Escassez de talento afeta 84% dos empregadores nacionais
Portugal é o quarto país do mundo com maior dificuldade na contratação, apenas abaixo de Taiwan (90%), Alemanha (86%) e de Hong Kong (8%).
Apesar de um maior dinamismo nas perspetivas de contratação para o próximo trimestre, a escassez de talento mantém-se em níveis historicamente altos. Este ano, 62% dos empregadores portugueses admitem que estão com dificuldade em encontrar os candidatos com as competências desejadas, e 22% dizem mesmo sentir muita dificuldade. Apenas 12% referem não ter qualquer problema em encontrar o talento de que necessitam. Portugal (84%) é o quarto país do mundo com maior dificuldade na contratação, apenas abaixo de Taiwan (90%), Alemanha (86%) e de Hong Kong (85%), revelam os dados do estudo “Talent Shortage Survey 2023, realizado pelo ManpowerGroup, a que o ECO Pessoas teve acesso.
Um misto de desencontro de competências e de fraca atratividade das empresas nacionais pode estar na origem do problema.
“A escassez de talento está, por um lado, associada às alterações das necessidades do mercado, aceleradas pela pandemia e pela crescente transformação de atividades e modelos de consumo e de trabalho. Estas necessidades não encontram, hoje, respostas no conjunto de competências que oferecem as nossas bases de talento”, começa por dizer Rui Teixeira, country manager do ManpowerGroup Portugal.
Por outro lado, a globalização do mundo do trabalho faz com que o talento se movimente de forma mais fácil entre mercados. Assim, na aldeia global, o talento nacional, nomeadamente o mais jovem, encontra oportunidades de trabalho noutros países ou trabalha a partir de Portugal para organizações situadas noutros países. Esta dinâmica, na qual as fronteiras são cada vez mais ténues, tem vindo também a evidenciar o problema da escassez de talento, considera o responsável. E as empresas nacionais passam a competir pelo talento com empresas de outros mercados. Empresas essas que, muitas vezes, “em oferecem condições mais competitivas”.
Contudo, o efeito inverso também se observa. Este mercado global também está a abrir portas à atração de talento de outras geografias para Portugal, “nomeadamente de países onde a nossa proposta salarial é competitiva, e onde os profissionais poderão estar interessados em trabalhar para empresas portuguesas”. Sermos um país “aberto”, capaz de atrair profissionais “em modo remoto” ou por “via da imigração”, é, para Rui Teixeira, absolutamente fundamental.
Setores de Energia e Utilities e de Indústria Pesada e Materiais são os mais penalizados
Apesar de os empregadores dos nove setores nacionais analisados no estudo afirmarem ter dificuldade em encontrar as competências de que necessitam, é nos setores de Energia e Utilities e da Indústria Pesada e Materiais que o valor da escassez de talento é mais acentuado, com 89% das empresas de ambos os setores a revelarem dificuldades na contratação.
Segue-se o setor das Tecnologias da Informação (TI), com 87%, e o dos Bens e Serviços de Consumo — que contempla as atividades de Retalho, Distribuição, Hotelaria e Indústria de Bens de Consumo — e de Transportes, Logística e Automação, ambos com uma escassez de talento situada nos 86%.
Com valores menos acentuados, mas ainda assim elevados, surgem os setores da Saúde e Ciências da Vida (78%), Serviços de Comunicação, que incluem telecomunicações e media (74%) e, por último, Finanças e Imobiliário (70%).
Questionados sobre as competências técnicas que mais procuram, 30% dos empregadores portugueses colocaram as skills relacionadas com TI e Data no topo das suas necessidades, tendência que já se registava em 2022, mas que este ano cresce quatro pontos percentuais.
Logo a seguir, surge a necessidade de profissionais com competências em Operações e Logística, relatada por 23% dos empregadores inquiridos, e em Recursos Humanos, apontada por 21% das empresas. Competências de Engenharia (20%) e de Indústria e Produção (19%) estão também na mira dos recrutadores.
Já no que toca às competências humanas, os empregadores nacionais valorizam, sobretudo, a resiliência e a adaptabilidade (31%), seguidas da capacidade de iniciativa (30%), fiabilidade e autodisciplina (29%) e trabalho em equipa, colaboração e resolução de problemas (26%).
Em termos geográficos, é na Região Norte e Grande Porto que a escassez de talento se encontra nos níveis mais elevados, com valores a situarem-se nos 89% e 87%, respetivamente. A estes, segue-se a Região Centro e a Grande Lisboa, ambas com 83% dos seus empregadores a revelarem dificuldades na contratação de profissionais. Por fim, 81% das empresas da Região Sul assumem estes desafios.
76% dos empregadores planeiam apostar na formação
Enquanto o investimento na formação das equipas é a principal medida apontada pelos inquiridos na resposta à escassez de competências, a oferta de maior flexibilidade — sobre quando e onde o trabalho é realizado — é a estratégia mais aplicada para contornar as dificuldades na contratação.
Para responderem ao atual desencontro de competências, 76% dos empregadores planeiam investir na formação das suas equipas, 47% querem avançar com uma maior contratação de recursos permanentes e 27% pretendem apostar numa maior adoção de talento temporário.
Já face à dificuldade em atrair e contratar os profissionais, mais de metade dos empregadores (54%) afirma ter como principal prioridade oferecer maior flexibilidade horária e geográfica aos seus colaboradores. Mas não só. Cerca de 40% dos empregadores nacionais inquiridos admitem aumentar salários e 35% apostar na diversificação das suas bases de talento, recorrendo por exemplo a talento sénior.
Outras estratégias passam pela implementação de um bónus de integração na empresa (26%) e pela automatização de tarefas e processos de seleção (24%).
A solução, para o country manager do ManpowerGroup Portugal, deve passar por duas vias de atuação, que devem ser complementares. Por um lado, o profissional vê como fundamental que as empresas adotem medidas de curto e médio prazo, que tenham como objetivo trabalhar as competências dos seus profissionais hoje, e que promovam o seu upskilling e reskilling, capacitando-os para assumir novas funções.
“Ajudar as pessoas na sua qualificação e requalificação, facilitando o acesso às funções com maior procura, continua a ser o desafio decisivo que devemos superar neste momento, e em particular dada a oportunidade que os fundos do PRR podem trazer para acelerar este resultado. Tem de haver esforço conjunto entre empresas, escolas e entidades públicas como o IEFP, que permitam identificar as skills mais procuradas, e os perfis e skills adjacentes que poderão ser desenvolvidos, por forma a capacitar os trabalhadores para essas novas funções e dotá-los de uma maior empregabilidade atual e futura.”
É necessário trabalhar numa reformulação desses currículos, tendo em conta qual é a ambição de desenvolvimento do nosso país e das empresas, e quais são as competências que irão permitir-nos concretizar esse percurso. Devemos alcançar um maior alinhamento e integração entre universidades, escolas profissionais e empresas e entidades públicas e do governo, de modo a desenvolver nas gerações mais novas as competências que serão necessárias no futuro.
Por outro lado, é preciso adotar uma perspetiva para a resolução deste problema mais a longo prazo, tratando questões estruturais ao nível da formação e dos currículos académicos. “É necessário trabalhar numa reformulação desses currículos, tendo em conta qual é a ambição de desenvolvimento do nosso país e das empresas, e quais são as competências que irão permitir-nos concretizar esse percurso. Devemos alcançar um maior alinhamento e integração entre universidades, escolas profissionais e empresas e entidades públicas e do governo, de modo a desenvolver nas gerações mais novas as competências que serão necessárias no futuro”, refere.
“Claramente o desenvolvimento de programas nas áreas de STEM e áreas científicas é claramente uma necessidade, mas novas funções poderão exigir outro set de competências, pelo que deverá haver uma monitorização constante das tendências e a procura de uma maior velocidade de resposta, já que a criação de talento exige tempo e a velocidade de transformação é cada vez mais acelerada”, conclui Rui Teixeira.
O estudo do ManpowerGroup entrevistou mais de 38.000 empregadores em 41 países e territórios.
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