Cuidados de saúde oral da Santa Casa chegaram a 7 mil crianças

  • ECO
  • 1 Dezembro 2020

Cuidados de saúde oral para todos. Essa é a missão do SOL, o serviço de saúde oral da capital, uma iniciativa da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa que completou um ano e chegou a 7 mil crianças.

Em agosto, ainda mal recuperados dos efeitos do confinamento a que a pandemia nos obrigou, o SOL (Saúde Oral em Lisboa) completou um ano de vida e de missão: acesso gratuito e universal a cuidados orais a todas as crianças até aos 18 anos que residam ou estudem no concelho de Lisboa, independentemente da folha de IRS de pais ou cuidadores.

Ao todo, pelo número 219 da avenida Almirante Reis já passaram 7 mil crianças e realizaram-se 22 mil consultas (16 mil das quais até agosto), segundo as contas do médico dentista André Brandão Almeida, que lidera este projeto da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa. Nunca duvidou que o projeto teria “a adesão das pessoas, mas foi muito mais…”.

Temos um ingresso de 250 novas crianças todos os meses”, estima o diretor clínico do SOL. As fichas de utente mostram “o carácter multicultural da cidade”, nota. Já atenderam meninos de 31 nacionalidades – do Cazaquistão a Angola, de Itália à China.

Estão a retomar a atividade onde a deixaram, remarcando as dezenas de consultas que entre 16 de março e 16 de junho, o SOL, como outras serviços e atividades, foram obrigados a cancelar. “Reabrimos quando a equipa estava toda rotinada”, diz ao ECO. E regressaram com mais cuidados que nunca.

Uma das maiores preocupações foram os equipamentos de proteção individual (EPI), fundamental para quem está na linha da frente dos cuidados de saúde oral como os cerca de 30 profissionais de saúdes – dentistas, higienistas, auxiliares, que trabalham no SOL. “Há estudos que referem que a contaminação entre profissionais de saúde acontece na retirada do equipamento”, diz André Brandão de Almeida. Relembra, aliás, que “no início também foi isso que nos atirou para o encerramento absoluto”. Por essa altura, março de 2020, ainda muito se desconhecia sobre a covid-19. Apesar de, como salienta, “trabalhar numa área que sempre teve preocupações de segurança”.

A grande mudança no SOL, além dos equipamentos de proteção individual, é o intervalo entre consultas. Antes era de 30 minutos, agora é uma hora. Por isso, defende, o número de crianças seguidas pelo SOL poderia ser superior aos 7 mil, algumas das quais com dez ou mais consultas realizadas.

Retomar onde o confinamento interrompeu

Estão a remarcar todas as consultas que ficaram para trás. Contam com as videoconsultas para ultrapassar atrasos. “Temos um esquema para debelar isso – telemedicina – para podemos ir acompanhando os utentes”, conta. “Como é só de crianças, há uma grande componente de medicina preventiva e de aconselhamento”, explica.

No SOL, o grupo foca-se em três áreas: prevenção, manutenção e tratamento.

No primeiro, o segredo está no ensino e envolvimento da família na higiene oral. Uma primeira consulta procura perceber a história clínica da criança – as doenças, a medicação, se foi operada, sujeita a internamento, etc. – e a desfazer mitos. Explicam-lhes, por exemplo, que “devem lavar os dentes antes de dormir e de manhã e antes do pequeno-almoço”. Ao contrário da crença popular, não é necessário escovar depois de todas as refeições. Alguns alimentos possuem ácidos que uma escovagem espalha”, diz André Brandão de Almeida. O outro mito é passar a boca por água depois de lavar os dentes. “Só se deve retirar o excesso e depois deixar atuar o flúor”.

As crianças podem ser tão bebés como seis meses. A consulta é mais para os adultos do que para eles. “Para que pais e cuidadores percebam um conjunto de informações e recebam dicas. Se é normal chuchar no dedo, qual é a quantidade de pasta que deve usar? com flúor ou sem? Volta com dois anos e, se tudo correr como previsto, está criada “uma rotina que permite chegar à idade adulta com uma saúde de ferro”.

Saúde oral e saúde em geral

O médico dentista lembra a reflexão, de anos, sobre “a relação entre saúde oral e medicina geral” e “o impacto da saúde oral no indivíduo na família e na sociedade”. Sem boa saúde oral, “ficam comprometidas funções básicas – comer, sorrir, respirar…

As doenças orais têm efeitos que podem ir do absentismo escolar da criança para tratar uma infeção que lhe provoca dores lancinantes, má mastigação e má nutrição ou o recorrente adiamento de uma cirurgia, pois uma cárie pode provocar complicações no pós-operatório.

Nas crianças, diz, “inibe-as de sorrir e de socializar”. Mais: “Há estudos que dizem que uma criança aos 3 anos afetada por lesões de cárie pode ter menos de um quilo de peso”, refere André Brandão de Almeida. “Se forem precocemente recuperados, evitam-se problemas”, defende.

Resposta universal e “excelência de serviço”

A universalidade da oferta – o SOL é para todos os meninos de Lisboa dos 0 aos 17 anos e 365 dias, desde que residam ou estudem em Lisboa e qualquer que seja a folha de IRS dos pais – “foi uma das pedras de toque da formação do SOL”, refere André Brandão de Almeida. Uma das primeiras perguntas que se fizeram foi se este serviço ia “ser como os restantes serviços ou mais além?”

A resposta está à vista: a prioridade é chegar a todos tal como acontece no Serviço Nacional de Saúde (SNS), que desde 2015, isenta todas as crianças de taxas moderadoras na saúde oral. “Não interessa se os pais têm posses, o que interessa é a criança, se tem problemas de saúde oral que precisam de ser resolvidos, não interessa quem é, se é rico ou pobre. O acesso é universal”.

Muitas pessoas pensam que só podem receber este apoio se tiverem algum apoio”, mas não é assim. “Entregam cartão de cidadão, com a residência e idade tem acesso direto”, esclarece.

Ainda assim, “o nosso público maioritário é aquele que nunca foi ao dentista, aquelas crianças que dificilmente poderiam ir a uma consulta privada, há muitas crianças já com muitos problemas não só dentários”, nota. Para esses, o SOL, tem também um serviço de ortodôncia. “Tinha de ser diferente e alargado porque só assim se consegue chegar a todos”.

Outro pilar do serviço era a “excelência do serviço”, diz André Brandão de Almeida. “Quando equipámos o centro dissemos que nãos nos íamos limitar aos equipamentos tradicionais”, conta.

Um desses instrumentos é o microscópio cirúrgico que permite “uma taxa maior de longevidade no tratamento”. E, para os casos mais complexos, têm sedação consciente, uma opção para quem não aguenta mesmo os tratamentos. “Há poucas clínicas a oferecer este tratamento”. Outro dos equipamentos pouco habituais ainda é o scanner que permite fazer um molde sem pasta e com maior precisão

Um centro de referência e multidisciplinar

André Brandão de Almeida esteve envolvido no projeto desde o primeiro dia, mas atribui a paternidade do SOL ao provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, Edmundo Martinho. “Tem de existir vontade política”, afirma. Foi o que aconteceu desta vez – mais do que dizer que eram precisos cuidados de saúde oral, era preciso destinar um orçamento para esses cuidados.

André Brandão de Almeida, que começou num serviço no bairro da Serafina, em Lisboa, “uma unidade que tem um carácter de prestação serviços ao Bairro da Liberdade”, acabou por ser chamado para a equipa que criou o SOL desde o primeiro minuto. Estudaram a resposta que já existia e pensaram o que podiam oferecer de novo – funcionamento, regulamentos.

Tive sempre propensão sobre este serviço público. Percebia que era possível, como é que em Portugal não se fazia?”, conta ao ECO. Ambiciona continuar a crescer: “Se queremos ser um centro de referência, não pode ser assistencial, temos de ser multidisciplinar, nutrição, terapeuta da fala, psicólogo, em que esses profissionais nos podem ajudar”.

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