Preço da energia ameaça “sustentabilidade a médio prazo” da Bondalti
A empresa química do grupo José de Mello, que tem sede em Oeiras e uma fábrica em Estarreja, admite reduzir os investimentos em Portugal devido à escalada dos custos energéticos, tal como a Navigator.
Depois de a Navigator admitir cortar investimentos em Portugal, é a vez da Bondalti avisar que a escalada dos preços da energia elétrica, que pesa cerca de 50% na estrutura de custos variáveis, já “está a ter impacto nas margens de operação e consequente rentabilidade, podendo colocar em causa futuros investimentos”. Em 2020, a empresa detida pelo grupo José de Mello investiu perto de 20 milhões de euros.
Em declarações ao ECO, o administrador executivo da antiga CUF, Luís Delgado, assume “muita preocupação” com os recordes que estão a ser registados no mercado grossista ibérico (Mibel). E vai mais longe, ao alertar mesmo que “se a situação não melhorar, [pode] colocar em causa a sustentabilidade da empresa a médio prazo”.
“Este aumento tem um impacto muito relevante na nossa competitividade. Mas não é só o preço de mercado que nos preocupa. Somos uma empresa exportadora — com integração numa parte relevante do nosso negócio com a Dow no Complexo Químico de Estarreja — e, por isso, competimos com empresas europeias. E nessa comparação do preço final de energia elétrica continuamos muito distantes e cada vez menos competitivos”, sustenta o líder da gigante portuguesa, que no ano passado teve lucros de 14,5 milhões de euros.
O gestor lembra que, além do custo de aquisição de energia, a Bondalti suporta em Portugal “uma sobrecarga de taxas muito elevada e consideravelmente superior”, calculando uma “diferença de entre mais 25% a 40% no custo final de energia elétrica” face a Espanha, Alemanha ou França, que já adotaram várias medidas de apoio que “permitem às indústrias eletrointensivas desses países manter uma posição competitiva forte”.
Luís Delgado adianta ao ECO que a empresa do setor químico, que tem sede em Oeiras e instalações industriais em Estarreja e na região espanhola da Cantábria – um investimento de 60 milhões de euros inaugurado em novembro de 2019 -, já está a procurar alternativas de médio e longo prazo para mitigar a evolução dos preços de mercado e garantir menor volatilidade dos custos energéticos. Espera ter novidades nas próximas semanas.
“Há mecanismos como os PPA (Power Purchase Agreement) ou o autoconsumo de proximidade e/ou remoto que estamos a analisar. A Bondalti tem um Programa de Transição Climática muito ambicioso [em] que um dos objetivos é ter 100% da energia elétrica consumida de fonte renovável até 2030. Mas para isto ser possível é fundamental que a política energética tenha em conta a ambição da indústria portuguesa e a sua competitividade. Como estamos, ainda sem visibilidade de como serão todas as medidas do governo e como estas serão implementadas, é muito difícil tomar decisões de investimento”, resumiu.
Bondalti foi a nova designação assumida em maio de 2018 para o negócio da indústria química do Grupo José de Mello, até então desenvolvido sob a insígnia da Companhia União Fabril (CUF), passando CUF a ser a marca da área da saúde.
Em setembro de 2020, o grupo adquiriu uma participação de 68,5% na Enkrott, que tem instalações industriais em Sintra e presença em Angola, concretizando assim a entrada na área da gestão e tratamento de águas residuais. Reforçada já em maio deste ano através da compra da espanhola Aguas Alfaro.
Quatro medidas reivindicadas ao Governo
O ministro Matos Fernandes garantiu esta terça-feira que as tarifas de acesso às redes terão uma redução de 30% para os consumidores industriais. Na semana passada, o Governo aprovou o mecanismo de compensação dos custos indiretos de CELE (Comércio Europeu de Licenças de Emissão), que prevê um total de 25 milhões de euros em apoios à indústria eletrointensiva, que vão beneficiar um universo estimado de 28 instalações. A Bondalti confirma que deve ser uma das abrangidas, embora não disponha ainda de detalhes sobre os critérios de aplicação do mecanismo nem do “real impacto no custo atual de energia” da empresa.
Já quanto ao fim do serviço de interruptibilidade, uma iniciativa comunitária que Portugal está a implementar, Luís Delgado acredita que o governo “tomará as medidas necessárias” para que as indústrias eletrointensivas não tenham esse impacto negativo nos custos. Porém, face à proximidade da data fixada para o término (31 de outubro), defende que “o serviço deveria ser prolongado” até à entrada em vigor dessas eventuais medidas compensatórias.
"Só com uma forte redução dos CIEG [Custos de Interesse Económico Geral] e de outras taxas é que será possível dinamizar projetos e mecanismos de acesso a energia de fonte renovável com custos competitivos.”
Além deste mecanismo de reserva com princípios semelhantes ao atual regime de interruptibilidade, da criação de um estatuto de consumidor eletrointensivo que permita “de forma clara” diferenciar positivamente as empresas que tenham este perfil, e da compensação pelos custos indiretos de CO2, a Bondalti e os outros membros da Associação Portuguesa dos Industriais Grandes Consumidores de Energia Elétrica (APIGCEE) pedem ao Executivo socialista reduções ou isenções nos chamados Custos de Interesse Económico Geral (CIEG).
O administrador executivo da Bondalti alega que “só com uma forte redução dos CIEG e de outras taxas é que será possível dinamizar projetos e mecanismos de acesso a energia de fonte renovável com custos competitivos e que possam reduzir os custos atuais de energia e [sejam] incentivadores de novos projetos”, dando o exemplo do hidrogénio verde.
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