Tribunal de Contas apela a melhor articulação entre ACT e Segurança Social na fiscalização do lay-off simplificado

O Tribunal de Contas volta a criticar a fiscalização do lay-off simplificado. Desta vez, sublinha que é preciso melhorar a articulação entre a ACT e a Segurança Social.

O Tribunal de Contas (TdC) avisa que é preciso melhorar a articulação entre o Instituto de Segurança Social e a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) na fiscalização do lay-off simplificado, de modo a evitar que os apoios que tenham sido pagos indevidamente às empresas se tornem irrecuperáveis.

Num relatório divulgado esta quarta-feira, o TdC começa por indicar que as ações de fiscalização a esta medida extraordinária, levadas a cabo pela ACT, abrangeram 3.074 entidades empregadoras (correspondente a 92.191 trabalhadores), tendo resultado em 675 processos contraordenacionais, 17 participações-crime e 182 participações ao Instituto de Segurança Social para eventual cessação e restituição dos apoios.

“Porém, concluiu-se que a articulação entre estas entidades carece de melhorias, uma vez que o tempo médio entre a data do auto de participação da ACT e a intervenção do Instituto de Segurança Social ascendeu a 109 dias“, lê-se no documento agora conhecido.

Ou seja, a Segurança Social levou, em média, mais de três meses e meio a traduzir em medidas práticas os alertas deixados pela Autoridade para as Condições do Trabalho, período que, salienta o TdC, “potencia o risco de irrecuperabilidade dos pagamentos efetuados“.

Além disso, o Tribunal de Contas identificou “discrepâncias quanto ao número das participações efetuadas pela ACT e as recebidas pelo Instituto da Segurança Social”, o que diz agora indiciar “falhas nos circuitos de comunicação e de registo da informação entre as duas entidades”. Por exemplo, das referidas 182 participações da ACT à Segurança Social, apenas foram efetivamente recebidas 79, que abrangem menos de metade dos trabalhadores do universo total. Dessas, 38 deram lugar à anulação do apoio.

Em resposta, a Segurança Social assegura que já estão em “curso diligências para normalizar os procedimentos de comunicação, registo e tratamento dessa informação nos respetivos serviços desconcentrados das duas entidades”.

Esta não é a primeira vez que o TdC critica a fiscalização do lay-off simplificado. Em fevereiro do ano passado, fê-lo num outro relatório sobre esta medida extraordinária salientando que o controlo deveria ter sido mais exigente. “O relaxar, por um lado, do nível de exigência dos controlos prévios em prol da celeridade na concessão do apoio é admissível, desde que seja assegurada, por outro lado, a implementação de outros controlos e verificações internas (ex-post) adaptados à configuração específica desta medida, o que não se demonstrou ter ainda existido”, reparou, nessa altura.

No relatório divulgado esta quarta-feira, o Tribunal de Contas volta a essa mesma questão e nota que, em setembro de 2020, face à necessidade de “acompanhamento específico ulterior mais exigente”, para mitigar o risco de erro e fraude, foi criada uma Equipa de Projeto para a Gestão de Risco (EPGR) no Instituto de Segurança Social.

“Porém, dos nove indicadores identificados relacionados com o lay-off simplificado, em março de 2021, a EPGR apenas se encontrava a trabalhar em um, no apuramento da ‘percentagem de trabalhadores com sobreposição de apoios extraordinários com ITPT [impedimentos temporários para o trabalho e pensões]’, dado os constrangimentos sentidos na disponibilização atempada de dados por parte de áreas fortemente adstritas à implementação de novas medidas”, sublinha o TdC, detalhando que, desse trabalho, resultou a identificação de mais de 22 mil situações potencialmente irregulares.

Já em contraditório, o Instituto de Segurança Social garante que, entretanto, “já foi possível a análise de outros indicadores constantes do Plano de Gestão de Risco para as medidas Covid-19″.

Não foi demonstrado que o menor nível de exigência dos controlos prévios (ex ante), em prol da celeridade na concessão do apoio, foi acompanhado pela implementação de outros controlos apropriados às características específicas da medida e das alterações que lhe foram sendo introduzidas”, insiste o Tribunal de Contas.

O TdC destaca que, em comparação, no Reino Unido foi “implementado um conjunto robusto de medidas orientadas para mitigar e detetar situações de erro e fraude” na atribuição do apoio equivalente ao lay-off simplificado, como a monitorização das transações bancárias, o cruzamento de dados para detetar eventuais incumprimentos e a publicação da lista de entidades empregadoras aderentes ao regime extraordinário em causa.

Por outro lado, o Tribunal de Contas reconhece que no apoio à retoma progressiva os controlos foram reforçados face ao que foi aplicado no lay-off simplificado.

“Constrangimentos” na operacionalização do lay-off simplificado

A auditoria feita pelo Tribunal de Contas ao lay-off simplificado concluiu também que a operacionalização desta medida extraordinária sofreu constrangimentos, que resultaram, por um lado, das sete alterações legislativas que ocorreram em apenas quatro meses (no início da pandemia) e, por outro, da não integração automática da informação recebida através da Segurança Social Direta no Sistema de Informação da Segurança Social, isto é, foi preciso “muito registo manual no processamento dos pedidos“.

De notar que o lay-off simplificado foi, inicialmente, criado por via de uma portaria, que gerou múltiplas dúvidas, tendo sido posteriormente revogada e substituída por um decreto-lei, que viria também a ser alvo de várias alterações e ajustes.

Apesar destes constrangimentos, o TdC reconhece que nem esses obstáculo nem a “natureza inesperada e de urgência” desta medida foi “impeditiva da sua execução atempada”, tendo exigido, contudo, o recurso a trabalho suplementar, particularmente entre março e junho de 2020.

“Foram realizadas, até dezembro de 2020, 19.572,5 horas de trabalho suplementar, com um custo total de 209.698,02 euros, não existindo, contudo, informação que permitia detalhar as horas e o custo imputável a cada uma das medidas, sendo certo que a medida lay-off simplificado, pela sua dimensão, foi uma das que mais recursos absorveu na sua operacionalização“, é explicado no relatório divulgado esta quarta-feira.

Ainda assim, o TdC aponta várias fragilidades na operacionalização do lay-off simplificado, incluindo a “inexistência de informação sobre a data de entrega dos pedidos, a omissão sobre os motivos, em 74% dos pedidos de adesão, bem como de informação relativa ao Código de Atividade Económica das entidades”.

Num quadro global, em 2020, o lay-off simplificado cobriu 27% da população empregada (cerca de 848 mil trabalhadores) e a mais de 100 mil entidades empregadoras, que atuam sobretudo no setor artístico e no setor do alojamento, restauração e similares (ambas atividades muito afetadas pela pandemia e pelas restrições a ela associadas). Foram gastos com esta medida extraordinária 758 milhões de euros, sendo que os pagamentos foram realizados, em média, a 42 dias após a data de início do apoio. “A maioria dos pedidos pagos tinha um valor inferior a mil euros, uma vez que foram sobretudo microempresas que aderiram ao apoio”, especifica o TdC.

Em comparação, o apoio à retoma progressiva chegou a 16 mil empregadores, cobrindo 133 mil trabalhadores e custando à Segurança Social 163 milhões de euros, entre agosto (mês em que foi lançado) e dezembro de 2020.

“Já em 2021, a despesa com o apoio à retoma até setembro totalizou 502,3 milhões de euros. Permitiu-se também a adesão ao lay-off simplificado para os casos de encerramento de atividades, com uma despesa de 366,9 milhões de euros. Ambos representaram cerca de 56% do total da despesa da Segurança Social com as medidas excecionais e temporárias relativas à pandemia”, acrescenta o Tribunal de Contas.

Tudo somado, o TdC deixa também uma série de recomendações. Por exemplo, à ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho, pede que promova a avaliação da eficácia da medida do lay-off simplificado, nas dimensões económico-sociais e nas Finanças Públicas. E à ACT e à Segurança Social, recomenda a fixação de “procedimentos de controlo nos circuitos de comunicação entre as duas entidades, de modo a assegurar a integridade da informação e a normalização dos procedimentos de comunicação, registo e tratamento dessa informação nos respetivos serviços desconcentrados”.

O lay-off simplificado permitiu aos empregadores em crise ou encerrados por imposição legal ou administrativa reduzirem os horários de trabalho ou suspenderem os contratos, recebendo da Segurança Social um apoio para o pagamento dos salários. Hoje, só as empresas confinadas têm acesso a esta medida.

Já o apoio à retoma progressiva continua disponível para qualquer empregador, desde que registe quebras de, pelo menos, 25%. Permite a redução dos horários de trabalho e garante um apoio para o pagamento dos salários.

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