“Há muitos imponderáveis” na evolução da inflação, diz Elisa Ferreira

  • Lusa
  • 13 Maio 2022

“Neste momento há uma gestão muito costeira, muito à vista, da situação da inflação", afirmou a comissária europeia.

A comissária europeia para a Coesão e Reformas, Elisa Ferreira, admitiu esta sexta-feira haver “muitos imponderáveis” na evolução da inflação, alguns dos quais estão “muito fora das possibilidades” de intervenção da agenda da Comissão Europeia.

“Neste momento há uma gestão muito costeira, muito à vista, da situação da inflação. Claro que nós esperamos que, com um bocadinho mais de tempo, as tendências inflacionistas acabem por ser contidas, é essa a nossa expectativa e a nossa previsão”, afirmou Elisa Ferreira durante um almoço organizado no Porto pela Câmara de Comércio Americana em Portugal (AmCham). A comissária portuguesa reconheceu, contudo, que “há muitos imponderáveis neste cenário”.

“E – admitiu – alguns desses imponderáveis estão mesmo muito fora daquilo que são as possibilidades da nossa agenda”. “Estamos todos um bocadinho a ver no que é que as coisas param, mas, claramente, é um assunto que nos preocupa a todos”, acrescentou.

Conforme recordou Elisa Ferreira, “quer a Comissão [Europeia], quer o Banco Central [Europeu] consideraram, numa primeira fase, que a inflação basicamente seria um ajustamento de preços, mais do que outra coisa, depois de um período em que ou a estabilidade ou a deflação estiveram a vigorar”.

Esperava-se então que, “a partir do momento do desconfinamento, haveria um impulso nos preços e seria o voltar à normalidade antes de 2019, antes da covid”. Contudo, lembrou, entretanto, surgiu “um outro elemento adicional, relativo à energia e aos produtos agrícolas, sendo que o primeiro impulso na energia começou a acontecer apenas com base nas expectativas, porque, de facto, ainda não tinha havido nenhuma alteração da oferta e da procura internacional de energia e já se sentia esta tensão nos preços”.

“Há várias tentativas que a Europa está a fazer [para tentar conter a subida dos preços da energia]. Uma delas é o REpowerEU, que é uma nova comunicação que vai tentar acelerar esta agenda toda de reconversão energética, com uma prioridade que já não é só ambiental e de conformidade com o planeta e de limitação de CO2, mas é também de aceleração de tudo aquilo o que possa ajudar os países a libertarem-se desta dependência russa”, referiu.

Paralelamente, enfatizou, “há outros elementos, também de mercado, que estão a ser reapreciados no sentido de conter esta tendência para a alta” dos preços da energia, como “no caso de Portugal e Espanha, que tiveram de libertar um pouco a relação entre a energia renovável do topo do custo das outras energias”.

“O grande ponto de interrogação é sobre os mercados de cereais, sobre os mercados de oleaginosas e sobre o efeito em cadeia e, também, a antecipação que muitas vezes acaba por gerar as expectativas inflacionárias na economia”, disse. Já no que respeita à área dos fundos estruturais, Elisa Ferreira referiu que, atualmente, estão a ser permitidas, “dentro de determinados limites, revisões dos preços naquilo que são financiamentos”.

“Dependendo do contrato que a empresa fez, se tem uma cláusula de revisão de preços ou de atualização de preços, os fundos estruturais acomodam-na. Se não tiver, é um assunto em que há um pedido de parecer, mas que pode, de facto, absorver e introduzir no financiamento de reembolso a fundo perdido alguma alta de preços, desde que seja justificada por valores efetivos de inflação, que pode ser em determinados segmentos da produção e não propriamente o IPC [Índice de Preços no Consumidor]”, explicou.

Elisa Ferreira defende urgência no estreitamento da relação da UE com os EUA

A comissária europeia defendeu ainda a “urgência” de um “estreitamento de relações” entre União Europeia e EUA para enfrentar crises como a do sistema financeiro, a pandemia e a guerra na Ucrânia. Há que convergir, há que criar alianças, até porque temos todos consciência de que a ordem mundial está alterada e as lógicas que estavam instaladas e que pareciam consolidadas, afinal, estão totalmente fragilizadas”, afirmou Elisa Ferreira.

Segundo salientou, “a guerra da Ucrânia veio alertar para a urgência da cooperação entre estas duas forças, que já antes cooperavam – já antes da crise do sistema financeiro internacional era óbvio que qualquer novo conjunto de regras que pudesse moderar os excessos da atividade financeira teria de ser criado e acordado dos dois lados do Atlântico – mas, neste momento em que há toda esta perturbação, mais do que nunca o estreitamento de relações é fundamental”.

“É fundamental estreitar a compatibilidade das regras, estreitar os laços de cooperação, estreitar, inclusivamente, as abordagens, nomeadamente no que diz respeito ao clima, à energia e ao nosso posicionamento estratégico no mundo”, sustentou, reiterando: “Tudo isto converge para que a Aliança Atlântica ganhe um outro significado e uma outra densidade que não tinha no passado”.

Notando que “a nova administração [norte-americana] também veio permitir um estreitamento desta relação, com muito mais estabilidade e previsibilidade”, a comissária europeia referiu que “a União Europeia, como era previsto, não é um projeto acabado, mas vai evoluindo”.

“A frase típica é ‘a Europa vai-se construindo à medida que responde às crises’. Tenho de confessar que, quando foi a crise financeira, muitos de nós questionávamos se esta lógica em que todos acreditávamos ia continuar a funcionar, porque demorou e houve ali momentos de grande perturbação, mas, felizmente, ela continuou a funcionar, funcionou para a crise covid e está a funcionar, até agora, para a Ucrânia”, disse.

Alertando que “os desafios são cada vez maiores”, Elisa Ferreira defendeu que, “cada vez mais, a Europa tem de se reconstruir e de se aprofundar”, mas tem de o fazer “em parceria com aqueles que, no mundo, podem ajudar a que um bloco que, no fundo, é relativamente pequeno (embora seja grande em termos dos seus princípios, da sua presença comercial no mundo e da sua influência), possa consolidar uma presença internacional na globalização que, neste momento, é mais necessária do que nunca”.

Questionada por um dos empresários presentes no almoço sobre o risco de redirecionamento futuro para a Europa de leste dos fundos europeus de que têm vindo a beneficiar os países do sul da Europa, como Portugal, dada a necessidade de reconstrução da Ucrânia e do apoio aos países vizinhos mais afetados, Elisa Ferreira defendeu que o objetivo de Portugal não pode nem deve ser “ter sempre fundos”.

O objetivo de Portugal não é ter sempre fundos. O objetivo de Portugal é não precisar de fundos, é ter uma dinâmica própria”, sustentou. “Não podemos estar aqui a discutir milhões, mas o que se faz com os milhões, como é que se faz, que empresas, que universidades e que centros é que vão utilizar isso para darem saltos e para acrescentarem valor”, acrescentou.

De acordo com a comissária europeia, “nesse contexto há já universidades e consórcios universidade/empresa que estão a receber apoio já não pelo [PT]2030, que é contratualizado com a União Europeia, mas que estão a ir à primeira liga do campeonato, isto é, ao [programa] Horizon e a projetos europeus e redes europeias”.

“E essas têm de ser valorizadas pela sociedade portuguesa, essas estão na primeira liga do campeonato, e há aqui muitas empresas que são líderes e que têm de entrar na primeira liga”, rematou.

(Artigo atualizado às 18h23)

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