Galamba reúne hoje com Ana Figueiredo para medir “compromisso” da Altice com o país

Ministro recebe Ana Figueiredo para discutir temas do setor e avaliar o grau de "compromisso" da Altice com o país, numa altura em que podem entrar novos investidores no grupo.

João Galamba recebe esta segunda-feira a CEO da Altice Portugal no Ministério das Infraestruturas. O ministro quer avaliar o compromisso do grupo com o país, numa altura em que a multinacional está no centro das atenções, pela investigação judicial da Operação Picoas, mas também pela pressão da avultada dívida.

A reunião começa às 9h30 e acontece mais de dois meses depois de o cofundador da Altice, Armando Pereira, ter sido detido para interrogatório, bem como Hernâni Vaz Antunes, que também é próximo da empresa. Ambos estão em prisão domiciliária.

O caso fez tremer o grupo Altice a nível internacional e pode implicar também Alexandre Fonseca, ex-CEO da Altice Portugal, que suspendeu as funções de co-CEO da multinacional quando o caso veio a público. Em causa estão suspeitas de negócios com fornecedores que terão lesado a Altice e o Estado português em largos milhões de euros. A Altice diz-se vítima desse alegado esquema.

Ana Figueiredo apresenta-se perante o ministro das Infraestruturas depois de ter promovido mudanças na equipa executiva da empresa que controla a Meo, a maior operadora portuguesa em quota de mercado. Primeiro saiu João Zúquete da Silva, que era responsável pelo património, após o próprio ter pedido a suspensão de funções. A 1 de setembro, saiu também João Teixeira, que tinha o pelouro tecnológico, e Alexandre Matos, que era administrador financeiro.

Há novos administradores e um novo pelouro. Sofia Aguiar, a nova Chief Legal Officer, terá sob responsabilidade as áreas de regulação, concorrência e jurídico, proteção de dados e compliance.

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Ana Figueiredo é CEO da Altice Portugal desde 2 de abril de 2022Hugo Amaral/ECO

Dívida aperta o grupo Altice

Além do processo em Portugal, Patrick Drahi, o multimilionário que controla a Altice, está novamente sob pressão dos investidores por causa da montanha de dívida, que ascende a 55 mil milhões de euros no total. Os dois ramos da Altice com relevância europeia, a Altice France e a Altice International, têm quatro mil milhões de euros de dívida a vencer até 2026. O outro ramo é a Altice USA, e deve 24,5 mil milhões de dólares.

Esta semana, soube-se que a Altice International, a subsidiária que “manda” na Altice Portugal, quer levantar 500 milhões de euros numa emissão a quatro anos junto de investidores institucionais, oferecendo concessões que lhe poderão deixar a pagar, no final, um juro anual de dois dígitos. Mas Drahi vai precisar de mais músculo financeiro para fazer face às responsabilidades. O Governo sabe isso.

Numa altura em que o setor das comunicações eletrónicas é cada vez mais visto como crítico para a economia e estratégico para o país, e num momento em que a Comissão Europeia quer limitar a influência na União Europeia de países menos alinhados com o Ocidente, a Altice já admitiu que uma das soluções pode passar pela entrada de novos parceiros de capital ou dívida. A avançar, a nacionalidade desses investidores vai importar bastante.

Em Portugal, sabe-se que a Altice está vendedora de ativos não estratégicos, como é o caso do centro de dados da Covilhã. Possivelmente avaliado em 200 milhões de euros, a operação esteve prestes a ser fechada no início do verão com o fundo Horizon Equity Partners, de Sérgio Monteiro, antigo secretário de Estado das Infraestruturas. Mas as buscas das autoridades portuguesas ao universo Altice travaram o negócio, que a Altice espera poder retomar e concluir durante o outono.

Mas também voltaram a surgir rumores da possível venda da Altice Portugal, que já foi estudada no passado. A imprensa internacional noticiou que a boutique de investimento Lazard está novamente a avaliar opções para a operação da empresa em Portugal, o que, no final, poderá conduzir a uma alienação total ou parcial, apesar de a empresa negar que a mesma esteja em cima da mesa.

No pensamento de Galamba poderá estar o que aconteceu não há muito tempo no país vizinho. No início de setembro, Espanha acordou a saber que a operadora estatal da Arábia Saudita, a Saudi Telecom, comprou uma posição de 9,9% da Telefónica, por 2,1 mil milhões de euros (4,9% em ações e os restantes 5% em instrumentos financeiros que lhe conferem “exposição económica” à empresa). A operação foi preparada e mantida em segredo, mesmo para a própria administração da operadora, até ser divulgada publicamente.

Da parte da Altice e do Governo, tenta-se normalizar a reunião desta segunda-feira. Fonte próxima da empresa disse ao ECO que o encontro servirá para tratar “temas do setor”, incluindo a Televisão Digital Terrestre (TDT), o desenvolvimento do 5G e o investimento em redes de nova geração, mas não afastou que a Operação Picoas venha a ser chamada à discussão.

Também não será difícil imaginar Ana Figueiredo a questionar o ministro sobre a decisão do Estado português de obrigar as operadoras a excluir do 5G equipamentos fabricados pela marca chinesa Huawei, um grande fornecedor da Meo. Haverá margem do Governo para compensar as operadoras? Em princípio, não.

Já o ministro das Infraestruturas, que reuniu em agosto com os sindicatos de trabalhadores da Altice, contextualizou o encontro em pleno verão: “Face às mudanças recentemente conhecidas, pareceu-nos importante – além do diálogo normal que mantemos com a empresa em Portugal e tendo em conta os desafios estratégicos importantes, nomeadamente na questão do 5G e do data centerum compromisso firme da empresa com investimentos e com certas áreas de negócio.”

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João Galamba, ministro das Infraestruturas, recebe a CEO da Altice esta segunda-feira, às 9h30Hugo Amaral/ECO

Sindicatos reuniram com Cadete

A Operação Picoas decorre em segredo na Justiça, mas o tema preocupa os sindicatos. Na semana passada, alguns reuniram com a administração da Anacom para discutir a situação da Altice. Uma “troca de opiniões”, como lhe chamou o coordenador nacional da Fectrans, José Manuel Oliveira. A avaliação da idoneidade dos gestores de empresas de telecomunicações terá sido um tema trazido para cima da mesa pelo presidente da Anacom, João Cadete de Matos, ouviu o ECO de outro dirigente sindical.

“Não tirámos conclusões da reunião nem tinha esse objetivo. Transmitimos à Anacom o que pensámos. Uma coisa que ressaltou ali, quer da Anacom, quer da nossa posição, é que este é um setor vital para o país. Hoje, toda a economia está dependente das telecomunicações e devia haver alguma orientação política, ou capacidade de intervenção do Governo, para definição de políticas, para que se pusesse de facto as coisas ao serviço do interesse do país”, explicou José Manuel Oliveira, admitindo, contudo, que isso é difícil sem o controlo público da empresa.

“Foi importante e frutuoso”, comentou também Francisco Gonçalves, dirigente do Sindicato dos Trabalhadores das Telecomunicações (STT), que esteve igualmente presente na reunião com a Anacom. Acrescentou, contudo, um desabafo: “Há países na União Europeia em que o acionista Estado ainda tem alguma influência. Aqui em Portugal queremos ser os campeões da liberalização. Os nossos gestores querem ser os campeões da rentabilidade”, criticou.

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