“Apenas 6% das culturas agrícolas estão cobertas por seguros”

Apesar dos prémios bonificados e de um resseguro por parte do Estado, os agricultores continuam longe de aproveitar os seguros de colheitas e as seguradoras continuam com pouco apetite por este risco.

O ministério da Agricultura acaba de atualizar as tabelas de preços de referência e de produtividades de referência a aplicar no âmbito do sistema de Seguros de Colheitas Agrícolas para 2023. Estes seguros são apoiados pela União Europeia através de um subsídio aos prémios atribuídos aos agricultores que, por outra via, tem uma garantia opcional de o Estado funcionar como ressegurador das companhias que exploram este ramo dos seguros agrícola.

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Filipe Charters de Azevedo da Safe-Crop.Hugo Amaral/ECO

As seguradoras interessadas não são muitas. Tranquilidade, Fidelidade e CA Seguros repartiram quase todo o mercado que valeu em prémios cerca de 28 milhões de euros em 2022. No ano passado também começaram a entrar neste ramo a Caravela e a UNA. No lado dos corretores destacou-se a corretora Atlas, agência subscritora de especilaização agrícola liderada por Frederico Bernardino, que estabeleceu parceria com a seguradora japonesa Sompo International e a sua plataforma AgriSompo. Ainda participante tradicional é a Cegrel de Miguel Fino e do Grupo Villas Boas e, mais recentemente, a Safe-Crop de Filipe Charters de Azevedo.

Os valores a segurar por cada exploração começam nas tabelas de referência publicadas pelo Gabinete de Planeamento, Políticas e Administração Geral (GPP) do Ministério da Agricultura e Alimentação (MAA). Para as campanhas de 2023 foram agora publicadas e multiplicando a produtividade por hectare de cada cultura estimada pelo preço de referência, pode calcular-se os capitais a segurar por cada cada cultura em determinada área existindo ainda 5 divisões geográficas do país, com diferentes riscos e tarifas.

Os riscos mais frequentemente cobertos são os causados por fenómenos extremos de granizo, geada, queda de neve, incêndio, queda raio, tromba d’agua e tornado. Segundo dados do IFAP, em 2021 os agricultores portugueses colocaram no seguro produções no valor de 364 milhões de euros e pagaram 22,5 milhões em prémios tendo recebido uma bonificação subsidiada pela União Europeia de 12,89 milhões.

Por concelho e por cultura estes foram 20 casos mais significativos em Portugal continental, sendo a maior preocupação e volume as culturas de Tomate para a Indústria, Arroz e Olival.

No entanto, para as seguradoras o seguro agrícola é sempre fonte de prejuízo. No ano passado os custos com sinistros foram de 28,16 milhões de euros, semelhantes aos prémios recebidos. Para calcular o resultado técnico falta adicionar os custos de funcionamento, resultantes das comissões pagas à mediação agrícola e aos peritos de sinistros com trabalhos especialmente onerosos pelas características particulares do setor agrícola.

Para que se mantivessem seguradoras a conseguir prestar serviços aos agricultores, o Estado criou há décadas o mecanismo de compensação de sinistralidade que tem como objetivo atribuir a empresas de seguros uma compensação financeira quando a sinistralidade atinge uma determinado valor. Depois de muita evolução, este mecanismo que no caso das empresas de resseguro se apelida de stop loss, estabelece que o Estado compensa as seguradoras quando o valor dos sinistros de seguros de colheitas for de 150% o valor dos prémios em algumas regiões do continente e de 85% noutras regiões.

O mecanismo de compensação de sinistralidade esteve para terminar em 2019 mas agora foi de novo estendido até dezembro de 2024. Filipe Charters de Azevedo não o tem utilizado, afirma que “no nosso caso, somos uma agência de subscrição e vendemos seguros com a Caravela. Abdicamos de qualquer resseguro do Estado o que nos permite uma maior autonomia para criar produtos sem apoio do Estado e, ao mesmo tempo, de sermos mais prudentes na venda

O gestor reforça a sua ideia: “o governo compreendeu que este resseguro promove alguma reação adversa”, acrescentando que “o resseguro deveria terminar, e deveria ser flexibilizada a apólice uniforme que está subjacente ao seguro de colheitas”. Para Filipe Azevedo, “com o resseguro do Estado há uma maior necessidade de controlar o risco – afinal é o Estado que paga – mas esta necessidade leva a um produto pouco flexível no que diz respeito a franquias, definição de sinistro, e demais detalhes. No final ficamos com um produto com, por vezes, pouca adesão ao mercado”.

Talvez por isso, Filipe Charters de Azevedo, estima um enorme insurance gap, a diferença entre capitais seguráveis e os efetivamente seguros: “Apenas 6% das culturas agrícolas estão devidamente seguradas”, diz.

Para o gerente da Safe-Crop, a liberalização deve ser o caminho: “No caso dos preços, o valor de compensação por quilo perdido, é também tabelado. Esse valor não inclui diferentes variedades ou qualidade do bem. Os produtos biológicos, por exemplo, são vendidos a um preço mais caro, mas nestas tabelas têm o mesmo preço. Podemos usar os valores contratados com a indústria, mas Portugal não tem essa tradição de preço garantido”, adiantando que “para resolver estes casos, poderíamos assumir bandas de variação em torno dos valores de tabela, por exemplo. Há mais detalhes que requerem uma revisão dos seguros de colheitas”, conclui Filipe Azevedo.

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