Empresas familiares defendem meritocracia na escolha do CEO, segundo estudo da Arboris
Estudo mostra que 80% dos acionistas preferem um CEO com as melhores competências, 85% defende que controlo familiar assegura visão a longo prazo e que comunicação interna está na base dos problemas.
Os grupos empresariais de raiz familiar portugueses estão cada vez menos dinásticos e mais exigentes, são as conclusões do mais recente estudo da consultora Arboris, junto dos grupos familiares com um volume de negócios anual superior a 12 mil milhões de euros. Segundo o primeiro estudo da consultora sobre este ramo empresarial, 80% dos acionistas questionados apontaram que o CEO deve ser quem demonstrar melhores condições para desenvolver o negócio e criar valor, sendo membro da família ou não.
Esta conclusão vai de encontro com o mito de dinastia nas empresas familiares nacionais. No entanto, em circunstâncias de pé de igualdade, no que toca à qualidade dos candidatos, os inquiridos mostraram preferência pela gestão de um familiar. O questionário da Arboris contou com 42 respostas dentro de um universo de 30 grupos empresariais, mas o critério de escolha do CEO não foi o único aspeto a separar estes negócios dos restantes no tecido empresarial português.
Para João Rodrigues Pena, founder e managing partner da Arboris, “a realidade das empresas familiares é muito distinta, para melhor”, sendo que o gestor justifica a sua posição com base na bibliografia existente a nível mundial, e na sua experiência ao longo de décadas.
“Não há uma distinção entre aquilo que o estudo mostra e aquilo que a nossa experiência, e a experiência internacional de vários peritos e universidades, demonstra”, esclarece João Rodrigues Pena.
Menor pressão a curto prazo
Quais as vantagens competitivas a abranger as empresas familiares portuguesas? Para mais de 85% das personalidades inquiridas, líderes de grandes empresas, o controlo familiar oferece vantagens graças ao compromisso em assegurar uma visão de negócio consistente a longo prazo. Esta realidade, por sua vez, contrasta com as exigências e interferências de curto prazo das estruturas acionistas mais fragmentadas, sendo que na origem desta dualidade está a coexistência de objetivos e perspetivas, frequentemente, diferentes e heterogéneas.
Na opinião dos líderes questionados, existe uma forte coesão entre os acionistas dos seus grupos quanto à estratégia e governação da sociedade, um fator considerado essencial, pelos mesmos, para o crescimento e criação de valor dos negócios. A força do grupo advém da sua unidade, é esta a consciência presente no seio do núcleo acionista. Contudo, este alinhamento pode ser frágil. A Arboris identificou que em 53% dos grupos analisados, os valores e princípios dos mesmos não estão adequadamente assumidos pelos acionistas. Se por sua vez considerarmos a família no seu todo, esta falta de alinhamento é mais marcada, agravando o panorama.
Embora pareça paradoxal esta discrepância entre a forte coesão no seio do núcleo acionista, e o frágil alinhamento de valores e princípios junto dos mesmos, José Paulo Rodrigues, senior adviser e managing partner na Arboris, esclarece o porquê. No entender do sócio, “essa coesão é pragmática”, explica. “Não se vai pôr em causa os superiores interesses de negócio”, razão pela qual existe um “alinhamento a nível de objetivos”, no seio acionista, acrescenta.
Já na questão dos valores e dos princípios, este é um tema que “exige um processo de comunicação que não tende apenas para os objetivos pragmáticos do negócio”, continua José Paulo Rodrigues. O gestor assegura que esta comunicação se trata de um processo no qual “todos os acionistas têm de participar ativamente”, e no qual a nova geração também devia participar. “A comunhão de valores e princípios é tanto maior quanto maior for o número de pessoas próximas de todo este processo de proximidade ao negócio”, acrescenta.
De maneira a responder às preocupações quanto ao alinhamento de valores e princípios, a Arboris aconselha a elaboração de um Protocolo de Família, um documento oficial onde estes aspetos são formalizados e assumidos, com a assinatura de todos os membros. Desta forma, o documento não só promove a coesão do grupo como estabelece e garante o cumprimento de critérios, obrigações e deveres formais.
A eficiência da comunicação como fonte de problemas
A ausência desta comunicação pode ser atribuída, segundo a experiência da Arboris, a uma menor importância dada ao nível de intensidade da vivência entre acionistas e gestão executiva, bem como, em alguns casos, a uma transição geracional mal gerida. No caso de existirem fragilidades neste processo de comunicação, a erosão da coesão acionista é potenciada.
Neste sentido, de acordo com o estudo da Arboris, 56% dos líderes inquiridos reconhecem a existência de falhas de comunicação no seio do núcleo acionista. O facto de dois terços dos grupos inquiridos assumirem ter acionistas inativos poderá estar na origem deste problema. Para a consultora, a solução passa por integrar ou afastar definitivamente estes acionistas, visto que os mesmos, na experiência da Arboris, não participam em reuniões de qualidade com a gestão, e pouco ou nada contribuem para o futuro dos grupos.
José Paulo Rodrigues salienta que a qualidade da informação no seio acionista tem implicações na motivação e no incentivo dos próprios. Quando a qualidade da comunicação interna dos acionistas “não é a melhor”, isso pode gerar uma atitude mais passiva. “Há acionistas que, por diversos motivos, devem ser incentivados e motivados para terem, até às vezes, a própria capacidade técnica de reconhecerem a informação que lhes é enviada”, elucida o sócio.
Neste sentido, o acionista inativo pode gerar uma ameaça com duas frentes: podem colocar em causa a possível venda da sua parte a terceiros, caso os dividendos não lhes “agradem”; ou pode acabar por se centrar nas vantagens retiradas do grupo, no lugar do valor que o mesmo acrescenta. Porém, a falta de eficiência na comunicação nem sempre é acidental, e além de problemas na qualidade da comunicação, também pode haver dificuldades no acesso à mesma.
João Rodrigues Pena aponta para a existência de um desequilíbrio no acesso à informação: “Há grupos que consideram que existem acionistas não executivos com muito mais facilidade em falar com o CEO, um acionista executivo, do que outros”. Na opinião do gestor, isto é uma desvantagem, pois se “a informação é diferente, a comunicação não pode ser boa”. Rodrigues Pena admite ainda tratar-se de um problema mais comum do que se pensa: “É uma técnica de gestão do poder, por parte de quem tem a responsabilidade executiva, face àqueles que têm capacidade para fazer o escrutínio da gestão”.
O fator “legado”
João Rodrigues Pena destaca ainda o fator “legado” e a forma como este pode ser posto em causa. De uma forma geral, “nós deduzimos do inquérito que, os mais altos responsáveis acionistas destes grupos familiares, estão mais preocupados com o desempenho do negócio no curto prazo do que na construção de um bom legado”, esclarece o sócio.
Rodrigues Pena expõe que por falta de tempo, estes responsáveis não se dedicam à preparação adequada da próxima geração, seja ao “conhecê-la, orientá-la, persuadi-la” ou ao “fazê-la viver o grupo” através de estágios programados.
O fator “legado” e a importância das novas gerações nos grupos familiares atingem um patamar de tal forma relevante, que a Arboris vai, inclusive, lançar no futuro próximo dois novos questionários complementares. Um destes inquéritos será dedicado à gestão da geração vindoura, e outro irá incidir na gestão da base acionista.
Desta forma, a consultora garante fornecer uma visão “holística” da realidade dos grupos empresariais portugueses de raiz familiar; um universo correspondente a três quartos do tecido empresarial nacional, produtor de dois terços da riqueza anual do país, e detentor de metade do emprego a nível nacional.
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