“É melhor resolvermos isto a bem”. Ex-adjunto de Galamba denuncia coação do SIS

Frederico Pinheiro relatou na comissão parlamentar de inquérito o contacto de um agente do SIS para a entrega do computador.

Frederico Pinheiro, antigo adjunto do gabinete do Ministro das Infraestruturas, afirmou na comissão parlamentar de inquérito à TAP que um agente do SIS lhe disse várias vezes que “o melhor é resolvermos isto a bem, senão tudo se pode complicar”, quando o contactou para devolver o computador de trabalho. “Objetivo não era salvaguarda da informação mas ameaça a um cidadão sem qualquer poder político”, afirmou.

Frederico Pinheiro recusou que tenha furtado o seu computador de trabalho, recuperado posteriormente pelos Serviços de Informação e Segurança (SIS), que diz que o intimidou. “Fui ameaçado pelo SIS”, afirmou aos deputados.

O ex-adjunto relatou que após ter recebido o telefonema do ministro a demiti-lo e ter ido buscar o computador de trabalho, no dia 26 de abril, enviou um email aos serviços informáticos, com conhecimento do ministro e da chefe de gabinete, Eugénia Correia, às 23h02 a disponibilizar-se para entregar o computador e o telemóvel de serviço.

Poucos minutos depois recebeu o contacto de um número desconhecido, com o interlocutor a identificar-se como sendo um agente do SIS, que lhe estava a ligar para a devolução do computador.

A minha primeira reação foi de choque e incredulidade. Nunca imaginei ser contactado pelo SIS”, afirmou aos deputados. Para confirmar que se travava de um agente do SIS, ligou para aquele serviço a dar uma palavra código, pedindo que o agente lhe ligasse depois indicando a mesma senha, o que aconteceu. Eram já 23h39 minutos.

Frederico Pinheiro referiu que tem juristas na família e que disse ao agente que estava a “extravasar os seus poderes”. Este respondeu-lhe que “estava a ser muito pressionado por cima” e que “o melhor é resolvermos isto a bem, senão tudo se pode complicar”. “Esta ameaça é repetida por mais duas vezes”, relatou.

O ex-adjunto diz que pediu ao agente um comprovativo de entrega do computador, que este rejeitou, dizendo-lhe que “nunca mais veria o computador”. Pediu para que na entrega fosse acompanhado por uma familiar que é procuradora-geral adjunto. O agente acusou-o de “estar a escalar” e rejeitou essa possibilidade.

O computador acabou por ser entregue apenas por Frederico Pinheiro, pela meia-noite, na rua em que mora. Relatou que se cumprimentaram, passou o aparelho e o agente disse-lhe que “o assunto morria ali”. Por determinação do presidente da comissão de inquérito, Lacerda Sales, o ex-adjunto não pôde identificar o agente.

“Esta ativação de meios do Estado, como o SIS ou a PJ foi desnecessária, desproporcionada e acima de tudo ineficaz porque se a preocupação eram os documentos era ineficaz se eu tivesse intenção de os revelar”, apontou. Na sua intervenção inicial, o antigo jornalista da Antena 1, afirmou que apagou do computador todos os documentos confidenciais e lembrou a disponibilidade para entregar o telemóvel de serviço, que até agora não lhe foi pedido.

“Nunca foi pedida devolução do telemóvel que me disponibilizei para entregar. Foi dirigido unicamente para o computador. Porquê Porque era no computador que guardava todas as notas do Governo. Objetivo não era salvaguarda da informação mas ameaça a um cidadão sem qualquer poder político”. “Continuo à espera de agendamento para entregar este mini-computador”.

O ex-adjunto relatou ainda o encontro com a Polícia Judiciária no dia seguinte. “Foi um contacto cordial. Solicito ao agente para levar os meus filhos à escola. Sou depois contactado por dois agentes e falamos no pátio das traseiras numa área comum. Na interação recordo a surpresa dos agentes da Polícia Judiciária quando disse que entreguei o computador ao SIS“. Desde então nunca mais foi contactado pela PJ.

Frederico Pinheiro esteve no epicentro da polémica sobre a entrega à CPI das notas tiradas por si durante uma reunião de preparação da ex-CEO da TAP antes de uma audição na Comissão de Economia do Parlamento, em janeiro, onde participaram deputados do PS e outros elementos do ministério das Infraestruturas. A que se somou o alegado roubo de um computador do ministério, após a sua exoneração, recuperado depois pelo SIS.

O antigo adjunto e o ministro João Galamba deram versões contraditórias sobre o caso. Frederico Pinheiro disse que referiu numa reunião no gabinete de Eugénia Correia, chefe de gabinete do ministro, a existência das notas mas que foi considerado que sendo as mesmas informais não haveria necessidade de as entregar à comissão parlamentar. Depois de ser levantada a possibilidade de ser chamado à CPI, Frederico Pinheiro quis entregar as notas, alegando que o gabinete de João Galamba se preparava para as ocultar dos deputados, dizendo que as mesmas não existiam.

A versão do ministro é bem diferente. João Galamba convocou uma conferência de imprensa onde disse que o adjunto negou “repetidamente” a existência das notas, só revelando a sua existência a 24 de abril, levando o seu gabinete a levar a cabo vários esforços para que Frederico Pinheiro entregasse as notas, de forma a que as mesmas fossem remetidas à CPI, o que levou mesmo a um pedido de adiamento no prazo de entrega da informação pedida. O Correio da Manhã noticia esta quarta-feira que as notas nunca foram remetidas à comissão.

Na sequência destes acontecimentos, o adjunto seria exonerado pelo ministro das Infraestruturas, por “comportamentos incompatíveis com deveres e responsabilidades inerentes ao exercício de funções de adjunto de um gabinete ministerial”. A informação da sua saída foi comunicada a Frederico Pinheiro a 26 de abril, o que o levou a dirigir-se ao ministério para recuperar o seu computador, com elementos do gabinete a tentarem impedi-lo, incluindo o fecho das portas do edifício.

Frederico Pinheiro terá alegadamente recorrido a agressões para levar o computador, que continha informação classificada, e chamado a polícia para conseguir sair do ministério. O computador seria mais tarde recuperado pelo Serviço de Informações de Segurança (SIS), cuja intervenção também suscitou polémica, ao ser considerada desproporcionada ou mesmo ilegal.

O ex-adjunto, que fez parte do gabinete do anterior ministro, Pedro Nuno Santos, revelou ainda que João Galamba reuniu com a ex-CEO da TAP antes mesmo da reunião preparatória com o grupo Parlamentar do PS, tendo informado Christine Ourmières-Widener da mesma. João Galamba dissera sempre que a iniciativa de participar no encontro preparatório foi da presidente executiva da companhia aérea.

O já chamado “Galamgate” levou mesmo o ministro a apresentar a demissão, “em prol da necessária estabilidade institucional”, mas a mesma foi rejeitada pelo primeiro-ministro, decisão que mereceu a discordância do Presidente da República.

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