portugal no ano passado, é especializada em investimento imobiliário e não registou resgates nos fundos. Apesar de reconhecer que há sempre uma componente de risco, Gavino considera que os investidores estão a resguardar-se. “É sabido que estas alturas nunca são boas para tomar decisões. Faz mais sentido manter posições porque o o ciclo no imobiliário é mais longo”, defende.

A posição não parece ser única já que os fundos de investimento imobiliário (FII), os fundos especiais de investimento imobiliário (FEII) e os fundos de gestão de património imobiliário (FUNGEPI) mantiveram os montantes sob gestão praticamente inalterados em 10.515,6 milhões de euros.

"O segmento residencial, que cresceu muito, pode parar de crescer ou ter até um decréscimo. No comercial, pode haver desvalorizações nos hotéis, mas valorizações nos centros comerciais.”

José Gavino

Responsável para o mercado português da Corum Investments

Os países da União Europeia foram o destino da totalidade do investimento feito em ativos imobiliários. Cerca de 45,8% da carteira dos FII e FEII abertos foram aplicados em imóveis do setor dos serviços, enquanto os FUNGEPI alocaram 65,9% do total ao comércio.

No caso da Corum, que tem 2.635 milhões de euros em ativos sob gestão, tem a totalidade dos ativos sob gestão alocada a imobiliário comercial e antecipa um impacto reduzido de Covid-19 na rentabilidade de 2020.

Admite, no entanto, que a crise pandémica terá impacto no valor dos ativos. “O segmento residencial, que cresceu muito, pode parar de crescer ou ter até um decréscimo. No comercial, pode haver desvalorizações nos hotéis, mas valorizações nos centros comerciais”, diz Gavino, acrescentando que “já estão a surgir oportunidades no mercado”.

Há 11 meses que não havia tão pouco dinheiro nos fundos

Fonte: Comissão do Mercado de Valores Mobiliários | Em milhões de euros

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