Com juros a subir, empréstimos às empresas caem pela primeira vez desde 2019

Montante dos créditos recuou 0,1% em janeiro. Empresas recorrem menos ao crédito, dado o aumento das taxas de juro e a redução do investimento, face a uma maior incerteza, diz António Saraiva.

Os empréstimos contraídos pelas empresas têm vindo a abrandar já desde o início de 2021, mas em janeiro deste ano chegou mesmo a registar uma queda, de acordo com os dados divulgados pelo Banco de Portugal (BdP). Esta correção, que se traduz na primeira descida desde abril de 2019, ocorre após subidas sucessivas dos juros por parte do Banco Central Europeu, que “levam as empresas a terem mais cuidado antes de contraírem um empréstimo”, como salienta o presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP) ao ECO.

“No final de janeiro de 2023, o montante de empréstimos concedidos pelos bancos às empresas era de 74,8 mil milhões de euros, menos 0,5 mil milhões de euros do que no final de dezembro de 2022”, sinaliza o BdP. O crescimento destes créditos já tem vindo a desacelerar desde o início de 2021 e atingiu agora, em janeiro, uma taxa de crescimento de -0,1%, a primeira negativa em quase três anos.

Foi nas grandes e médias empresas e nos setores da eletricidade, gás e água e do alojamento e restauração que se sentiu a maior redução dos empréstimos. Por outro lado, “aceleraram os empréstimos concedidos às empresas das atividades imobiliárias”, indica o organismo liderado por Mário Centeno.

Isto acontece numa altura em que “a tendência de subia das taxas de juro leva as empresas a terem mais cuidado antes de contraírem um empréstimo”, como explica João Vieira Lopes, presidente da Confederação do CCP, ao ECO.

“Esta redução do stock de empréstimos concedidos pelos bancos às empresas reflete, por um lado, o facto de os bancos estarem a adotar critérios mais restritivos nos empréstimos concedidos às empresas e, do lado da procura, a um menor recurso ao crédito dado o aumento das taxas de juro e a redução do investimento, face a uma maior incerteza e à degradação das expectativas”, sublinha ao ECO o presidente da CIP.

“O aumento das taxas de juro, que ainda se irá agravar nos próximos meses, está a ter impacto na capacidade de financiamento das empresas e torna mais premente e mais exigente o desafio de reequilibrarem os seus balanços, para serem capazes de investir e melhorar a sua capacidade competitiva”, acrescenta o patrão dos patrões.

Viera Lopes, por seu turno, considera que “ninguém deixa de fazer investimentos por causa dos empréstimos bancários”, “mas, as empresas estão a reequacionar fazer empréstimos para tesouraria e estão a baixá-los progressivamente“, reconhece, acrescentando que “há muita gente a reduzir stocks“. “Apesar de algumas empresas terem aumentado stocks por causa da inflação, as taxas de juro mais elevadas levam as empresas a terem de fazer um equilíbrio entre as duas coisas por causa dos limites de endividamento”, indica o presidente da CCP.

Pode também estar em causa uma “mistura de efeitos” na explicação destes dados: por um lado o efeito estatístico e, por outro, o da subida das taxas de juro, aponta o economista Miguel St. Aubyn, ao ECO. “Houve uma forte aceleração da concessão de crédito às empresas desde o início de 2020 através das linhas Covid”, que tinham por objetivo ajudar as empresas a suportar os efeitos da pandemia e evitar que fechassem portas atirando milhares de pessoas para o desemprego.

“A tendência crescente não se poderia manter”, frisa o professor do ISEG. E quando é feita uma comparação homóloga de um período pós-pandemia com um o da pandemia, isso reflete abrandamentos significativos que chegam a terreno negativo como aconteceu em janeiro.

As empresas já antecipavam algum impacto do aumento dos custos de financiamento, num inquérito realizado pela AEP em janeiro para perceber as perspetivas para 2023. Neste inquérito, ao qual responderam 700 empresas, o “aumento dos custos de financiamento” é apontado como um dos fatores que mais vai afetar as empresas e a economia. Mesmo assim, “preveem que, até final de 2023, se verifique um desagravamento dos impactos negativos destes fatores”.

Questionados sobre os fatores e riscos relevantes para a evolução da atividade empresarial em 2023, várias empresas mencionaram a inflação e o aumento das taxas de juro.

O BCE tem vindo a subir as taxas de juro diretoras, tendo como objetivo controlar a inflação, o que acaba por colocar um travão aos empréstimos, que se tornam mais caros. A última subida das taxas foi em fevereiro, de 50 pontos base para 2,5%. O banco central já sinalizou também que em março haverá um novo aumento, ainda que seja incerta a dimensão deste.

O BdP divulgou também dados sobre os depósitos das empresas, que encolheram face a dezembro mas aumentaram em comparação com janeiro de 2022. “No final de janeiro de 2023, o stock de depósitos de empresas nos bancos residentes era de 65,9 mil milhões de euros, menos 1,4 mil milhões de euros do que em dezembro de 2022″, indica o organismo, sendo que o crescimento homólogo foi de 9,1%.

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