Regulador contra regulador. ERSE e AdC “pegam-se” por causa dos preços da botija do gás
Reguladores da energia e concorrência trocam “galhardetes” no dia em que entrou em vigor lei que fixa preços máximos do gás de botija. AdC alerta para riscos de limites aos preços da garrafa de gás.
No dia em que entrou em vigor a lei que fixa os preços máximos do gás de botija, a Autoridade da Concorrência (AdC) publicou um relatório em que alertou para os riscos de “controlos administrativos preços” criarem distorções do mercado, podendo conduzir à “escassez da oferta e a ruturas na cadeia de valor”. Se o timing deixava dúvidas, não terá deixado à ERSE que, mais tarde, divulgou uma nota a dar conta da existência problemas estruturais no mercado de gás engarrafado que justificam a fixação de valores máximos. Os dois reguladores estão pegados?
O contexto
O regulador liderado por Margarida Matos Rosa divulgou ao início da tarde desta terça-feira um “relatório sobre concorrência e poder de compra em tempos de inflação”.
A AdC publica regularmente estudos e relatórios sobre a concorrência no mercado e este era, aparentemente, mais um.
Contudo, foi publicado no dia em que o Governo voltou a fixar os preços máximos para o gás engarrafado, determinando, sob proposta da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), que uma garrafa de butano de 13 quilogramas (kg) terá como valor máximo 29,47 euros, enquanto as garrafas de 12,5 kg vão custar até 28,34 euros. E, no caso do GPL propano, o máximo varia entre 29,11 euros por garrafa de 11 kg, 23,81 euros por botija de nove quilogramas, 109,08 euros nas garrafas de 45 kg e de 84,84 euros nas de 35 kg.
Este facto também não terá passado despercebido ao regulador da energia, que, mais tarde, divulgou uma nota explicativa em jeito de “troca de galhardete”.
A posição da AdC em relação à fixação de preços no gás de botija foi conhecida logo em setembro. Num parecer, sobre a proposta que abria a possibilidade de fixação de margens máximas de comercialização para os combustíveis simples e GPL em garrafa, a Concorrência defendeu que se deveria “ponderar eventuais medidas alternativas passíveis de introduzir maior dinâmica concorrencial nos mercados em causa”.
“Destaca-se, a este respeito, a importância de assegurar um regime de acesso por terceiros às infraestruturas logísticas de forma efetiva e eficaz. Realça-se, ainda, no caso do GPL em garrafa, medidas de proteção de consumidores vulneráveis, como seja via tarifas solidárias”, recomendou.
O que disse agora AdC?
Entre outras observações, o relatório sobre concorrência e poder de compra em tempos de inflação apontou:
“Em tempos de inflação, existe uma maior propensão por parte dos governos para a implementação de controlos administrativos de preços. A este respeito, a AdC alerta para os riscos que tais medidas podem trazer para a concorrência, uma vez que os controlos de preços distorcem os sinais de preços no mercado e podem conduzir involuntariamente à escassez de oferta e a ruturas na cadeia de valor”.
Nesse sentido, a autoridade deixou vários avisos:
- Cada empresa deve fixar os seus preços e estratégias no mercado de modo autónomo (em relação aos seus concorrentes no mercado)
- Os potenciais riscos da imposição de um preço máximo em termos de impacto na concorrência devem ser avaliados, bem como a existência de políticas alternativas que possam alcançar o mesmo objetivo;
- As perturbações temporárias de cadeias de abastecimento ou qualquer forma de anúncio público de preços não devem ser utilizadas para disfarçar uma prática concertada.
O que respondeu a ERSE?
Entretanto, numa nota divulgada no seu site, com data de julho, a ERSE diz ter analisado o funcionamento do mercado do mercado do GPL embalado nas suas diversas perspetivas – grau de concentração dos mercados grossista e retalhista, correlação dos PVP médios nacionais às cotações dos mercados internacionais e a diversidade das ofertas praticadas pelos vários operadores – e concluiu que há “problemas estruturais” nesse mercado que justificam a fixação de preços máximos no gás de botija.
Segundo o regulador da energia, “o mercado nacional de GPL embalado assenta em elevados níveis de concentração dos mercados grossista e retalhista, desacoplamento dos PVP médios nacionais ao comportamento dos mercados internacionais, e alinhamento de ofertas comerciais entre os operadores dominantes do mercado”.
“Acresce o peso muito significativo e sistemático da componente do retalho na formação dos PVP, o qual se tem revelado particularmente alto desde abril, sem fatores conjunturais que justifiquem este comportamento”, concluiu a ERSE.
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