Exclusivo Prova dos 9. Costa ganha mesmo 7-0 ao FMI nas projeções económicas?

  • Joana Abrantes Gomes
  • 13 Outubro 2022

O primeiro-ministro diz que, nos seus anos à frente do Governo, está a ganhar "7-0" ao Fundo Monetário Internacional nas previsões para a economia portuguesa. Será mesmo verdade?

O ministro das Finanças, Fernando Medina, entregou a proposta do Orçamento do Estado para 2023 (OE2023) ao Parlamento na passada segunda-feira, 10 de outubro. No documento, o Governo liderado por António Costa prevê um crescimento da economia portuguesa de 1,3% para o próximo ano, apesar do cenário de grande incerteza espoletado, sobretudo, pela guerra na Ucrânia, que veio agravar a crise energética e aumentar o custo de vida.

Um dia depois, na terça-feira, o Fundo Monetário Internacional (FMI) atualizou as previsões económicas mundiais, mostrando-se mais pessimista do que o Executivo português quanto à evolução da economia nacional. A instituição liderada por Kristalina Georgieva prevê que o Produto Interno Bruto (PIB) cresça 0,7% em 2023, menos seis décimas face à estimativa do Governo — ainda assim, um desempenho superior aos 0,5% previstos pelo FMI para a Zona Euro.

Confrontado esta quarta-feira com a diferença entre as previsões do Executivo e as do FMI, o primeiro-ministro recorreu à ironia para responder aos jornalistas, dizendo mesmo que, nesse campeonato, os seus governos estão a ganhar sete a zero à organização internacional. Será mesmo assim?

O ministro das Finanças, Fernando Medina, entrega a proposta de Orçamento do Estado para 2023 ao presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva.EPA/ANTONIO COTRIM

A afirmação:

"É o oitavo orçamento que eu apresento e não me lembro de um único onde as previsões, designadamente do Fundo Monetário Internacional (FMI), não divirjam das previsões que nós apresentamos. Ao longo destes oito anos – não quero garantir, mas – devo dizer que para já estamos 7-0. Vamos ver este ano.”

António Costa

Primeiro-ministro

Os factos:

António Costa é primeiro-ministro desde novembro de 2015, portanto, para verificar quem vence o “campeonato das previsões”, é preciso olhar para as estimativas económicas desde 2016, ano para o qual o atual chefe de Governo teve de fazer o primeiro Orçamento do Estado.

A primeira previsão do PIB para 2016 surgiu antes da queda do Governo de coligação do PSD e CDS. No World Economic Outlook (WEO) de outubro de 2015, o FMI estimava um crescimento da economia portuguesa de 1,5%. Meses depois, já em 2016, o recém-empossado Executivo de António Costa estava mais otimista e previa que o PIB nacional cresceria 1,8% na proposta de Orçamento desse ano. Mais tarde, o primeiro-ministro acabaria por dizer, numa entrevista ao Público, que o crescimento ficaria apenas pouco acima de 1%.

Em abril de 2016, o FMI, na altura liderado por Christine Lagarde, revelava novas projeções económicas: o PIB português cresceria 1,4% nesse ano. Um novo relatório da instituição saiu em outubro, revendo em baixa as estimativas anteriores, para 1%. Dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) indicam que a economia nacional cresceu 2% no primeiro ano de Costa como chefe de Governo – ou seja, foi a primeira previsão do Governo, de 1,8%, a que mais se aproximou da realidade.

O Orçamento do Estado para 2017 estimava que a economia portuguesa crescesse 1,5% nesse ano, quatro décimas acima das previsões do FMI em outubro de 2016. Contudo, as projeções seguintes de ambas as partes relativamente ao desempenho do PIB nacional em 2017 foram sendo revistas em alta. Em abril, o Governo apontava para um crescimento de 1,8% no Programa de Estabilidade 2017-2021, menos 0,1 pontos percentuais (p.p.) face à previsão da instituição internacional nesse mesmo mês.

Já em outubro, quando foi apresentada a proposta de Orçamento para 2018, o Executivo projetava um crescimento económico de 2,6% em 2017, bastante superior à previsão que constava no Programa de Estabilidade, enquanto o relatório desse mês do FMI estimava que o PIB ia aumentar 2,5%. Apesar desta melhoria sucessiva das projeções, o crescimento da economia portuguesa em 2017 foi estimado em 3,5% pelo INE. Foi novamente o Governo que mais se aproximou, embora nove décimas distante.

Para 2018, as previsões de crescimento do Governo começaram por apontar para 1,9% no Programa de Estabilidade 2017-2021 (apresentado em abril de 2017), depois aumentaram para 2,2% no OE2018 (apresentado em outubro de 2017) e, por fim, para 2,3% no Programa de Estabilidade 2018-2022 (abril de 2018).

O Fundo Monetário Internacional, por seu lado, calculava uma melhoria do PIB português para o terceiro ano de Costa no Governo de 2% no relatório de outubro de 2017, projeção que foi revista em alta em abril de 2018, para 2,4%, e, seis meses depois, para 2,3%. De acordo com o INE, a economia portuguesa cresceu 2,4% em 2018. Neste ano, as previsões de abril do FMI acertaram.

Projetando, em abril de 2018, um crescimento de 2,3% para 2019, o Governo acabou por baixar uma décima as suas previsões para a economia portuguesa quando apresentou o Orçamento do Estado para o quarto ano de Costa como primeiro-ministro. Ao mesmo tempo, o FMI estimava que a economia crescesse 1,8% (no relatório de outubro de 2018), 1,7% (no relatório de abril de 2019) e 1,9% (no relatório de outubro de 2019). Porém, o PIB português cresceu 2,7% em 2019, segundo o gabinete nacional de estatística. Mais uma vez, foi o Executivo que mais se aproximou, com a previsão de 2,3%.

O ano de 2020 foi o primeiro do novo Executivo liderado por António Costa e, ao mesmo tempo, o ano em que o país foi atingido pela pandemia de Covid-19, que fez paralisar vários setores de atividade. A proposta de OE para esse ano, que o Governo apresentou ainda em 2019, previa um crescimento da economia menor que o dos anos anteriores, em 1,9%, enquanto o último WEO do FMI, pré-pandemia, apontava para uma melhoria de 1,6%.

Após a chegada da pandemia, as projeções para o desempenho da economia portuguesa em 2020 eram completamente diferentes: o Orçamento Suplementar do Governo previa um recuo de 6,9% do PIB; o FMI estimava uma queda de 8% no seu relatório de abril desse ano. Em outubro, as previsões eram ainda piores, já que a proposta de orçamento para 2021 e o relatório do FMI apontavam para quedas de 8,5% e 10%, respetivamente. A desaceleração foi má, mas não tanto quanto este último cálculo: a economia portuguesa caiu 8,4% em 2020. O Governo não acertou em cheio por uma décima.

No ano que se seguiu, 2021, a economia nacional iniciou uma trajetória de recuperação, ao crescer 4,9%, segundo os dados do INE. Ainda assim, o crescimento real do PIB em 2021 ficou um pouco distante da maioria das previsões. Dos 4,3% estimados pelo OE2020 Suplementar, a previsão do crescimento do PIB é revista em alta em 1,1 p.p. no OE2021 (5,4%), mas na proposta de Orçamento para 2022, António Costa reviu em baixa o ‘otimismo’ e passou a estimativa para 4,8%. As projeções da instituição internacional foram oscilando: 6,5% no relatório de outubro de 2020; 3,9% em abril de 2021; e, por fim, 4,4% em outubro de 2021.

Em outubro de 2021, o Parlamento chumbou a proposta de OE para 2022 e o país é obrigado a ir a eleições antecipadas no início deste ano. O Partido Socialista vence as legislativas com maioria absoluta e António Costa renova o mandato como primeiro-ministro. Em abril, já depois do início da guerra na Ucrânia, o Executivo entrega a proposta orçamental para 2022, na qual previa um crescimento da economia de 4,9% este ano, uma revisão em ligeira baixa (0,1 p.p.) face ao cenário macroeconómico apresentado no Programa de Estabilidade. Na proposta de Orçamento do Estado para 2023, a estimativa é ainda maior: 6,5%.

As previsões do FMI para o desempenho da economia portuguesa em 2022 começaram por ser melhores do que as do Governo – 5,1%, segundo o relatório de outubro de 2021, e 5,8%, nas estimativas de junho deste ano. No entanto, o cenário apontado pela instituição liderada agora por Kristalina Georgieva nas previsões apresentadas na terça-feira (6,2%) fica abaixo dos 6,5% inscritos pelo Governo no OE2023. Os mais recentes cálculos do volume do PIB divulgados pelo INE indicam um aumento de 7,1% em termos homólogos no segundo trimestre deste ano (11,8% entre janeiro e março).

Para o próximo ano, o oitavo de António Costa na chefia do Governo, a previsão do OE2023 aponta para um crescimento económico de 1,3%, enquanto o relatório desta terça-feira do FMI estima que o PIB português cresça 0,7% – quando, em junho, previa um desempenho de 1,9%.

Prova dos 9:

No geral, nem as previsões do Fundo Monetário Internacional, nem as dos Governos liderados por António Costa acertaram no crescimento real da economia portuguesa desde 2016. Mas, na maioria das vezes, foi o Governo quem mais se aproximou da realidade. Embora com mais revisões do que as realizadas pelo Fundo.

Só a instituição internacional com sede em Washington acertou uma vez: no relatório de abril de 2018, quando calculou um crescimento de 2,4% para esse ano — embora tenha revisto em baixa essa projeção e, nos seus dados, considere que o PIB nacional cresceu 2,8% em 2018, mais quatro décimas que o valor estimado pelo INE.

Ainda assim, uma vez mais, tendo em conta os dados do instituto estatístico, é possível concluir que foram as previsões do Governo que mais se aproximaram do crescimento real da economia portuguesa na maioria dos últimos sete anos, designadamente em 2016, 2017, 2019, 2020 e 2022 (de acordo com os dados disponíveis até à data).

Em 2021, as previsões mais próximas do crescimento de 4,9% divulgado pelo INE distam os mesmos 0,5 p.p. desse valor, visto que o Governo estimava uma melhoria de 5,4% no OE2021 (apresentado em outubro de 2020) e o FMI calculou que a economia cresceria 4,4% no seu relatório de outubro de 2021.

Quanto ao ano de 2018, quer o Executivo – no Programa de Estabilidade 2018-2022 apresentado em abril desse ano –, quer o FMI – no relatório de outubro de 2018 – avançaram projeções de 2,3%, menos 0,1 p.p. relativamente ao cálculo final do INE.

Em suma, as previsões do Governo ficaram mais próximas do crescimento efetivo do país. Visto serem apenas estimativas do crescimento económico com base na informação disponível a cada momento, a conclusão, na escala do ECO, é “Quase certo“, mas é excessivo dizer que António Costa ganhou mesmo sete a zero ao FMI.

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