Os dez pontos essenciais do decreto de privatização da TAP

O texto do diploma ainda não é conhecido, mas ficaram a conhecer-se as principais linhas com que se vai coser a operação. Saiba quais são.

Cumprindo o prometido pelo primeiro-ministro, o Governo aprovou o decreto-lei de reprivatização da TAP, ainda que com António Costa em Roma, numa visita ao Vaticano. O texto do diploma ainda não é conhecido, mas ficaram a conhecer-se as linhas mestras da operação.

“A mensagem é muito simples: a privatização da TAP é para servir melhor o país e a economia nacional”, afirmou o ministro das Finanças na conferência de imprensa que se seguiu à reunião do Executivo desta quinta-feira. Eis como o Governo acredita que chega lá.

1. Mais de 51% do capital e 5% para trabalhadores

O decreto-lei de reprivatização prevê a venda de uma participação maioritária da TAP, o que já foi contestado por partidos políticos e sindicatos. Serão alienadas ações representativas de, pelo menos, 51% do capital. A percentagem exata poderá só ser conhecida no final do processo, quando for anunciado o vencedor.

“Não está definido ainda hoje se será 51%, se será 60%, 80% ou 100% como admitiu o senhor primeiro-ministro. Será definido numa fase posterior e conforme decorra a privatização”, disse Fernando Medina. A percentagem terá de “assegurar que temos segurança no cumprimento dos objetivos estratégicos”.

Não está definido ainda hoje se será 51%, se será 60%, 80% ou 100% como admitiu o senhor primeiro-ministro. Será definido numa fase posterior e conforme decorra a privatização.

Fernando Medina

Ministro das Infraestruturas e da Habitação

“Pode haver situações em que isso imponha um determinado valor de participação social” para o Estado. Pode haver situações em que esse valor seja diminuído e se imponham outros instrumentos legais e contratuais”, referiu o ministro das Finanças. Instrumentos que visam garantir que os objetivos estratégicos são cumpridos.

O diploma contempla ainda a venda de 5% do capital a trabalhadores da TAP (uma imposição da lei), tal como aconteceu na privatização de 2015.

2. Investidores da indústria e com escala

O decreto-lei vai balizar o tipo de candidatos que podem concorrer à privatização. “Queremos investidores de escala no setor aeronáutico que deem prova da sua idoneidade, da sua dimensão e dos meios financeiros para a aquisição”, sublinhou Fernando Medina.

“Esta definição identifica também o que não queremos. Nós não pretendemos atrair investidores financeiros puros que venham a entrar na TAP para posteriormente a alienar ou alienar partes – e retirar o contributo estratégico para o país”, acrescentou na conferência de imprensa.

O que baliza os interessados a grandes companhias aéreas, sozinhas ou à frente de um consórcio. A entrada de um grupo de investidores privados portugueses na corrida fica afastada, a menos que entreguem um grupo com uma empresa de aviação europeia. A legislação comunitária impede que as transportadoras da UE sejam detidas maioritariamente por acionistas de fora do bloco.

3. Preservação do hub em Lisboa e crescimento dos outros aeroportos

A operação terá de cumprir cinco objetivos estratégicos, que servirão também de base à avaliação das propostas dos interessados. Além do “crescimento da TAP”, o plano estratégico a apresentar pelo comprador tem de assegurar o “crescimento do hub nacional”, isto é, do aeroporto de Lisboa como centro de operações e conectividade.

“A valorização e desenvolvimento do hub em Lisboa é um elemento fundamental de avaliação das propostas”, vincou o ministro das Finanças. A proteção do hub pode suscitar reservas da Comissão Europeia, por violar as regras da concorrência. Fernando Medina garantiu que a redação escolhida pelo Governo não viola as regras comunitárias.

Olhando para as operações realizadas, todas salvaguardaram o hub nacional porque é um ativo. Nós temos de facto um grande ativo. É o local mais competitivo e com menos emissões para voar para a América do Sul.

João Galamba

Ministro das Infraestruturas

O ministro das Infraestruturas salientou que em outros casos de consolidação na Europa também esta questão foi assegurada. “Olhando para as operações realizadas, todas salvaguardaram o hub nacional porque é um ativo. Nós temos de facto um grande ativo. É o local mais competitivo e com menos emissões para voar para a América do Sul”, sublinhou João Galamba.

O comprador terá ainda de aportar soluções que valorizem os restantes infraestruturas aeroportuárias. Um dos objetivos é “assegurar o crescimento das operações ponto a ponto que aproveitem a capacidade não aproveitada nos aeroportos nacionais, com destaque para o aeroporto do Porto“.

4. Mais investimento e emprego

“Assegurar o investimento e emprego em atividade de alto valor no setor da aviação”. É outro dos objetivos que será valorizado. O Governo quer que o novo investidor possa trazer para Portugal operações que estejam dentro do grupo adquirente. Deu como exemplo a manutenção e engenharia, uma valência que existe na TAP.

5. O perímetro de privatização

A TAP SA, dona da companhia aérea, é o principal objeto da privatização. Mas o perímetro de ativos não fica por aqui. A Portugália também fará parte do pacote, como avançou o ECO, e será entretanto integrada na TAP SA. Acresce ainda a Unidade de Cuidados de Saúde e a Cateringpor, esta última “com obrigação depois de alienação”, explicou Fernando Medina.

Todos estes ativos estão atualmente na TAP SGPS, que deixou de ter participação da companhia aérea. Não transitam para a SA a posição de 49,9% na Groundforce nem a Manutenção e Engenharia Brasil, que está em liquidação.

6. O preço importa, mas não é tudo

Foi o último critério a ser referido, mas nem por isso é menos importante, garantiu o ministro das Finanças. “A mensagem é muito simples: privatização da TAP é para servir melhor o país e a economia nacional. Não vamos privatizar a TAP ao maior valor de qualquer investidor. Temos de assegurar que os objetivos estratégicos que definimos são atingidos”, disse Fernando Medina.

Não vamos privatizar a TAP ao maior valor de qualquer investidor. Temos de assegurar que os objetivos estratégicos que definimos são atingidos.

Fernando Medina

Ministro das Finanças

As avaliações finais da EY e do Banco Finantia já foram entregues, disse o governante, recusando-se a divulgar os valores. “O valor de uma companhia aérea resulta de uma avaliação meramente contabilística de uma empresa e sobretudo do valor que o adquirente valoriza a empresa, no que ela seja complementar da sua atividade e potencie o valor do grupo”, disse Medina, desvalorizando as avaliações.

7. Como assegura o Estado que o comprador cumpre?

Com a maioria do capital da TAP, o futuro comprador terá o controlo da gestão da companhia. Como se garante que cumprirá os requisitos da privatização? Fernando Medina assegura que “há uma multiplicidade de instrumentos que podem ser usados para preservar os valores pelos quais esta privatização se está a orientar“.

“O Governo tem rios instrumentos que vão desde a manutenção de uma participação de capital, a manutenção de uma participação de capital com direitos especiais relativamente a determinadas áreas e matérias de intervenção. Há mecanismos de base contratual que atribuam ao Estado português um papel e uma palavra relativamente a aspetos da vida da companhia. Há acordos parassociais que venham a ser assinados com acionistas”, enumerou.

8. As reações dos interessados

A venda do capital da TAP atraiu a atenção de três pesos pesados da indústria da aviação europeia, que estavam à espera do decreto-lei de reprivatização para assumir de forma mais veemente que estão na corrida.

“Em regra, o Grupo Lufthansa procura sempre ter um papel ativo na consolidação do mercado. É por isso que a venda planeada de uma participação na TAP é interessante para nós“, afirma o grupo numa resposta enviada ao ECO esta quinta-feira, onde assume pela primeira vez que pretende disputar a compra da operadora portuguesa. “O Grupo Lufthansa e a TAP complementam-se muito bem, especialmente com a rede de rotas da TAP de e para a América do Sul”, acrescenta a companhia alemã.

Em regra, o Grupo Lufthansa procura sempre ter um papel ativo na consolidação do mercado. É por isso que a venda planeada de uma participação na TAP é interessante para nós.

Lufthansa

“Temos agora um conhecimento mais aprofundado das expectativas e condições colocadas pelo Executivo português e reiteramos o nosso forte interesse na privatização da TAP”, sublinhou, por sua vez, a Air France-KLM.

Na corrida está também o grupo IAG, dono da Iberia, British Airways ou Aer Lingus. “Queremos ver as condições da participação na privatização da TAP. Acredito que pode ser interessante para nós”, disse também Luis Gallego, CEO do IAG, na sua intervenção no World Aviation Festival, esta quarta-feira, em Lisboa.

9. Porquê privatizar agora

Sindicatos e partidos têm criticado a pressa do Governo em privatizar uma empresa que vai dar lucros pelo segundo ano consecutivo. O ministro das Infraestruturas apontou que há na Europa “uma grande procura por processos de consolidação”. Falou também em “outros acontecimentos no setor da aviação que justificam a clareza de parceiros estratégicos agora e não no futuro”, nomeadamente decisões de investimento e crescimento da empresa que fazem sentido avançar agora”.

João Galamba destacou também os resultados positivos alcançados pela TAP, “bastante acima do Plano de Reestruturação e muito acima de algumas companhias da Europa”.

10. Próximos passos

Aprovado o decreto-lei, que ainda tem de ser promulgado pelo Presidente da República, irá iniciar-se o processo de contratação pela Parpública dos consultores estratégicos, financeiros e jurídicos que vão assessorar o Estado a operação. São eles que vão apoiar o Governo no processo de consulta ao mercado e diálogo com potenciais investidores.

Entre o “final do ano e o princípio do próximo” está previsto levar a Conselho de Ministros o caderno de encargos que “definirá de forma mais fina a ponderação dos fatores estratégicos que o governo definiu como prioritários”.

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