Estado gastou mais 15,9% em benefícios fiscais em 2019. Tribunal de Contas alerta para subavaliação
O Tribunal de Contas nota que a despesa fiscal decorrente de benefícios fiscais evidenciada na conta geral do Estado "apenas abrange 179 dos 383 benefícios em vigor".
O Tribunal de Contas (TdC) tem reservas sobre a legalidade, correção financeira e controlo interno da execução orçamental, decorrentes da avaliação da conta geral do Estado de 2019. Uma das notas feitas pela entidade no parecer feito ao documento é que encontrou uma “subavaliação da despesa fiscal por benefícios fiscais, para além de despesa fiscal por quantificar”.
“A despesa fiscal decorrente de benefícios fiscais evidenciada na conta geral do Estado (13,2 mil milhões, um aumento de 1,8 mil milhões face a 2018) apenas abrange 179 dos 383 benefícios em vigor“, nota o Tribunal, na avaliação ao principal documento de prestação de contas do Estado.
Dos 383 benefícios fiscais identificados, apenas se quantifica a despesa fiscal relativa a 179 e que totaliza 13.171 milhões, mais 1.806 milhões face a 2018 e mais 1.470 milhões do que o valor estimado no OE.
Esta tendência crescente “contraria o objetivo assumido pelo Governo no Programa de Estabilidade 2019-2023”, nota o TdC. Já o Ministério das Finanças, em contraditório, argumenta que a evolução da despesa fiscal “resulta do crescimento da economia”, sublinhando que o maior contributo é do IVA, que é apenas “parcialmente justificado por medidas de política”.
Desta forma, o TdC recomenda que se assegure a “fundamentação da criação de benefícios fiscais, a sua reavaliação sistemática bem como implementar procedimentos de controlo da despesa fiscal para a sua relevação apropriada na conta geral do Estado”.
Este é um dos aspetos de correção financeira sobre os quais o TdC tem dúvidas. Nesta rubrica, nota ainda que há a omissão de sete entidades na execução orçamental, bem como da “dívida pública dos serviços e fundos autónomos no stock da dívida pública, do inventário do património imobiliário e das garantias prestadas por serviços e fundos autónomos”. Verifica-se ainda a não inclusão de informação completa e integrada sobre o património financeiro.
Já no que diz respeito à legalidade, as reservas prendem-se com a segurança social. Estão relacionadas, por um lado, com a “não instauração de processos executivos por dívidas provenientes de reembolsos de prestações de alimentos devidos a menores e de pagamentos indevidos a requerentes de créditos emergentes de contrato de trabalho”, explica o TdC. Por outro, existe ainda uma “inobservância das regras do Cadastro e Inventário dos Bens do Estado quanto a amortizações”.
Défice reduziu-se 62% face a 2018
O Tribunal de Contas sublinha que o défice reduziu-se 62,2% face a 2018, para mil milhões de euros, num ano em que a receita cresceu cerca do dobro da despesa. No entanto, o saldo seria agravado se fossem consideradas algumas operações, como por exemplo o pagamento do Fundo de Resolução (FdR) ao Novo Banco. Recorde-se que esta análise é em contabilidade pública, onde continuou a registar-se um défice, e não em contabilidade nacional, ótica usada em comparações internacionais em que houve um excedente orçamental.
A redução do défice em 1,7 mil milhões de euros “deveu-se, essencialmente, ao aumento da receita fiscal e ao aumento das contribuições para a SS e CGA, que excedeu o crescimento das pensões e outras prestações sociais em 202 milhões”, reitera a entidade. Mas o saldo “seria agravado em 2,4 mil milhões (para -3,4 mil milhões), se considerado um conjunto de operações de ativos e de passivos financeiros da AC suscetíveis de alterar o património financeiro líquido (e com impacto na dívida)”.
Nestas operações inclui-se a transferência do Fundo de Resolução ao Novo Banco (1.149 milhões de euros) e a amortização de empréstimos concedidos no âmbito da privatização do BPN (1.377 milhões), destaca o Tribunal de Contas.
Neste campo, o TdC nota ainda que, ao longo do ano, “as alterações orçamentais efetuadas pelo Governo aumentaram o défice previsto no Orçamento de Estado em 2,2 mil milhões”.
O Tribunal de Contas deixa ainda um alerta relativamente ao défice. A trajetória de recuperação do saldo orçamental “foi interrompida em 2020 pela crise económica decorrente da pandemia”, sendo que a “gravidade da situação e o elevado grau de incerteza” levaram à ativação da cláusula de derrogação do Pacto de Estabilidade e Crescimento, “permitindo um desvio temporário da trajetória”.
A Comissão Europeia prevê que o rácio da dívida pública em percentagem do PIB retome em 2021 a trajetória decrescente (130,3%), admite o TdC, mas o “indicador continua a exceder significativamente os 60% de referência”. Desta forma, continua a existir o alerta “para o nível elevado da dívida pública, devendo o Governo assegurar medidas orçamentais de apoio e estímulo à economia que preservem a sustentabilidade orçamental a médio prazo”.
TdC recomenda implementação da reforma das finanças públicas
Perante os vários reparos que o Tribunal de Contas fez aos documentos de contas do Estado, foram formuladas 43 recomendações. Entre elas encontra-se garantir “a reformulação do plano de implementação da Lei de Enquadramento Orçamental e a sua monitorização, o modelo de governação e os meios humanos e materiais necessários à sua consecução”.
Para além disso, o Tribunal aconselha a que o Estado promova a orçamentação por programas, bem como que considere, na revisão do classificador económico, “as operações realizadas por entidades públicas reclassificadas, os fluxos com o setor empresarial do Estado e os associados a ativos financeiros”.
O TdC quer também que o Estado garanta que a definição do quadro normativo da tesouraria do Estado “reforce o cumprimento do princípio da unidade de tesouraria”, bem como a atualização dos Programas de Gestão do Património Imobiliário e de Inventariação.
Quanto às notas feitas em pareceres anteriores, o TdC sublinha que foram total ou parcialmente acolhidas 37 recomendações formuladas em anos anteriores, ou seja quase dois terços do total, permanecendo por acolher 15 (26%).
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