Dos créditos fiscais aos fundos de reestruturação: a auditoria do Novobanco em 7 pontos

Dos créditos fiscais aos fundos de reestruturação, passando pela venda em Espanha e os grandes devedores, eis o relatório de 400 páginas da auditoria da Deloitte ao Novobanco resumido em sete pontos.

O Novobanco passou a avaliar os fundos de reestruturação “significativamente” abaixo das avaliações dos outros bancos que também participam nesses fundos, depois da reavaliação feita por um perito externo e que resultou perdas de mais de 300 milhões ao banco liderado por António Ramalho em 2020.

Esta é uma das conclusões do relatório de auditoria da Deloitte cuja versão rasurada foi tornada pública esta terça-feira. Mas há mais reparos da auditora ao banco, nomeadamente quanto à venda da sucursal espanhola, aos abates de créditos e à forma como procura bens de devedores em incumprimento. O fisco aprovou mais créditos fiscais no valor de 133 milhões. Veja o resumo da auditoria em sete pontos.

Fisco aprova mais 133 milhões em créditos fiscais

O Governo pediu um capítulo específico sobre os ativos por impostos diferidos e a Deloitte cumpriu o pedido, confirmando que a Novobanco vai receber 133 milhões por conta disto. “A 6 de janeiro de 2022, o banco recebeu o relatório de inspeção tributária referente ao período de tributação de 2018, tendo confirmado o valor do crédito tributário de 133 milhões de euros”.

Este montante — que já tinha sido adiantado pela deputada Mariana Mortágua no Parlamento — soma aos créditos fiscais de 381 milhões de euros que a Autoridade Tributária já aprovou relativamente a 2015, 2016 e 2017.

Foi através da conversão dos créditos fiscais relativos a 2015 que o Estado passou a deter uma participação direta no Novobanco no final do ano passado de 1,56%, diluindo a participação do Fundo de Resolução. De acordo com o banco, por conta dos ativos por impostos diferidos, o Estado poderá vir a assumir uma posição direta de quase 17%.

Novobanco quer Fundo de Resolução a pagar custos com auditorias

O Novobanco e o Fundo de Resolução têm várias disputas em tribunal por causa de pedidos de capital que o banco fez, mas que o fundo liderado por Máximo dos Santos recusou pagar. Uma das disputas tem por base estas auditorias especiais da Deloitte: a instituição financeira considera que as auditorias de 2018 e 2019 estão relacionadas com Mecanismo de Capital Contingente (CCA) e que o custo de sete milhões deve ser imputado ao Fundo de Resolução, que entende “que não são qualificáveis como perdas CCA”.

Fundos de reestruturação avaliados “significativamente” abaixo dos outros bancos

Em outubro de 2019, o banco contratou um perito externo para fazer uma avaliação completa dos seis fundos onde participa: Discovery Portugal Real Estate Fund, Fundo de Recuperação Turismo, Fundo Flit-PTREL, Fundo Aquarius, Fundo de Recuperação FCR ECS e Fundo de Reestruturação Oxy Capital.

A reavaliação dos fundos de reestruturação veio resultar em perdas de 313 milhões de euros em 2020, “resultantes essencialmente de um processo de reavaliação por entidade externa promovido pelo Novobanco, que resultou numa desvalorização média de cerca de 47% face ao Net Asset Value (NAV) apresentado nas contas dos referidos fundos”.

A Deloitte lembra que até 2019 o Novobanco valorizava a suas participações financeiras nos fundos com base no NAV divulgado pelas respetivas sociedades gestoras, que são supervisionados pelos reguladores e cujas contas são auditadas. “Os relatórios de auditoria dos fundos com referência a 31 de dezembro de 2020 não continham reservas”, enfatiza a Deloitte.

Contudo, mudou de política e, em resultado da reavaliação efetuada em 2020, “as cotações para estes fundos subjacentes ao valor de balanço registado pelo Novobanco em 31 de dezembro de 2020 eram em média significativamente inferiores às valorizações utilizadas por outras instituições financeiras portuguesas que participavam nos mesmos fundos.

Venda de Espanha sem “racional”

A venda da sucursal em Espanha é outro dos braços-de-ferro entre o Novobanco e o Fundo de Resolução, mas o valor reclamado é bem superior: o negócio gerou uma imparidade de 166 milhões de euros, levando o banco a pedir 147 milhões de euros ao abrigo do mecanismo de capital contingente.

A Deloitte diz que “não está documentado o racional para a decisão do conselho de administração de desinvestimento na sucursal do Novobanco em Espanha, incluindo a sua relação com o projeto de reestruturação da sucursal iniciado em 2019” – inicialmente, o banco ia reestruturar a unidade espanhola, mas mudou de ideias e decidiu alienar um negócio que só dava prejuízos e para se concentrar exclusivamente no mercado português.

Por outro lado, o banco antecipava que as perdas com a venda de Espanha iam ser “anuladas” com a libertação de capital que a operação ia permitir. Ou seja, era expectável que tudo ocorresse em 2020, mas não foi o que aconteceu: as perdas foram reconhecidas em 2020, mas a libertação de capital só aconteceu em 2021. O Fundo de Resolução entende que este desfasamento provocou um “aumento artificial nas necessidades de capital do banco em 2020”.

A comissão de acompanhamento do Novobanco está do lado do Fundo de Resolução, tendo observado que “a execução de boa-fé do CCA (…) poderia levar que o montante de imparidade de 166,0 milhões de euros constituída relativamente à descontinuação da operação do Novobanco em Espanha, fosse desconsiderado para o efeito da call de 2020”.

Abates no crédito sem justificação aparente

O Novobanco realizou abates parciais de dívida no valor de 155 milhões de euros em relação a três credores em 2020 para os quais a Deloitte não encontrou suporte ou suporte suficiente para justificar as decisões.

Destes abates, em relação a 77 milhões de euros não foram obtidos os suportes para o valor do abate parcial realizado, enquanto para os restantes 78 milhões de euros o suporte disponibilizado não era suficiente para evidenciar o racional subjacente ao cálculo do valor do abate parcial realizado.

O banco garante que, apesar de os abates ocorrerem “em casos em que não é economicamente viável a continuação de tentativas de recuperação, a generalidade dos créditos que são abatidos continuam a ser acompanhados internamente como créditos exigíveis, continuando a desenvolver esforços de recuperação”.

Limitações a pesquisar e executar bens dos devedores

“O processo de pesquisa do património dos devedores e avalistas apresenta limitações ao nível da sua abrangência e do seu timing de execução”, concluiu a Deloitte.

Deu o exemplo de um grande devedor que gerou perdas de 40 milhões de euros ao Novobanco em 2020. Para este cliente, o banco tinha uma estratégia assente na perspetiva de recuperação da dívida através da execução dos colaterais. Porém, “verificámos que a pesquisa de bens deste devedor e dos avalistas foi efetuada internamente pelo banco, circunscrita a ativos imobiliários localizados em Portugal”, isto apesar de a atividade económica deste devedor estar “concentrada fora de Portugal”.

Os auditores destacaram ainda que para 13 devedores da amostra, que provocaram perdas de 80 milhões, “não foram obtidas evidências do processo de pesquisa de ativos dos devedores e/ou avalistas”.

Banco implementou metade das medidas de correção das falhas

A Deloitte fez ainda um ponto de situação da implementação das 49 medidas que foram identificadas nas anteriores auditorias e identificou que apenas 27 delas estão concluídas e implementadas.

Entre as medidas em incumprimento, 12 apresentam atrasos na sua implementação face à data inicialmente definida e duas medidas encontram-se por iniciar. Quatro medidas dizem respeito a “processos de melhoria contínuos que se irão manter como foco de atuação do banco” e outras quatro estão em curso, acrescenta a Deloitte.

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